Empreendimento da Porsche em Itajaí é alvo de denúncia envolvendo servidores públicos

Sharon Abdalla
27/07/2017 10:30
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Foto: Divulgação

Uma denúncia apresentada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) envolvendo o suposto pagamento de propina para o licenciamento ambiental do empreendimento Porsche Design Towers Brava adicionou um novo capítulo à execução do projeto, assinado pela Construtora Carelli em parceria com a Porsche Design na região da Praia Brava.
Ajuizada pelo Promotor Regional do Meio Ambiente de Itajaí, Alvaro Pereira Oliveira Melo, a denúncia pede o afastamento de três servidores comissionados da Fundação do Meio Ambiente do município (Famai) suspeitos de receber “vantagem indevida” para que dessem prosseguimento à licença ambiental do empreendimento. Segundo o MP, isso contraria posicionamentos anteriores de técnicos efetivos do órgão, que já tinham negado a licença por três vezes.
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Esta não é a primeira vez que o Ministério Público se manifesta em relação às questões ambientais do Porsche Design Towers Brava, cujo projeto prevê a construção de quatro torres residenciais e mais de 700 apartamentos em “meio à Mata Atlântica”. Em maio de 2016, o órgão já havia solicitado à Justiça liminar que proibisse o município de Itajaí de emitir alvarás de construção, licenças e permissões urbanísticas ao empreendimento, em virtude de ele estar localizado em área tida como de proteção ambiental.

A denúncia

Entregue na semana passada à Justiça, a denúncia apresentada pelo MP de Santa Catarina aponta um suposto acordo envolvendo o pagamento de propina no valor de R$ 1,5 milhão para a liberação do licenciamento ambiental do Porsche Design Towers Brava. Seis pessoas e duas empresas são citadas na denúncia: Dalmo e Cauey Carelli, proprietários da Carelli Propriedades Construtora e Incorporadora; a empresa Proteger Consultoria Ambiental, na figura de seu proprietário, Régines Roeder; Victor Valente Silvestre e Patrick Soares, superintendente e diretor de licenciamento da Famai, respectivamente; e Isabella Kleis Platt, assessora jurídica do órgão.
Segundo o Ministério Público, a partir da posse do novo superintendente e do diretor de licenciamento, no início deste ano, a Construtora Carelli teria vislumbrado “uma oportunidade para desconstruir argumentos técnicos até então lançados (…), através de uma criminosa simbiose entre a direção da Famai e a empresa Proteger Consultoria Ambiental, a fim de garantir o prosseguimento do processo e o futuro deferimento” da licença ambiental. Isso decorreria do fato de Victor Valente Silvestre e Patrick Soares serem ex-funcionários da empresa de consultoria ambiental e de o primeiro deles ainda ser casado com a sobrinha do proprietário da Proteger, Régines Roeder.
O “esquema articulado” pela construtora, ainda de acordo com o MP, envolveria o pagamento da propina, através da Proteger, para que os dois funcionários comissionados adotassem posições técnicas contrárias às dos servidores de carreira da Famai e favorecessem a construtora no tratamento dos fatos referentes ao licenciamento ambiental do Porsche Design Towers Brava.
“O que fizemos, como órgão ambiental e como gestores, foi cumprir a legislação ambiental, que não foi cumprida pela gestão passada. O processo foi indeferido sem que fossem pedidas as complementações para a construtora, como aponta a legislação estadual. Nós solicitamos uma série de estudos complementares, que ainda não foram feitos, e demos a oportunidade para que o empreendedor se manifestasse. O empreendimento não está licenciado. Via de regra ele não existe. O que existe é a proposta do empreendimento”, aponta Victor Valente Silvestre, superintendente da Famai, que afirma não ter relações com o proprietário da Proteger e desconhecer qualquer aproximação dele com a Carelli antes do processo.

Investigação

As investigações que resultaram nos termos que embasam a denúncia do Ministério Público de Santa Catarina partiram de diligências da Polícia Federal (PF) durante a operação “Conexão Miami”. Realizada em maio deste ano, ela tinha por objetivo investigar fraudes em contratos de câmbio envolvendo o empreendimento Porsche Design Towers Brava.
Entre os e-mails interceptados pela PF na operação havia, de acordo com a denúncia, mensagens contendo uma minuta de contrato de prestação de serviços entre a Carelli e a Proteger, no valor de R$ 1,5 milhão. O documento seria referente à viabilização e à obtenção do licenciamento ambiental prévio para o Porsche Design Towers Brava, que seria “chancelada por Victor Valente Silvestre (…) e Patrick Soares“, de acordo com o MP-SC.
“A Carelli não contratou a Proteger [para o licenciamento ambiental do Porsche Design Towers Brava] e não pagou R$ 1,5 milhão a ela. Não há crime nas condutas de Dalmo, Cauye, Famai e Proteger. É muita inteligência da parte do promotor conseguir ver um crime onde sabe que [ele] não ocorreu”, afirma Luiz Eduardo Cleto Righetto, advogado da Carelli e dos representantes da empresa, Dalmo e Cauey.
Na opinião da promotoria, este documento teria sido substituído por um segundo contrato, referente à prestação do serviço para a obtenção do licenciamento ambiental de um empreendimento a ser construído em Balneário Camboriú, “a fim de mascarar o pagamento da propina acordada” entre a Carelli e a Proteger. A data em que este contrato foi assinado (após a posse do superintendente da Famai) e a localização de uma pasta identificada como sendo do empreendimento de Balneário Camboriú, mas cujo conteúdo referia-se ao empreendimento da Praia Brava, durante as buscas e apreensões realizadas pela PF, estão entre os argumentos que reforçam a tese do MP-SC de que este segundo contrato teria sido utilizado para disfarçar o pagamento da propina.
Em nota, a Proteger Consultoria Ambiental afirma que “não realizou estudos ambientais para o empreendimento Porsche Design” Towers Brava e que “não participa do processo de licenciamento ambiental deste empreendimento na Famai”. No comunicado, a empresa destaca que o único empreendimento para o qual teve seus serviços contratados pela Carelli é o “Condomínio Contemporist, a ser implantado na Rua 1.101, em Balneário Camboriú”. Ainda segundo a Proteger, o estudo ambiental deste empreendimento “já foi elaborado, possui anotação de responsabilidade técnica e iniciou o trâmite de licenciamento no órgão competente”.

Crime ambiental

A denúncia apresentada pelo promotor Alvaro Pereira Oliveira Melo, do MP-SC, ainda acusa os três funcionários da Famai citados no caso de ter omitido e separado, “de forma enganosa, a discussão acerca da existência de vegetação da Mata Atlântica [e de espécies de fauna e flora ameaçadas de extinção] no local, fato que efetivamente impediria a emissão da licença ambiental”.
“Não há omissão/descontextualização de circunstância do empreendimento Porsche Design Towers Brava. O processo foi analisado e [foi] elaborado um parecer técnico [que], por sua vez, não viabiliza o empreendimento e sim apresenta apontamentos [sobre] onde se fazem necessários diversos esclarecimentos”, aponta o diretor de licenciamento da Famai, Patrick Soares, que respondeu por e-mail à reportagem. “Este procedimento segue o rito normal para o licenciamento ambiental, assim como os outros processos em trâmite nesta fundação. É dever do órgão ambiental, embasado pela Resolução Conama n. 237/97, oportunizar a complementação e esclarecimentos quanto aos estudos apresentados. Em nenhum momento houve promessa ou recebimento de ‘vantagens indevidas’ para o prosseguimento do licenciamento”, acrescenta.
O superintendente da Famai, Victor Valente Silvestre, também é acusado de manter o processo de licenciamento ambiental do empreendimento “trancado em sua sala”, diferentemente do que ocorria com os demais em tramitação no órgão.
“Esta alegação não passa de uma inverdade, conquanto todos os servidores envolvidos neste procedimento tinham/tem acesso aos autos, bastando requerer a quem estivesse com a posse dele”, afirma por e-mail Isabella Kleis Platt, assessora jurídica da Famai. Ela se diz surpresa com a denúncia ao lembrar que “o advogado não pode ser responsabilizado criminalmente pelo seu parecer no exercício da advocacia”, o que, segundo ela, foi o que ocorreu.

Afastamento

Com base nos fatos apresentados nas 44 páginas da denúncia, a Promotoria Regional do Meio Ambiente de Itajaí requereu à Justiça o afastamento cautelar dos servidores públicos comissionados da Famai, até mesmo para que os funcionários efetivos do órgão, que “se expuseram e revelaram um esquema fraudulento” dentro do órgão não precisem conviver com os “em tese envolvidos neste esquema”, como aponta o promotor Alvaro Pereira Oliveira Melo.
O juiz Sérgio Luiz Junkes, da 1ª Vara Criminal de Itajaí, no entanto, apresentou prazo de 15 dias para que os funcionários apresentem sua defesa preliminar por escrito. Somente depois disso ele deverá avaliar se acolhe ou não a denúncia apresentada pelo MP catarinense.

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