A ligação dos brasileiros com o mar e o caos litorâneo

Key Imaguire Junior
02/11/2019 20:00
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Foto: Marialba RG Imaguire

Todos sabemos disso, mas de nada adianta: todo fim de semana, as estradas para as regiões litorâneas ficam apinhadas de veículos, tornam-se ainda mais perigosas, lentas, estressantes. Se há um feriadão, ou se é época de férias, a coisa chega a níveis de pesadelo: pequenos percursos demoram horas, os motoristas se tornam nervosos e imprudentes. Um acidente – sempre grave, principalmente para as regiões onde sobrevive um pouco de natureza – pode causar horas de congestionamento. Isso nas precárias estradas e rodovias; na outra extremidade do percurso, o que espera por essa multidão ansiosa são lugares na sua quase totalidade precários, sem estruturas de atendimento, sem segurança suficiente, sujos, mal urbanizados e, principalmente, extorsivamente caros.
O que explica, então, essa compulsão litorânea dos brasileiros? Nossa ancestralidade lusitana–“ó mar, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal”?–a perspectiva de pratos menos carnívoros e mais leves que os dos planaltos; talvez uma paisagem mais amena, tipo marinha do Pancetti? Do que fogem – ou pelo que procuram – esses seres, em automóveis e ônibus superlotados, carregando pranchas e bicicletas sobre o carro; travesseiros, e gente iludida dentro? Porque é evidente que, encontrar mais qualidade de vida urbana, é uma ilusão, trata-se de trocar seis por meia dúzia apenas. Cada vez mais, as orlas se assemelham às cidades, são versões à beira-mar dos mesmos defeitos que deixamos tomar conta das urbes. Nossas cidades praianas, de modo contínuo, se assemelham, principalmente no que elas têm e pior, às metrópoles do interior, no que elas têm de mais feio.
Foto: Marialba RG Imaguire
Foto: Marialba RG Imaguire
O simples esquecer temporariamente das ruas tumultuadas, sujas, verticalizadas, talvez seja explicação suficiente. É abandono do ambiente de trabalho pelo de lazer: o direito de ir se incomodar com os mesmos problemas, mas com menos roupa, cheiro de maresia, mosquitos e adquirindo coloridas queimaduras solares…
Não conheço estatísticas a esse respeito, mas a simples observação mostra que o fluxo em direção ao leste, em fins de semana e férias, é muito mais intenso que em direção aos interiores, onde as atrações são outras – só que não são à beira-mar…
Já foi comum, há décadas, uma ilustração publicitária representativa das férias. Sob um guarda-sol, a mãe com um enorme maiô duas-peças observa a menina brincando com o balde de areia. Perto, o pai joga bola com o filho. Todos com resplandecentes sorrisos, físicos perfeitos. No céu, voam duas ou três gaivotas, as ondas são tranquilas, passa um barquinho a vela com um pescador. Perfeita letra para música da bossa-nova, que deve ter ficado impregnada no imaginário dos brasileiros…

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