Estilo & Cultura

De beco descampado a mercado público, a praça que guarda uma rica trajetória de Curitiba

Stephanie D’Ornelas*
16/07/2018 10:30
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Em 1928 a praça recebeu a atual alcunha em homenagem a Generoso Marques dos Santos, jornalista, advogado, professor e governador do Paraná em 1891. Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo | Leticia Akemi

Um passeio pela Praça Generoso Marques, no centro de Curitiba, pode revelar muito do passado da capital paranaense para quem a observa com um olhar atento. Considerada uma das praças com o maior acervo histórico-cultural da cidade, o largo abriga casarões construídos no final do século 19 até o início do século passado que marcam os primórdios da povoação de Curitiba. De um lado está a Casa Edith, uma das lojas mais antigas da cidade, que ostenta em sua fachada de estilo neoclássico uma placa já desgastada pelo tempo com o número 1879, ano de construção do prédio azul. Do outro, encontra-se o suntuoso Palacete Tigre Royal, construído em 1916, de arquitetura eclética e ar parisiense.
Bondes elétricos, que circularam na capital paranaense entre as décadas de 1910 e 1950, cruzavam a praça. Foto: Joao Baptista Groff / Acervo Casa da Memória.
Bondes elétricos, que circularam na capital paranaense entre as décadas de 1910 e 1950, cruzavam a praça. Foto: Joao Baptista Groff / Acervo Casa da Memória.
“A praça mantém ainda boa parte do casario preservado, principalmente de estilo eclético. Boa parte são unidades de interesse e preservação. É um conjunto bastante significativo”, conta o historiador Marcelo Sutil, diretor de patrimônio cultural da Fundação Cultural de Curitiba. Outra construção de destaque é o Palacete Joaquim Augusto de Andrade, na esquina com a Rua Riachuelo. Construído em 1915, exibe muita semelhança com o Palacete Guanabara, em Belo Horizonte. No centro do largo todo calçado em petit-pavé está sua principal atração, o centenário prédio do Paço da Liberdade. “O Paço é o único bem de Curitiba tombado tanto pelo Iphan, em nível federal, quanto pelo estado e pelo município”, afirma Sutil.

O mercado que deu lugar à prefeitura

Mesmo os passos apressados dos pedestres que atravessam a Generoso Marques podem lembrar outra época, em que o vai e vem constante era regra: o local em que está hoje o Paço da Liberdade abrigou o agitado mercado público da cidade até o início do século passado. Instalado ali em 1874, o Mercado Municipal – também chamado de Mercado Novo – deu vida à praça, que até então era uma região pouco habitada e sombria conhecida como Largo da Cadeia, pois estava situada nos fundos do prédio da Cadeia Pública.
“A inauguração do prédio […], além de ocasionar a mudança do nome de Largo da Cadeia para Praça do Mercado, transformou o local semi-abandonado num espaço barulhento e agitado pelo burburinho de carroças e de vendedores”, conta a historiadora Roseli Boschilia em boletim informativo da Casa Romário Martins. Em 1890, a Praça do Mercado mudou novamente de nome, passando a se chamar Praça Municipal.
O prédio do Paço da Liberdade, que data do século 19, é, sem dúvida, a grande referência da praça. Foto:  Letícia Akemi / Gazeta do Povo
O prédio do Paço da Liberdade, que data do século 19, é, sem dúvida, a grande referência da praça. Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
De autoria do engenheiro Gottlieb Wieland, responsável por diversos prédios significativos da cidade na época, o mercado contava com pouco mais de vinte quiosques, onde eram vendidos cereais, hortigranjeiros e carne. O grupo de comerciantes era formado principalmente por imigrantes portugueses, alemães e italianos, que, posteriormente, passaram a dividir o comércio na praça com judeus e árabes. O mercado permaneceu no local até 1913, quando foi transferido para a atual Praça Dezenove de Dezembro.
Imagem do antigo Mercado Municipal em foto atribuída ao ano de 1910. Foto: Arthur WIischral / Acervo Casa da Memória.
Imagem do antigo Mercado Municipal em foto atribuída ao ano de 1910. Foto: Arthur WIischral / Acervo Casa da Memória.
A partir de então, o cenário comercial da praça abriu espaço para a política. O mercadão foi demolido e, em 1917, foi inaugurado no local o prédio do Paço da Liberdade, chamado então de Paço Municipal, que abrigou a primeira sede própria da Prefeitura de Curitiba. Completamente reurbanizada, a paisagem passou por uma mudança drástica. “A presença do imponente edifício, cujos ocupantes eram mais elegantes e menos barulhentos, transformaria a área antes desvalorizada pelo odor desagradável de restos de verdura e a presença de animais”, explica Boschilia no boletim. Projetado por Cândido de Abreu, a esplêndida construção obedeceu ao modismo eclético da época, com detalhes neoclássicos e desenhos art-nouveau. A prefeitura foi ali sediada até 1969, quando foi transferida para o Palácio 29 de Março, no Centro Cívico.

Centro cultural

Detalhes do palácio art-nouveau, o Paço da Liberdade na Praça Generoso Marques. Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo.
Detalhes do palácio art-nouveau, o Paço da Liberdade na Praça Generoso Marques. Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo.
Desde a mudança do eixo político da cidade para o Centro Cívico, a Praça Generoso Marques tomou nova forma, transformando-se em point cultural. O antigo prédio da Prefeitura abrigou o Museu Paranaense entre 1974 e 2002. Depois disso, o palácio art-nouveau atravessou um período de precário estado de conservação, situação que só se alterou em 2009, após restauro e reinauguração do Paço da Liberdade como centro cultural. Cercado pelo comércio que funciona nos casarões seculares e defronte ao Mercado das Flores que reúne os floristas mais antigos da cidade, o Paço é o coração da praça: é o lugar ideal para tomar um café sem pressa, conferir exposições e ler um livro ou jornal na biblioteca pública que abriga.
*Especial para a Gazeta do Povo

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