Arquitetura

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Novo presidente do CAU-PR quer ampliar fiscalização, fazer concurso e retomar diálogo com universidades

Luan Galani
14/01/2021 12:33
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O arquiteto e urbanista Milton Carlos Zanelatto Gonçalves, 42 anos, foi recém-eleito novo presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Paraná (CAU-PR) para a gestão 2021-2023 da autarquia federal. A vice-presidente é a arquiteta e urbanista Thais Marzurkiewicz, de Foz do Iguaçu.
Zanelatto formou-se em Arquitetura e Urbanismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) em 2007, e concluiu pós-graduação em Comunicação Pública em 2020. Foi conselheiro estadual do CAU-PR de 2015 a 2017, presidente do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas no Estado do Paraná de 2016 a 2019 e conselheiro federal do CAU-PR de 2018 a 2020. Na Câmara Municipal de Curitiba, atua na assessoria do vereador Professor Euler em temas da Comissão de Urbanismo, Obras e Tecnologia da Informação.
Milton Carlos Zanelatto Gonçalves foi recém-eleito novo presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Paraná.
Milton Carlos Zanelatto Gonçalves foi recém-eleito novo presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Paraná.
Para saber mais sobre as bandeiras e interesses que podem germinar nessa nova gestão, HAUS conduziu uma entrevista exclusiva com Zanelatto via telefone na tarde desta quarta-feira (13). Algumas das perguntas foram enviadas para a reportagem previamente por leitores por meio de WhatsApp. Confira!
É de conhecimento geral que as eleições do CAU-PR foram bem disputadas e que houve polarização entre dois grupos. Qual a sua proposta para melhorar essa situação, de ter uma gestão onde todos os arquitetos paranaenses sintam-se representados, possam ter voz, mesmo os que não votaram na sua chapa?
Na verdade, esse processo de debate é fundamental no amadurecimento geral de toda a entidade. Essa questão de disputa é uma coisa natural, faz parte. É estranho quando não tem disputa em algo semelhante a isso. Se não tem disputa, há desinteresse. Aqui, pelo contrário, tem vários grupos e todo mundo quer contribuir. Tanto que o sistema eleitoral do CAU prevê como uma Câmara de Vereadores, em que mesmo que a nossa chapa ganhe, a gente não leva 100% das vagas. Justamente para continuar dentro do plenário tendo opiniões diversas, com debate de outras visões e ter o contraponto. Não vejo problema no embate político de ideias [que aconteceu durante a eleição]. Em muitos projetos entre as chapas, entendo que são muito semelhantes. Por exemplo, a valorização da arquitetura. Todos defendem isso. Em temas mais específicos, como a questão de gênero, eles previam uma comissão temporário de gênero. A gente prevê uma comissão permanente sobre debate de gênero. Muitas pautas são coletivas. E nessas pautas será o plenário que vai decidir. O plenário é soberano. É ele que de fato dita as regras. O presidente é mais um despachante de plenária. Cabe à plenária o amadurecimento político e o debate saudável de ideias.
Existe intenção de aplicar novas políticas para fiscalizar o exercício ilegal e práticas anti-éticas da profissão?
Sim, existe. Mas qual o problema? Vou te dar um exemplo: o governo brasileiro lança uma nota de R$ 200, com mil sistemas de segurança totalmente novos para impedir a falsificação. A nota chega no mercado e uma semana depois já falsificaram. Porque enquanto tem um pensando em fiscalizar, tem 800 mil tentando fraudar. Sites que vendem projetos, por exemplo, e que não respeitam o direito autoral de outros arquitetos. Sempre tem pessoas de má índole tentando burlar a fiscalização. É uma constante. Então, obviamente o conselho precisa se modernizar. A gente tem planos para fazer grandes investimentos na parte de TI, para acompanhar o combate às irregularidades. E cada vez elas se dão de diversas formas. Hoje em dia tem venda de projetos sem responsável legal na OLX, no Mercado Livre. Daí vamos lá e fiscalizamos. Então, aparecem em outras plataformas, como no Instagram. A pessoa nem está aqui no estado, mas faz um anúncio no Paraná para dificultar a fiscalização. Ano passado foram 854 ações de fiscalização, uma média de três fiscalizações por dia. Antes da pandemia, em 2019, foram mais de 1.300 ações. E temos uma estrutura enxuta também. Somos uma das autarquias mais novas do Brasil e já fomos criados em um novo viés de administração pública. Por isso, temos que aliar tecnologia com recursos humanos.
Houve uma grande movimentação por parte de um grupo de arquitetos que defendiam os concursos públicos de projeto. Os dois presidentes anteriores apoiaram essa iniciativa (Margareth Menezes e Ronaldo Duschenes). A sua gestão vai continuar com esse apoio? De que forma?
Vai continuar. E devemos fazer um concurso público do próprio CAU-PR. Em breve. Estamos retomando alguns estudos, laudos e vistorias. Temos uma sede adquirida na gestão do Jeferson [Navolar]. A intenção é o CAU-PR servir de exemplo e fazer concurso para a revitalização do imóvel. Tem questões que vamos negociar com a Prefeitura de Curitiba para tentar fazer um projeto mais amplo com espaços de convivência, por isso não lançamos o edital ainda. Mas entendemos que o concurso público é uma das formas mais eficientes e baratas de se ter uma construção de qualidade, independente e fiscalizada. É só olhar as últimas ações de Brasília. Revitalizações e construções estão sendo feitas via concurso público, com vários escritórios do Paraná sendo vencedores desses concursos.
Casa projetada por Lolô Cornelsen, um dos grandes nomes do modernismo paranaense, que hoje pertence ao CAU-PR
Casa projetada por Lolô Cornelsen, um dos grandes nomes do modernismo paranaense, que hoje pertence ao CAU-PR
Essa nova sede do CAU-PR da qual você fala é uma obra do Lolô Cornelsen, entre o Alto da XV e o Tarumã, que está há alguns anos parada e sem reforma. Já passou bastante tempo desde a aquisição do imóvel. O que você pretende fazer na sua gestão sobre isso? Acha que agora vai?
Vai. Essa era a plataforma da nossa gestão, estava na nossa carta de princípios. A sede atual está pequena, é uma casa tombada e as intervenções acontecem de forma pontual. A intenção é já no próximo mês criar uma comissão do concurso. Estamos fazendo alguns laudos do que a casa precisa, para inaugurar antes do meio da gestão. É uma casa com história importante, um símbolo do modernismo da cidade.
Até quando os arquitetos terão de pagar dois registros, um para sua empresa e outra para si próprio?
Na verdade já houve uma mudança. A gente vai fazer a publicidade dentro do CAU a respeito disso, mas adianto que para empresas que têm até três sócios arquitetos, será dado desconto de 90% no valor da anuidade da pessoa jurídica. Inclusive, desencontrar pagamentos também está previsto. Pessoa física paga no começo do ano e pessoa jurídica paga no meio do ano, para não sobrecarregar os profissionais com outros impostos municipais, entre outros. A partir deste ano está valendo essa questão.
A questão da habitação social é urgente no Brasil. Com relação a Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social, quais são os projetos? Há algum projeto semelhante ao do Athis Unidade Sanitária do CAU-RS?
Na verdade a gente vai abrir editais para isso. Há uma obrigatoriedade do CAU de ter uma destinação de recursos do seu orçamento, dois porcento de toda arrecadação tem que ser destinado para programas de assistência técnica para habitação de interesse social. O CAU quer retomar o protagonismo com a sociedade e os órgãos públicos. Já começamos a ver algumas agendas junto ao governo estadual e algumas prefeituras, para começar a desenvolver alguns programas como esse.
Com relação aos estudantes de arquitetura que finalizam o curso no Paraná. Você pensa em alguma iniciativa ou prêmio para valorizar e incentivar as boas ideias e soluções criadas na academia? 
Prêmio não. Mas queremos retomar o diálogo com as universidades. O fórum de coordenadores, que era um órgão do conselho, estava desativado. Então, o primeiro passo é reativá-lo. Temos 64 faculdades e universidades com cursos de arquitetura no Paraná, com quase 12 mil alunos. A ideia é integrar, fazer palestras e trabalhos conjuntos. Mas existe uma questão ainda mais polêmica que está vindo. É o Ensino à Distância (EaD). O problema não é o EaD em si. Muitos cursos é que estão contra as diretrizes curriculares, aplicando o curso de arquitetura 100% EaD. Tem um posicionamento claro do CAU contra isso. Disciplinas práticas não podem ser feitas de forma remota. Lembrando que arquitetura é um curso de [ciências] humanas. Há necessidade de tutoria, de conversas, de diálogo. E ainda não existem ferramentas que tornem a experiência de salas de aula e ateliês similar no universo digital.
Quando vai constar na lista de serviços dos arquitetos os escopos detalhados de serviços BIM e quais serão?
Isso é complexo. Na tabela da arquitetura não existe detalhamento disso nem quando era feito no AutoCAD. Não é função do conselho definir o que a pessoa pode fazer no BIM. Seria igual eu dizer para você: quando vai sair a lista dizendo que só vocês jornalistas podem usar o Word? É difícil. São plataformas externas e o arquiteto usa isso como ferramenta. Não é a ferramenta de trabalho que define atribuição profissional. Não é o parafuso que gira o ser humano. É o ser humano que gira o parafuso. O bem é um facilitador. Tem que ter cuidado com isso. Nós somos o executor da ferramenta. E qualquer outra pessoa pode mexer na ferramenta se quiser e se dedicar. Se você me pergunta se o CAU apoia o BIM, claro! O CAU apoia o BIM, porque entendemos que é uma modelagem mais completa, em que se pode tirar informações em tempo real, principalmente 4D e 5D, o que ajuda na manutenção e planejamento da edificação.
Não tem como garantir que apenas arquitetos possam fazer estes serviços?
O papel intelectual continuará a ser do arquiteto. Mas se o profissional quiser fazer a nanquim, o CAU jamais proibirá. Temos restrições com esse discurso e até onde podemos ir. O projeto é atribuição exclusiva do arquiteto. Operar a ferramenta o CAU não pode garantir. É como proibir o uso do Word para o restante das pessoas e deixá-lo só para jornalistas. A ferramenta BIM é vendida para qualquer pessoa. Não tem como proibir. E, no fim, quem precisa assinar a responsabilidade do projeto será um arquiteto. E mesmo que alguém faça um projeto sem ser arquiteto, a pessoa não vai conseguir aprovações nos órgãos se não tiver um arquiteto.
Existe algum plano para incorporar o BIM aos acervos e às licitações públicas?
Já existe legislação federal sobre a utilização de BIM e licitação de obras públicos. Inclusive o exército brasileiro tem um amplo programa para criação da Biblioteca Nacional de BIM. O CAU é incentivador. Mas é uma ferramenta. Em uma licitação, se o profissional oferecer todos os dados a partir de outro sistema, não tem problema. Não cabe ao CAU opinar sobre o método.
O Brasil não possui, além das normas técnicas já ultrapassadas, um mapeamento de serviços e processo de arquitetura, como o do RIBA, por exemplo. Existe uma intenção de discutir algo do gênero dentro do CAU?
Essa é uma questão complexa. Sim. O problema é que precisamos fazer separação entre autonomias do CAU Paraná e do CAU Brasil, e o que extrapola a competência do CAU. O CAU Brasil tem a Comissão de Relações Internacionais, em que tentamos fazer pontos e trazer boas práticas para o Brasil. Mas trata-se de uma política nacional porque envolve outros órgãos, como o MEC e o Itamaraty, por exemplo. Não adianta assinar com o Uruguai, por exemplo, se o Itamaraty não referendar. Não depende só do CAU. E já presenciei casos como esse, em que o Itamaraty segura os processos. Exemplo hipotético: se hoje o CAU assinar um termo de parceria com Cuba, tenho certeza que o Itamaraty não assina, por questões óbvias do atual governo. E isso sempre caminha a passos de formiga. E vale lembrar que importar modelos nem sempre funciona. Algumas dessas adaptações precisam ser amplamente debatidas. Se não, o sistema colapsa.

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