Arquitetura

Igreja “flutua” a 31 metros do chão para ser preservada em mega obra de hotel e shopping em SP

HAUS*
09/07/2018 19:31
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Foto: Reprodução/Instagram

Um delicado projeto de engenharia executado nos últimos nove meses conseguiu deixar suspensa, a uma altura de 31 metros, uma capela de 1,2 toneladas do antigo Hospital Matarazzo, a uma quadra da Avenida Paulista, na região central de São Paulo.
A operação, que surpreendeu quem mora e trabalha ao lado do terreno, foi projetada para proteger a estrutura da igreja de Santa Luzia durante as obras do futuro complexo Cidade Matarazzo. Inaugurada em 1922 pelo arquiteto italiano Giovanni Battista Bianchi, ela é tombada pelo Conselho Estadual do Patrimônio Histórico (Condephaat).
Ao redor da igreja, será construído um conjunto com hotel, shopping e uma torre de 22 andares assinada pelo arquiteto francês Jean Nouvel, vencedor do prestigiado prêmio Pritzker, em 2008, e autor do ambicioso projeto do museu do Quai Branly, em Paris.
Será o primeiro projeto do arquiteto em São Paulo. Em 2001, ele foi contratado no Rio de Janeiro para a instalação de uma filial do museu Guggenheim na região do Píer Mauá, mas a execução acabou barrada após polêmicas (inclusive pelo custo) que chegaram à Justiça.
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De acordo com o engenheiro Maurício Bianchi, responsável pela obra no complexo Matarazzo, foi necessário manter a capela suspensa para aproveitar ao máximo o terreno de 27 mil m². Ele explica que várias partes do antigo hospital são protegidas pelo patrimônio histórico, o que obriga o aproveitamento máximo de cada centímetro.
Um sistema de oito profundas colunas — com 31 metros de altura, além de outros 23 metros sob o solo — conectadas por uma laje foi construído no entorno e abaixo da capela, que originalmente possuía só 1,5 metro de fundação.
Para evitar qualquer rachadura, a escavação das colunas não foi feita com bate-estacas, mas sim com uma perfuratriz de baixa percussão, da maneira mais lenta possível. “Eu deixava até um copo de água sobre o altar para ter certeza de que as vibrações eram mínimas”, conta Bianchi.
Somente então foi iniciada a etapa mais delicada do procedimento. Através de processos como o hidrojateamento, espécie de bombeamento de água sob alta pressão, a terra acomodada sob o prédio foi lentamente removida –e a enorme estrutura se revelou.
Ao longo de semanas, o solo abaixo da capela erodiu até que a construção se acomodasse sobre a nova sustentação. “Ficamos então ilhados”, brinca Bianchi, que precisou instalar uma espécie de ponte entre o nível da alameda Rio Claro e o perímetro da capela.
Questionado sobre os eventuais prejuízos que a operação causou ao prédio, ele é categórico: “O resultado é impecável. Apesar da estrutura de tijolos antigos, não houve absolutamente nenhum dano”.
Foto: Reprodução/Instagram
Foto: Reprodução/Instagram
Abaixo da capela, serão construídos oito subsolos. Cinco deles serão destinados a estacionamentos. Os demais abrigarão áreas de apoio para o hotel (como cozinhas e cinema) e um espaço chamado “creativity center”, destinado a conferências e eventos.
Apenas o piso da capela Santa Luzia sofreu modificações. Para mantê-lo intacto e sem quebras, foi necessário desmontá-lo em peças, que foram catalogadas uma a uma, como em um quebra-cabeças. O altar também seria removido, mas os engenheiros temeram danos ao mármore e preferiram instalar sob ele uma laje adicional de sustentação.
Foto: Arquivo/Divulgação
Foto: Arquivo/Divulgação
Hoje, toda a área ocupada pelo antigo Hospital Matarazzo pertence ao empresário francês Alexandre Allard, conhecido por investir em projetos de modernização de edifícios antigos. O negócio foi fechado em 2010 pelo valor de R$ 117 milhões, após oito anos de negociação. A expectativa é que o restauro das instalações, assim como sua expansão, custe ao Grupo Allard R$ 1 bilhão e que a obra fique pronta no final de 2019.
O hospital (cujo nome original era Umberto Primo) foi erguido em 1904 pelo empresário Francesco Matarazzo e se tornou um ícone da arquitetura neoclássica de São Paulo.
O interior da capela Santa Luzia tem detalhes em escaiola amarela, técnica italiana do século 17 com pó de jaspe para reproduzir a textura polida e as cores do mármore. Somente em 1986, os prédios que compõem o complexo foram tombados pelo patrimônio histórico e cultural do estado de São Paulo. A partir de 1993, com a falência da fundação que o administrava, o Hospital Matarazzo acabou fechando as portas.

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