Arquitetura

O centenário do mestre Artigas

Luan Galani
24/06/2015 01:00
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O arquiteto Vilanova Artigas faria 100 anos no dia 23 de junho de 2015. Foto: Cristiano Mascaro.

Cara a tapa
Quase sempre de terno e gravata, saía cedo, numa rotina precisa. Ia ao escritório mesmo quando não tinha o que fazer. A disciplina matemática, herdada dos tempos da engenharia, dizia muito sobre aquele pequeno senhor de “DNA capenga”. Artigas era míope, meio surdo e dono de uma cabeleira branca desproporcional. Não pestanejava em “quebrar o pau” para defender suas ideias. Mas nada lhe era mais caro do que ter um problema de arquitetura para resolver. Debruçava-se contente sobre o papel e ali mostrava a que tinha vindo. Cada traço tinha um porquê.
Traço certo
Seu maior trunfo, porém, como o ator Juca de Oliveira descreve no novo documentário sobre o arquiteto, era “sua absoluta e total simplicidade”, característica que passava para o desenho. Artigas cravou seu nome no panteão da arquitetura brasileira porque a subverteu. Trocou a ostentação das fachadas cenográficas pela simplicidade. Valorizou os espaços de convivência. Fez com que a arquitetura sempre estivesse ligada a uma lógica estrutural. Deu preferência a espaços coletivos, em detrimento de áreas individuais, como bom comunista que era desde 1945.
Esboço de Artigas da casa Olga Baeta, em São Paulo, que remete a elementos da casa de madeira onde cresceu, no interior do Paraná. Foto: arquivo familiar.
Esboço de Artigas da casa Olga Baeta, em São Paulo, que remete a elementos da casa de madeira onde cresceu, no interior do Paraná. Foto: arquivo familiar.
De olho no coletivo
“A arquitetura do Artigas é asséptica. Jamais de luxo”, pontua Sylvia Ficher, uma contundente crítica de arquitetura da Universidade de Brasília. Por isso é considerado fundador da Escola Paulista, uma linha do modernismo brasileiro. “Suas construções promoviam o encontro e se relacionavam até com as ruas, destacando o compromisso das pessoas com o coletivo. Na Faculdade de Arquitetura da USP, por exemplo, se alguém gritar no térreo, o barulho interfere até o último andar. As pessoas devem estar atentas a esse compromisso”, lembra a arquiteta Mônica Junqueira, da USP.
Rodoviária de Jaú, no interior de São Paulo, construída em 1973. Foto: FAU-Mackenzie.
Rodoviária de Jaú, no interior de São Paulo, construída em 1973. Foto: FAU-Mackenzie.
Ano após ano
Apesar de ter se radicado na capital paulista, Artigas é natural de Curitiba. Com 6 anos perde o pai e sua família se muda para Teixeira Soares, no interior do Paraná. Lá cresce em uma casa de madeira tipicamente paranaense, que para sempre reverberou em alguns de seus projetos. “No caso do Artigas, essa casa de madeira foi uma de suas referências. Mas ele não ficou engessado. Como Picasso, usou isso e tornou-se universal”, avalia Ciro Pirondi, arquiteto e diretor da Escola da Cidade. Depois cursa engenharia na UFPR, mas decide se transferir para São Paulo.
Viés político
Ajudou a fundar, em 1948, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, fazendo uma ousada reforma curricular em 1962. Militante do Partido Comunista desde a década de 1940, é perseguido. Como seu filho Julio Artigas relata mais tarde, Doi-Codi invadiu a casa dos Artigas 16 vezes. O maior baque veio com a aposentadoria compulsória em 1969. Nada afetou mais o inveterado professor. “Acho que o Artigas professor superava o Artigas arquiteto”, diz sua filha, Rosa Artigas. Mas nunca parou de orientar e ensinar quem o procurasse em casa. Volta a lecionar nos anos 1980, mas morre cinco anos depois.
Vilanova Artigas e o amigo Burle Marx, em meados dos anos 1970. Foto: arquivo familiar.
Vilanova Artigas e o amigo Burle Marx, em meados dos anos 1970. Foto: arquivo familiar.

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