Estilo & Cultura

No Centro de Curitiba, o “lar” das balas Zequinha sobrevive ao tempo

Mariana Pilato*
02/07/2018 10:30
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Foto: Marcelo Andrade / Gazeta do Povo | Gazeta do Povo

Em meio aos prédios do Centro de Curitiba, um imóvel dividido em dois chama a atenção pela arquitetura residencial. Como um espelho, a casa no número 304 da Rua Nunes Machado se reflete nos mínimos detalhes, da ornamentação da fachada às bow-windows – janelas projetadas para frente, quase como sacadas. Só o que muda são as cores: no lado amarelo e azul, mora uma copiadora, e no lado com tons de marrom, uma residência. Nos anos 1920, a casa abrigava a fábrica de doces A Brandina, responsável pelas balas Zequinha, o versátil palhaço protagonista das figurinhas que embalavam os quitutes.
O local pode não dar pistas de sua antiga vocação, mas as pessoas que fazem parte de seu cotidiano, sim. Funcionários e frequentadores sabem por alto que ali era a morada das famosas balas. Wilson Sobania, neto de um dos quatro irmãos que dirigiam a fábrica quando as balas foram lançadas, em 1929, relata que, pelo que conta a família, originalmente eram quatro casas idênticas no terreno – as outras duas de frente para a Rua Lamenha Lins – e a fábrica tinha lugar bem no meio delas.
Foto: Reprodução
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As figurinhas eram desenhadas e impressas na Impressora Paranaense, com a criação do personagem e dos desenhos por Alberto Thiele e Paulo Carlos Rohrbach. As balas eram embaladas manualmente na própria figurinha, guardadas e vendidas aos comerciantes em latas com formato de barrica, provavelmente em referência ao transporte de erva mate, de acordo com Sobania.
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Não demorou para que se tornasse febre entre os pequenos curitibanos, que podiam até dispensar a bala em si, mas jamais a figurinha. “Se criou uma cultura sadia, de luta para conseguir as figurinhas consideradas difíceis e dos jogos de bafo em frente às casas”, recorda Sobania. Ele mesmo chegou a colecionar os desenhos, mas em uma série mais recente.
Com os anos, outras famílias assumiram a produção e os direitos das balas. Até 1967, ano em que parou de ser produzida, a patente passou pelos irmãos Franceschi, Gabardo e Massocheto e por fim para Zigmundo Zavadski. Apesar das reimpressões por quase 40 anos, as atividades que Zequinha fazia nas 200 ilustrações e as características dos desenhos continuaram as mesmas. Apenas mais tarde, em 1979, o personagem foi retomado pelo Governo do Estado sem as balas, criando um álbum com novos desenhos para uma campanha de arrecadação, em que as notas fiscais eram trocadas por figurinhas.
Foto: Reprodução
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Zequinha, um curitibano

É possível acompanhar as atividades do personagem por meio das figuras, Zequinha Leiteiro, Passeando, Anarquista, Na rua ou Casado. O objeto de doutorado pela UFPR da pesquisadora Camila Jansen de Santana é o tradicional personagem. Por meio de reportagens da época, ela nota características sociais de Zequinha de acordo com o contexto da Curitiba da época. Por exemplo, na figurinha em que Zequinha toma banho, ele está em uma banheira com encanamento aparente, enquanto as notícias da década de 1920 informam sobre a criação de uma rede de esgoto, porém ainda sem instalação efetiva.
Mas o que mais aproxima Zequinha do curitibano, e de todas as pessoas, é que ele não é perfeito. “Tem figurinhas em que ele comete ilegalidades, como roubar, ou bebe até cair. Isso gerou uma identificação porque ele não é um exemplo, apesar de também ter atividades cotidianas”, explica Santana. A proximidade acontece não apenas pelo comportamento. “Muita gente ainda se identifica por ter o álbum em casa ou por lembrar da infância. Esse imaginário é resgatado com a figura do personagem”, completa.
Um desses colecionadores é Roberson Caldeira Nunes, que possui centenas de figurinhas, entre uma impressão e outra. Ele percebe em encontros de colecionadores de outros temas o interesse atual pelas figurinhas, especialmente pelos mais velhos. “Uni dois interesses meus: pelas artes gráficas e pela história de Curitiba, que é muito presente no Zequinha. Uma coisa acabou se juntando à outra”, comenta.
*Especial para a Gazeta do Povo

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