Nostalgia urbana: uma homenagem para a cidade de antigamente

Key Imaguire Junior
17/02/2018 20:00
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Se essa rua fosse minha…

…se essa rua, se essa rua fosse minha; eu mandava ladrilhar, com pedrinhas portuguesas formando desenhos bonitos, nas quais as pessoas tivessem prazer em caminhar. Viriam de outras ruas e de outros bairros para passear na minha rua, e exclamariam: “… mas que rua mais linda!”
Se essa rua fosse minha, eu tiraria o trânsito de veículos velozes, ruidosos e fedorentos, para que as crianças pudessem jogar bola, pular amarelinha e, quem sabe, talvez reaprendessem a jogar bets…
Se essa rua fosse minha eu mandaria colocar bloqueadores de celular, para que as pessoas deixassem de viver em função daquela telinha e voltassem a apreciar o vento nas folhas, o canto dos passarinhos e a chuva que forma poças espelhadas e faz riachos junto do meio fio, onde se soltam barquinhos de papel.
Se essa rua fosse minha teria muitas árvores grandes, daquelas cheias de musgos e de ninhos, e que fazem uma sombra gostosa nos dias de sol forte. E também fruteiras para os passantes sentirem a alegria de colher e degustar uma pitanga azedinha… Todos os quintais teriam flores, plantas e araucárias, fazendo moldura para as casas.
Se essa rua fosse minha, morariam nela muitos cães, gatos e sapos, na maior tranquilidade, passeando sozinhos ou com seus donos, sem serem atropelados. E também saguis e serelepes, e outros seres que saibam viver na cidade.
Se essa rua fosse minha, teria espaço aéreo vigiado pelos urubus, caranchos e andorinhas; trilha sonora de sabiás, tico-ticos, canários, corruíras, bem-te-vis, periquitos e outros cantores que dispensam amplificadores de som.
Se essa rua fosse minha, não teria prédios que matam a paisagem e aquecem o planeta; onde mora gente engavetada e problemática. Teria só casas onde se namora no portão e quintais onde as vovós plantam mudinhas que ganharam da vizinha.
Se essa rua fosse minha, não teria nem postes nem fios de luz, e se poderia soltar raia, paraquedas, aeromodelos e brincar com o vento – que arrasta folhas pelo chão do outono.
Na minha rua não teria motores barulhentos, só se escutaria voz de gente e de bichos, todos contentes com sua vidinha. Ah, e se escutariam pelas janelas abertas as crianças e jovens estudando algum instrumento musical. Porque na minha rua, poder-se-ia até dormir de janelas abertas, para ver as estrelas e escutar os grilos do jardim.
Na minha rua não teria nem shopping nem supermercado, só vendinhas onde o dono vende no caderno. Sem máquina de cartão, mas ele conhece todo mundo… E ainda passariam afiadores de faca, vendedores de pão caseiro, crianças vendendo rifa da escola…
Na minha rua, eu estaria em minha casa como em nenhum outro lugar do mundo. Vou-me embora prá Pasárgada – lá, sou o urbanista do rei e todas as ruas são minhas.

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