Estilo & Cultura

Parte da paisagem urbana, bistrôs de Paris querem status de patrimônio cultural

Claire Mufson, New York Times
06/07/2018 21:00
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Bistrôs de Paris podem se tornar patrimônio imaterial da França. Foto: Dmitry Kostyukov/The New York Times | NYT

Nos dias seguintes os atentados terroristas que mataram inúmeras pessoas nos cafés de Paris, em uma noite de novembro em 2015, os parisienses, desafiadores, retornaram aos bistrôs de seus bairros para mostrar que não seriam intimidados. As hashtags #jesuisenterrace, que significa “estou lá fora”, e #tousaubistrot, “todo mundo no bistrô”, explodiram nas redes sociais, enquanto as pessoas se reuniam para tomar vinho sob os aquecedores como forma de demonstrar que seu modo de vida continuava o mesmo.
“Foi um sinal de força e resiliência”, disse Olivia Polski, assistente de comércio da prefeitura de Paris. Agora, uma coalizão de proprietários, sindicatos e organizações comerciais está fazendo lobby para que a Unesco conceda a bistrôs e cafés nas calçadas de Paris o status oficial de “patrimônio cultural imaterial da França”.
Para muitos turistas e cidadãos franceses, Paris não seria Paris sem esses estabelecimentos. Pequenos ou enormes, são inseparáveis da imagem icônica da cidade, imortalizados em filmes de Hollywood e romances. Mas, será que são patrimônio cultural imaterial do mundo? Para Alain Fontaine, proprietário de um bistrô e presidente da associação que promove a ideia, a resposta é um enfático “sim”. “Há séculos eles são cadinhos culturais, lugares onde pessoas de diferentes etnias, profissões e classes sociais se misturam”, disse Fontaine, que possui o Mesturet, um bistrô à moda antiga, com balcão de zinco e lustres feitos de garrafas de vinho.
Foto: Dmitry Kostyukov/The New York Times
Foto: Dmitry Kostyukov/The New York Times
O apoio à causa veio de atores, escritores e moradores da cidade, para quem seus cafés e bistrôs representam um modo de vida. Muita gente participou de uma coletiva de imprensa no Mesturet para justificar as razões. Esses locais não servem apenas para saborear um café e ver gente, ou degustar uma boa refeição regada a vinho; podem ser arenas para o debate de ideias, escritórios para fechar negócios ou lugares de encontros românticos.
Para muitos que vivem nos apartamentos apertados da cidade, os cafés são uma extensão de casa – a sala de visitas na esquina, um espaço público e privado. “Tenho clientes que se conheceram aqui e acabaram se casando. Criei meus filhos aqui”, afirmou Fontaine.

Reconhecimento

O rótulo “patrimônio cultural imaterial” é uma adição relativamente recente à lista de títulos de criações humanas e naturais extraordinárias concedidos pela Unesco, a organização cultural das Nações Unidas. A designação foi concebida para reconhecer práticas, eventos e ofícios que não são locais físicos, mas que fazem parte do patrimônio cultural de um país.
Desde 2008, quando o programa começou, a Unesco designou 451 entidades como patrimônio cultural imaterial no mundo, e 14 estão na França. Entre elas, uma elaborada técnica de produção de rendas na Normandia, os festivais de fogos de artifício do solstício de verão nos Pirineus e as danças folclóricas da Bretanha. Em outros países, o status foi atribuído ao teatro Kabuki no Japão, à fabricação de batik na Indonésia e a uma tradição pré-Inca no Peru, em que juízes especializados julgam direitos hídricos.
Mas o caminho para receber a proteção da Unesco pode levar pelo menos uns dois anos, às vezes mais. Os candidatos franceses devem ser selecionados pelo Ministério da Cultura antes de serem repassados para o órgão da ONU para revisão. Quem está fazendo campanha pelos bistrôs e cafés esperam que os estabelecimentos entrem na lista em 2020.
A designação da Unesco às vezes atrai críticas por causa da imprecisão do termo e porque alguns dizem que é usada para promover o turismo e o consumo em vez de incentivar o estudo e a preservação das tradições e práticas locais.
Alguns beneficiários da designação na França foram acusados de ter uma definição muito vaga, quase sem sentido – como foi o caso há alguns anos, quando a “comida gastronômica francesa” foi adicionada à lista. Em relação aos bistrôs e aos cafés de Paris, pode ser difícil explicar porque devem receber o status de herança cultural da França, mas não aqueles na Côte d’Azur ou na região vinícola de Bordeaux.
Porém, Fontaine e seus partidários, assim como o gabiente da prefeita de Paris, que está apoiando o esforço, apontam para o papel central que esses estabelecimentos tiveram após os ataques de 2015. As pessoas voltaram a frequentá-los logo após o ocorrido, em uma demonstração de que em tempos de crise ou comemoração, os parisienses precisam de seus bistrôs.
“Foram atacados porque são símbolos da cultura e da vida francesas. Foi um golpe duro, porque todos temos lembranças preciosas dos bistrôs”, disse Polski, a assistente da prefeitura. O grupo de Fontaine enfrenta uma competição difícil na França. Os “bouquinistes”, vendedores de livros e outros materiais impressos antigos nas margens do Sena, também fazem lobby pela designação. O mesmo acontece com os produtores do pão francês mais famoso, a baguete, que dizem merecer o título.

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