Reformar um imóvel é uma decisão que envolve outras decisões, para além das questões técnicas de como se quer esse ou aquele ambiente. O processo passa por um mergulho em aspectos íntimos, de onde surgem perguntas como: “vou continuar morando neste espaço ou mesmo cidade por quanto tempo?” ou ainda “tenho pretensão de aumentar a família?”

E, invariavelmente, o profissional escolhido para fazer o projeto e acompanhar a obra envolve-se com isso. Mas quando cliente e arquiteto são a mesma pessoa? Essa foi a experiência vivida recentemente pela arquiteta Camila Bigolin. Após uma temporada morando na Austrália, ela voltou para o Brasil e passou um tempo questionando até mesmo a retomada da carreira, entre outras tantas dúvidas.

“Essa
reforma foi um processo bem emocional para mim, precisei
me descobrir psicologicamente. Eu
e meu marido não sabíamos nem se queríamos ficar mesmo em
Curitiba. No fim das contas, decidimos ficar e mergulhamos na
reforma. Foi um redescobrir do meu trabalho, onde pude colocar
referências que me trouxeram até aqui.”

O
apartamento tem
90 m² e tinha móveis provisórios, uma vez que estava
alugado durante os quatro anos em que o casal morou fora do país.
Depois de tomada a decisão, a reforma foi total, com mudança de
todos os revestimentos, móveis e alguns ajustes de layout. Tudo em
cerca de oito meses de trabalho.

“A
planta original tem três quartos. Eu testei projetos abrindo mão de
um dos quartos para aumentar a sala, mas analisei a nossa forma de
vida e decidimos ser mais importante
ter
dois ambientes
que
chamei de closet-office,
exclusivo para cada um”, explica. Sendo assim, a integração foi
feita entre cozinha e sala, além de mudanças na área de serviço,
para ganhar espaço de armazenamento.

Camila entende que o processo de reforma de seu próprio apartamento a ajudou compreender ainda melhor as dores dos clientes. “Cresci como profissional neste projeto, tendo de fazer escolhas emocionais e financeiras, tal qual os clientes que atendo no escritório”, reflete. Conheça os ambientes em detalhes.

O
partido do projeto, era por uma linguagem contemporânea, mas com
cara de lar. A marcenaria com os frisos tipo lambri são
uma referência australiana, onde o recurso é bastante utilizado.
Toda a marcenaria foi desenhada pela arquiteta. Destaque para o
painel que conta com portas de pouca profundidade, ideais pra guardar
itens como chaves, carteiras e óculos, evitando que os itens se
acumulem sobre os móveis.

O destaque do ambiente é, sem dúvida, o quadro de Sila Lima, que foi escolhido desde o primeiro croqui. “Quando entrei em contato com a artista e fiquei sabendo que ela tinha disponível exatamente essa tela, tive certeza de que era para ser nosso. A explosão de cores dele me trouxe uma conexão com o sol, mar e a alegria dos meus países do coração: Brasil e Austrália.

Na
decisão de organização do ambiente, a profissional optou por não
colocar um pendente de iluminação acima da mesa de jantar,
propiciando que o móvel possa ser deslocado em dias em que o casal
recebe visitas. “Gosto da possibilidade de uma mesa não ser fixa
e, se você coloca um pendente sobre ela, é difícil tirá-la do
lugar, pois estará preso à centralidade da iluminação”,
justifica. Dessa forma, foram usados spots embutidos no teto de
gesso, garantindo iluminação uniforme pra todos os pontos do
cômodo.

Nos
revestimentos, cimento queimado na parede e uma continuação da
linguagem do painel com friso lambri usado
no desenho da cristaleira que abriga uma adega.

O ambiente era separado da sala e foi integrado, mantendo-se a bancada com o cooktop como limite entre os espaços. O mesmo móvel, executado em mármore Paraná, recebeu uma lareira ecológica na parte que fica visível para a sala.

O uso da marcenaria no teto, com a mesma madeira do painel da tevê, é outro elemento de delimitação visual. Outro ponto focal do espaço é a porta de entrada do apartamento, que recebeu pintura epóxi em uma rosa vivo, conversando com um dos tons do quadro na sala de jantar.

Os móveis foram executados em marcenaria com
desenho da arquiteta que optou pelo uso do cinza, que harmoniza bem
com o tom do mármore. “Na hora do desenho dos móveis, fiquei
entre a abertura por toque ou o uso de um puxador bem robusto. Fiquei
com a segunda opção e entendo-o como um elemento a mais na
composição dos ambientes.”

A área de serviço também ficava separada da
cozinha por uma parede e Camila optou por tirar essa divisão. “O
local onde ficava a parede virou um armário para armazenar
alimentos, que era algo que sentia falta no apartamento”, conta.
Outra mudança feita na área de serviço foi a retirada do forro.
“Protegi com placa de gesso as áreas de tubulação, mas o
restante da área de serviço ficou sem o forro e, com isso, ganhei
20 centímetros de pé direito para pendurar roupa.

Como o apartamento é apenas para o casal, sem filhos e sem programação em curto prazo a opção foi por ter dois “closet office”, para que os itens pessoais de cada um tivessem espaço garantido. “Esses espaços ficaram com decoração mais livre, carregando um pouco mais da personalidade tanto minha, quanto do meu marido”, explica Camila.

Em ambos, a opção para os armários foi a marcenaria e o painel pegboard entrou como um excelente organizador dos itens esportivos e de hobby. Destaque ainda para a paginação espinho de peixe do piso vinílico com aspecto de madeira.

Já
no ambiente destinado à Camila, ela fez questão de trazer um pouco
de verde, ainda que artificialmente. “Infelizmente não temos vista
para elementos naturais e o papel de parede com essas tonalidades
ameniza um pouco essa necessidade. Ao menos no aspecto visual”,
pontua a arquiteta.

O
apartamento conta com dois banheiros. Mas o casal só tinha
necessidade de um espaço para banho. Dessa forma surgiu uma ideia
bastante prática: transformar o banheiro social em lavabo,
transformando a área do chuveiro em um armário para guardar, entre
outros itens, as pranchas de surf. “Elas são muito grandes e
ocupariam um espaço que não tínhamos nos armários dos closets.”

A
decoração do lavabo ganhou uma atmosfera bem moderna, com
revestimentos hexagonais e
uma iluminação cênica.

No quarto do casal há uma continuação da linguagem geral do projeto, porém de uma forma mais romântica que se manifesta no painel em boiserie e na cabeceira rosada.

No
banheiro da suíte ela fez a mudança de lado dos misturadores (para
evitar o inconveniente de molhar-se enquanto acerta a temperatura da
água)
e
optou por um porcelanato que lembra o padrão de madeira.