Estilo & Cultura

Criação brasileira, “capa” para prótese fatura Leão em Cannes na categoria design de produto

Carolina Werneck*
26/06/2017 14:30
Thumbnail

Vítima de amputação usando a capa para prótese "Confete", projeto da Furf. Foto: Divulgação

Os designers Rodrigo Brenner, 26 anos, e Mauricio Noronha, 27, da Furf Design Studio, foram os primeiros brasileiros a receber um Leão na categoria design de produto no Cannes Lions, um dos principais prêmios de criatividade do mundo. O Leão de Bronze foi concedido à “Confete“, uma capa para prótese de perna feita com poliuretano.
O produto premiado foi lançado em dezembro de 2016. Desde então, já foram duas grandes premiações de nível mundial. Em abril de 2017, a Confete levou o prêmio “Best of the Best” no Red Dot Award, também na categoria design de produto. Brenner diz estar surpreso com o rápido reconhecimento do design da prótese. “Nós nunca tínhamos feito nada da área médica. Então a gente fechou o contrato e depois se deu conta de que a gente não sabia bem o que fazer. Mas acho que foi justamente essa visão quase inocente, não viciada, que fez a gente inovar da maneira como a gente inovou.”
A oportunidade de desenhar a prótese chegou por acaso. Noronha conheceu o dono da Ethnos Produtos Ortopédicos enquanto fazia snowboard durante uma viagem. Tempos depois, a empresa entrou em contato com ele para que a Furf desenvolvesse uma alternativa para as próteses existentes no mercado, em geral muito caras e pouco versáteis. “Um dos principais efeitos desse projeto foi transformar uma coisa que poderia causar um distanciamento das pessoas em algo que acaba aproximando as pessoas. Os relatos dos que usam são de que as outras pessoas se aproximam falando sobre a prótese”, conta Brenner.
Capa para próteses de perna da Furf Design Studio levou o Leão de Bronze na categoria design de produto, em Cannes. Foto: Divulgação
Capa para próteses de perna da Furf Design Studio levou o Leão de Bronze na categoria design de produto, em Cannes. Foto: Divulgação

Desenhando autoestima

Os dois amigos, que se formaram juntos em Design de Produtos pela Pontifícia Universidade Católica (PUCPR) em Curitiba, dizem que o que motivou a criação da Confete foi a possibilidade de melhorar a qualidade de vida de pessoas que sofreram amputações. “No desenvolvimento, a gente imergiu totalmente para tentar se aproximar do que essas pessoas sentem. A gente acredita que a empatia é uma das principais habilidades que você pode ter no design”, afirma Noronha. Para eles, o reconhecimento que vem dos usuários do produto parece ser tão importante quanto o conquistado pelas premiações. Brenner explica que o “processo de criação que a gente usa é exatamente o mesmo, seja para uma cadeira, um vaso ou a prótese. A gente se apaixona mesmo é pela história do que a gente está fazendo”.
No caso da prótese premiada, a qualidade de vida é fruto do acesso mais fácil a um produto capaz de trazer de volta a autoestima de quem precisou amputar uma perna. De acordo com os designers da Furf, as capas de prótese comuns não permitem que seus usuários se sintam emocionalmente confortáveis. “Há muito tempo as pessoas tentam devolver o volume à prótese de perna. Isso ou fica muito feio ou fica perfeito demais, e a pessoa sabe que não é a perna dela. Isso é muito frustrante para os amputados e abala muito o emocional deles”, diz Noronha.
Ao longo dos últimos anos, algumas soluções surgiram, principalmente na Alemanha. “Eles pegam uma perna, escaneiam em 3D, espelham e imprimem em 3D. Isso é maravilhoso e funciona bem, mas é muito caro”, explica Brenner. O processo, além de demorado, não pode ser replicado. Cada produto é único e não se pode fabricá-lo em larga escala. É aí que reside a magia da Confete.
Foto: Divulgação
Foto: Divulgação
Depois de estudar a fundo o universo de vítimas de amputação junto à Ethnos, a Furf criou um modelo que serve para ambas as pernas. O produto também é adaptável a usuários de diferentes alturas. “A gente se deu conta de que estava desenhando autoestima, e não plástico. Então a gente partiu da questão: ‘como a gente consegue democratizar a autoestima?'”, relembra. A padronização do processo e do produto barateou o custo da capa. Segundo a Furf, enquanto uma capa tradicional chega a custar R$ 4 mil, a Confete é comercializada a valores entre R$ 300 e R$ 400.

Design com bossa

Apesar das grandes conquistas feitas pela Furf, Brenner e Noronha não param. A motivação, segundo eles, vem da necessidade de contribuir para que o mundo esteja em constante evolução. “O mundo não precisa de mais uma cadeira, não precisa de mais uma mesa. Talvez não precise nem de mais uma capa de prótese. Mas ele pede por mais poesia, por mais melodia”, teoriza Noronha. A visão, que pode parecer romantizada, na verdade é muito tangível e tem origem nas influências apontadas pelos designers para seus trabalhos. Uma dessas influências é a bossa nova.
“A gente tem essa obsessão por simplificar ao máximo. Quando chega ao ponto de não dar para tirar mais nada, a gente coloca um toque de poesia”, diz Brenner. Para ele, o design deveria ser encarado a partir da origem latina da palavra. “Design não é desenho, do inglês. Design vem do latim, e quer dizer significado. O design precisa ser olhado como ‘aquele que põe significado’.”

*especial para a Gazeta do Povo

LEIA TAMBÉM

Enquete

Você sabe quais são as vantagens de contratar um projeto de arquitetura para sua obra de reforma ou construção?

Newsletter

Receba as melhores notícias sobre arquitetura e design também no seu e-mail. Cadastre-se!