Estilo & Cultura

Relíquias artísticas e móveis de época se perdem nos palácios de Brasília

HAUS, com Estadão Conteúdo
06/03/2017 13:01
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Fachada do Palácio da Alvorada, onde foram encontradas diversas obras de arte e móveis de época danificados. Foto: Ichiro Guerra/Divulgação | Ichiro Guerra

Da série de acontecimentos diários que a gente só vê por estas bandas: uma investigação aberta a pedido da Diretoria de Documentação Histórica da Presidência da República descobriu obras de arte e móveis de época seriamente danificados nos palácios do Planalto e da Alvorada. Algumas relíquias foram encontradas empilhadas como se fossem entulhos e duas telas de Cândido Portinari, avaliadas em R$ 60 milhões, estão em estado crítico.
Da ação de fungos ao mofo, passando pelo ressecamento, várias foram as avarias encontradas em quadros, gravuras, tapetes e móveis, muitos expostos sem piedade ao sol. Na lista constam duas poltronas Oscar, de Sérgio Rodrigues, com assento e encosto em palhinha à espera de socorro, além de uma tela de Alberto da Veiga Guignard, castigada por manchas.
O inventário constatou ainda o sumiço de um vaso de cerâmica pintado por Eliseu Visconti, que pertence à coleção original do Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, e encontrou um vaso oriental do século 19 que aparentemente foi quebrado e remendado com cola de maneira amadora.
Mezanino do Palácio da Alvorada. Ao fundo, tapeçaria Múmias, de Di Cavalcanti, urnas mortuárias Marajoara e duas estatuetas de Alfredo Ceschiatti. Foto: Ichiro Guerra/Divulgação
Mezanino do Palácio da Alvorada. Ao fundo, tapeçaria Múmias, de Di Cavalcanti, urnas mortuárias Marajoara e duas estatuetas de Alfredo Ceschiatti. Foto: Ichiro Guerra/Divulgação
Até agora o governo abriu seis processos de sindicância para apurar os danos ao patrimônio público e se houve negligência na manutenção do acervo de cerca de 13 mil bens móveis, artísticos, históricos e culturais, conforme determinação do Tribunal de Contas da União.
No depósito que abriga “bens inservíveis” dos palácios, foram resgatados tapetes persas esburacados e outros dois da Casa Caiada, um deles com 20 m², feito especialmente para a Presidência, com rasgos nas pontas.
Em dezembro, 48 das 49 obras emprestadas pelo Museu de Belas Artes ao governo, em regime de comodato, foram devolvidas pela administração de Michel Temer, causando grande polêmica.
Para Antônio Lessa, diretor de Documentação Histórica do gabinete presidencial, a devolução das peças era uma necessidade. “Havia danos em mais de 80% das pinturas e todas as obras precisavam de alguma medida de conservação”, disse Lessa.
A sindicância da Diretoria de Documentação Histórica ainda não avaliou o estado do acervo no Jaburu e na Granja do Torto. A prioridade de Lessa, agora, é restaurar os Portinari, instalar câmeras de vigilância e uma cúpula de vidro reforçado para proteger as obras no Planalto e esvaziar os depósitos, onde repousam camas de jacarandá, peças assinadas por Joaquim Tenreiro, sofás de design e mais de cem cadeiras Tião e Kiko, também de Sérgio Rodrigues.
“Isso tudo é uma lástima”, afirmou Lessa. “Esses senhores que se dizem curadores criticam a devolução das obras para o museu, mas deveriam estar atentos à conservação do acervo, e não só à decoração.”
Tapeçaria de Di Cavalcanti e três mapas antigos emoldurados: mapa da América do Sul (1645), carta geográfica do Brasil (sem data) e mapa do Brasil com as capitanias gerais (1656)Foto: Ichiro Guerra/PR.
Tapeçaria de Di Cavalcanti e três mapas antigos emoldurados: mapa da América do Sul (1645), carta geográfica do Brasil (sem data) e mapa do Brasil com as capitanias gerais (1656)Foto: Ichiro Guerra/PR.
Ex-curador dos palácios no governo Dilma Rousseff, o arquiteto Rogério Carvalho reagiu no mesmo tom. “Essa criatura (Lessa) não tem a menor ideia do trabalho que fizemos porque é advogado e não entende nada”, rebateu ele. “Quando cheguei lá no Planalto, aquilo era um pardieiro. Tivemos de recuperar tudo. Os tapetes não foram rasgados na gestão da Dilma nem do Lula. Foram antes.”
O ex-diretor de Documentação Histórica Cláudio Rocha contou que Dilma pediu a restauração dos tapetes do Alvorada e resgatou cadeiras originais do salão de banquetes. “O problema é que a administração dos palácios é negligente. Prefere muito mais cuidar de carro e apartamento funcional do que de obras de arte”.

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