Arquitetura

Primeiro condomínio de casas em Curitiba tem inspiração em Portugal; conheça o projeto

Felipe Martins*
07/06/2019 14:20
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Fotos: André Rodrigues/Gazeta do Povo | Gazeta do Povo

Uma vila em Curitiba inspirada em Portugal

Quando o arquiteto e engenheiro paranaense Lolô Cornelsen recebeu o pedido da empresa portuguesa Comasa para um empreendimento residencial em Curitiba, a nação lusa ainda passava por momentos de incerteza. Pouco tempo antes, em abril de 1974, os portugueses haviam vivenciado a Revolução dos Cravos, que pôs fim às longas décadas de regime salazarista em Portugal, afetando também toda a colônia ultramarina.
Lolô, que havia consolidado uma notável carreira internacional do outro lado do Atlântico durante os anos da ditadura militar brasileira, conhecia bem a fraternidade lusitana. Durante o próprio exílio, projetou tanto em Portugal como em países da África, e viveu em contato com a sociedade portuguesa até o retorno ao Brasil, quando estourou a revolução.
Na terra das araucárias, recebeu dos portugueses a encomenda que envolvia uma série de casas em um boulevard. O que hoje chamamos de condomínio, era até então novidade por estes lados. As residências deveriam ter inspiração na arquitetura do país europeu – um desafio para um arquiteto forjado no modernismo brasileiro.
Detalhes das residências projetadas por Lolô, com inspiração portuguesa.
Detalhes das residências projetadas por Lolô, com inspiração portuguesa.
O movimento arquitetônico chamado de ‘português suave’ tornou-se marca registrada das fachadas nas principais cidades de Portugal, e foi reproduzido em uma grande área na Rua Mateus Leme (altura do n° 2958, próximo à agência dos correios). As 22 casas – duas em cada edificação – são repletas de detalhes característicos das residências portuguesas.
Além de linhas bem definidas e de uma estrutura invejável – os lusitanos usaram a técnica de tijolo deitado -, chamam a atenção as ‘cantarias’ (molduras de portas e janelas, feitas com uma técnica que consiste em marretar o cimento) e a abundante presença de revestimentos em azulejos – diferente para cada cômodo e cada casa, sem repetição. Boa parte do material veio de Portugal.
Por algum tempo, o corredor de casas era uma ligação entre a movimentada rua e os jardins à margem do Rio Belém. A Vila Camões, como ficou conhecida, não tinha portões ou grades, que só surgiram após uma troca entre os construtores portugueses e os moradores da época que, preocupados com a segurança, ofereceram um busto do escritor Luís de Camões em troca dos itens de proteção.
Fachada de uma das casas do condomínio Vila Camões.
Fachada de uma das casas do condomínio Vila Camões.
Uma vila para chamar de sua
Desde o início, a Vila Camões virou ponto de refúgio para famílias que chegavam à Curitiba. Entre as versões sobre o local, uma história dá conta de que o condomínio havia sido erguido para receber famílias que fugiram da revolução, mas os moradores mais antigos não confirmam. “Era um empreendimento originalmente habitado por cariocas e portugueses, até porque a maior colônia portuguesa no Brasil está no Rio de Janeiro”, conta Manoel Collares, um dos seis moradores que vivem no local desde o início do condomínio.
Lolô conversa com um dos moradores da Vila Camões.
Lolô conversa com um dos moradores da Vila Camões.
O fato é que se criou um senso de comunidade intenso, e assim como em Grândola (vila portuguesa que inspirou a canção que serviu de ‘gatilho’ para a Revolução), há um amigo em cada esquina da Vila Camões. As ceias e festas comunitárias já não ocorrem com frequência, mas a união permitiu aos moradores serem suportes uns para os outros e a preservarem e valorizarem uma das mais importantes e simbólicas obras de Lolô Cornelsen.
Lolô Cornelsen, em visita à Vila Camões.
Lolô Cornelsen, em visita à Vila Camões.
Moldura de portas e janelas, chamadas em Portugal de 'cantarias'.
Moldura de portas e janelas, chamadas em Portugal de 'cantarias'.
Lolô caminha pelo jardim da Vila, que foi plantado pela esposa e filho do arquiteto.
Lolô caminha pelo jardim da Vila, que foi plantado pela esposa e filho do arquiteto.
Em uma das casas, um painel em azulejos retrata passagem da obra 'Os Lusíadas', de Luís de Camões.
Em uma das casas, um painel em azulejos retrata passagem da obra 'Os Lusíadas', de Luís de Camões.
Detalhes do piso original em azulejo de uma das casas.
Detalhes do piso original em azulejo de uma das casas.
*especial para a Gazeta do Povo. Publicado originalmente em 11 de outubro de 2016. 

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