Opinião: “Menos do que econômico, nosso subdesenvolvimento é cultural”

Key Imaguire Jr.
20/05/2019 19:53
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Em Curitiba, Rio de Janeiro ou Paris, a memória da humanidade é descurada e está sendo perdida. Na foto, a casa Erbo Stenzel, destruída pelo fogo e depois demolida, em 2017. Foto: Hugo Harada/Arquivo/Gazeta do Povo

Subdesenvolvimento: mais cultural do que econômico

Faz um tempo eu voltava de uma das cidades mais civilizadas do planeta, Montréal. Afirmação, eu sei, temerária: para ter o direito de fazê-la, eu precisaria conhecer todas as cidades do mundo. Mas a verdade é que a urbe canadense deixa essa sensação: pode-se ser tão civilizado quanto ela, mas mais é muito difícil.
Decolei do Aeroporto de Mirabel – que eles construíram para o Concorde e onde tudo funciona como um bom relógio. Aterrisei no Galeão, cá na terrinha – e ao sair do portão de “arrivals” para procurar a conexão, fui literalmente atropelado por uns garotos de mão estendida: – Tem dula aí, tio? Dá um dula aí…
A minha euforia ao voltar de um evento de Primeiro Mundo, como o Salon International de la Caricature, foi soterrado pela tristeza da constatação: menos do que econômico, nosso subdesenvolvimento é cultural.
Reflexão que me volta agora, com o incêndio da Notre Dame, poucos meses depois do Museu Nacional. Os bombeiros ainda lutavam contra as chamas e já se noticiava a doação de mais de três milhões de euros – dinheiro adoidado, deve ser mais que todo o orçamento brasileiro para a cultura – para o restauro da venerável igreja gótica. Que pode ser a mais famosa, mas não é a única nem a mais importante: esse título, por mim, caberia à Catedral de Chartres.
Mas será que algum dos nossos ricaços – porque há muitos, a julgar pelos Porches e Ferraris nas estradas e ruas brasileiras – já abriu a subscrição para o restauro do Museu Nacional, com digamos,
dez contos de réis que sejam? Acho que se fossem abertas listas de doação para a Notre Dame, não faltariam doadores por aqui.
Nas cabeças brasileiras, doação se faz para campanha política, que tem retorno garantido – cultura é fundo perdido. Rima de mau gosto, porém irrefutável. Com cheirinho de picumã…
Também é de mau gosto comparar a Notre Dame com o Museu Nacional – não há relação possível em termos absolutos. Mas em termos de conteúdo cultural relativizados aos países França e Brasil, é pertinente, sim. E nem precisaria ser o retrato das mentalidades nacionais, como é.

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