Estilo & Cultura

Esses três homens ajudam a construir Curitiba nos pequenos detalhes

HAUS*
25/03/2017 22:49
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Valmir Gomes, o calceteiro; Joel Vendramin, o carpinteiro e Gregório Nedorub, o artesão de cúpulas. Três personagens anônimos que ajudam a construir Curitiba. Fotos: Fernando Zequinão e Letícia Akemi / Gazeta do Povo

Curitiba é reconhecida por suas obras de urbanismo, que tiveram destaque no cenário nacional e, em alguma medida, mundial. Mas para quem vive a cidade, caminha por ela no dia a dia, inúmeros detalhes da arquitetura saltam aos olhos. Dos lambrequins das casas de madeira às nossas famosas calçadas de petit pavé, é nos detalhes que a cidade nos ganha e confirma sua identidade.
Mas há pessoas por trás destes detalhes. E pessoas com histórias maravilhosas, ricas e inspiradoras. Para homenagear Curitiba nesta semana do aniversário de 324 anos da capital, destacamos três personagens que você pode não conhecer, mas já viu o trabalho deles por aí.

Joel Vendramin e a sobrevivência dos lambrequins

Há mais de 130 anos no mesmo endereço a Carpintaria São Judas Tadeu é um marco para quem passa pela Manoel Ribas, em Santa Felicidade. Todo o processo que dá origem a portas e janelas é artesanal permeado de muita serragem e barulho. São dessas máquinas também que saem peças símbolo da arquitetura tradicional de madeira: os lambrequins.
Joel Vendramin, o defensor dos lambrequins.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Joel Vendramin, o defensor dos lambrequins.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
O responsável por cuidar da linha de produção é o orgulhoso Joel Vendramin, 71 anos. Ele garante: quem procura lambrequim no Google encontra a carpintaria logo na primeira página.
Joel Vendramin em ação preparando lambrequins que vão para muitos lugares do Brasil.<br>Foto: Leticia Akemi / Gazeta do Povo
Joel Vendramin em ação preparando lambrequins que vão para muitos lugares do Brasil.<br>Foto: Leticia Akemi / Gazeta do Povo
De acordo com ele a São Judas Tadeu é “uma das últimas, senão a última carpintaria que faz lambrequins no Paraná”.  Ao preço de R$ 70 o metro linear os lambrequins permanecem vivos para repor fachadas degradadas e compor novos projetos.  “As casas de madeira são cada vez mais raras e para mim é muito importante ajudar a preservar essa tradição”,  afirma seu Joel .
A carpintaria São Judas Tadeu.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
A carpintaria São Judas Tadeu.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
O passo a passo da criação de um lambrequim.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
O passo a passo da criação de um lambrequim.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Quer saber mais sobre a história dos lambrequins? Tem uma matéria para você aqui

Hryhorij Nedorub, ou o seu Gregório das cúpulas

O sorriso fácil, o jeito amável e as mãos talentosas são as características mais marcantes de Hryhorij Nedorub. Calma, o nome é de difícil pronúncia, mas para facilitar basta chamá-lo de Gregório, o equivalente brasileiro do nome ucraniano.
Gregório e sua oficina de onde saem as cúpulas das igrejas ucranianas.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Gregório e sua oficina de onde saem as cúpulas das igrejas ucranianas.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Aos 76 anos, esse ucraniano da região de Poltava é o último artesão de Curitiba e arredores a dominar a técnica de construir cúpulas, principal símbolo da arquitetura religiosa ucraniana.
Gregório brinca com uma de suas peças.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Gregório brinca com uma de suas peças.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Ele veio ao Brasil aos 10 anos só de sapatos e calça, acompanhando a família na fuga dos conflitos da Segunda Guerra Mundial. Estudou funilaria e se interessou pelas cúpulas ao acaso, aprendeu sozinho a moldar as cúpulas depois de um pedido do bispo da igreja católica ucraniana. Em 1968, levantou as primeiras cúpulas, na igreja Santa Ana, no Pinheirinho.
Gregório junto de sua primeira obra na Igreja do Pinheirinho.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Gregório junto de sua primeira obra na Igreja do Pinheirinho.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Quem passa em frente a sua oficina no Capão Raso nem desconfia que ali habita o último de sua espécie, já que o funileiro aposentado gasta maior parte do tempo fabricando calhas. Na época de ouro, por volta de 1970, chegou a empregar 17 funileiros.
Gregório em sua oficina e rodeado de  cúpulas criadas por ele.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Gregório em sua oficina e rodeado de cúpulas criadas por ele.<br>Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Hoje tem apenas um funcionário, o único herdeiro desse saber tradicional. Seu filho, também Gregório, um arquiteto de mão cheia e seu mais querido aprendiz, faleceu em um acidente.
O processo absolutamente artesanal para fazer as cúpulas acontece na pequena oficina de Gregório. Foto:  Letícia Akemi / GAzeta do Povo
O processo absolutamente artesanal para fazer as cúpulas acontece na pequena oficina de Gregório. Foto: Letícia Akemi / GAzeta do Povo
“É questão de dom. E eu gosto do que faço. Tento sempre fazer tudo perfeitinho.” Gregório valoriza tanto a perfeição técnica das peças que às vezes esquece de ver poesia no que faz. Mas é, sem dúvida, um talento anônimo de Curitiba.

Conheça melhor a história das cúpulas de igrejas aqui

Você já pisou no trabalho do mestre Valmir Jorge Gomes

Os tradicionais mosaicos de petit-pavé estão enraizados na cultura de Curitiba. Experimente falar para um curitibano que eles são perigosos, que o melhor seria substituí-lo  do calçadão da XV. Com certeza será motivo de discussão. Mas há um cidadão da cidade que pode ser eleito o maior defensor dos mosaicos portugueses. O calceteiro Valmir Jorge Gomes, de 60 anos, tem por ofício a colocação das peças com perfeição.
Valmir Gomes, seu martelo e as pedras de petit pavé: 40 anos de história. Foto: Fernando Zequinão / Gazeta do Povo
Valmir Gomes, seu martelo e as pedras de petit pavé: 40 anos de história. Foto: Fernando Zequinão / Gazeta do Povo
“Elas são um espelho da cidade”, reflete o conhecedor e defensor de uma colocação perfeita e delicada. Para tanto usa um martelo especial, com apenas 700 gramas. “É um petit-pavé sem brutalidade, com delicadeza”, diz afirmando serem necessárias apenas três batidinhas para a fixação, sob pena de estragar o mosaico.
Detalhe da colocação das pedras. Foto: Fernando Zequinão / Gazeta do Povo
Detalhe da colocação das pedras. Foto: Fernando Zequinão / Gazeta do Povo
O bom calceteiro, na opinião de Valmir, vê com as mãos. Só pelo tato ele sabe qual das seis faces da pedra encaixará melhor.
Tanta técnica rendeu reconhecimento, por aqui e lá fora. Um amigo da Itália convidou Valmir para fazer uma calçada de petit-pavé em Bordeaux, na França. Convite que ele não pode aceitar, pelas dificuldades que envolvem cruzar o oceano em uma viagem internacional. “Mas ainda quero ir.”
Para chegar ao resultado final com perfeição todos as etapas são importantes. Foto: Fernando Zequinão / Gazeta do Povo
Para chegar ao resultado final com perfeição todos as etapas são importantes. Foto: Fernando Zequinão / Gazeta do Povo
Outro sonho é ensinar o ofício a outras pessoas. Para isso, ele precisa do diploma da Escola de Calceteiros da Câmara Municipal de Lisboa, cidade que é um dos berços da arte. O pedido para fazer o curso e obter o título foi aceito, mas ele teria de viajar de uma semana para a outra, o que não foi possível. “Mas não desisti. Ainda vou dar um jeito de deixar meu legado”, garante.
A gente contou toda a história de Valmir Jorge Gomes, aqui.
*Daliane Nogueira, Luan Galani e Mariana Domakoski, especial para a Gazeta do Povo

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