Qual o futuro do último prédio sobrevivente da Matte Leão em Curitiba?

André Nunes*
11/12/2017 09:30
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Foto: Leticia Akemi / Gazeta do Povo | Gazeta do Povo

Sede administrativa da companhia de erva mate Leão Junior por várias décadas, a edificação de esquina das Rua Piquiri com a Avenida Getúlio Vargas, no Rebouças, chama atenção pelo estado de abandono que vive nos últimos anos. Parte dos terrenos adquiridos pela Igreja Universal – que inaugurou em 26 de novembro seu Templo Maior na área ao lado – o prédio é uma Unidade de Interesse de Preservação (UIP) e será revitalizada. É o que garante o Instituto de Pesquisa e Planejamento de Curitiba (Ippuc).
“Trata-se de um segundo processo que corre em separado da Igreja, não como mitigação ou compensação. A Unidade de Interesse de Preservação é protegida: qualquer uso que seja dado ao lote, como estacionamentos e sede administrativa, é vinculado ao restauro e à manutenção da UIP”, destaca a nota enviada à HAUS pela assessoria de comunicação do Ippuc.
Foto: Leticia Akemi / Gazeta do Povo
Foto: Leticia Akemi / Gazeta do Povo
Ainda de acordo com a nota do Ippuc, a apresentação de projeto de restauro da UIP é condicionante para qualquer atividade no lote. “O lote onde está a UIP é de grandes dimensões e a Igreja Universal solicitou uma análise prévia para a instalação de uma ala administrativa e de estacionamento no espaço anexo à casa.”
Procurada pela reportagem, a assessoria de comunicação da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) confirmou a informação de que “o imóvel será preservado a partir de oferta voluntária da Iurd – depois confirmada em acordo formal assinado. Depois de restaurada, a edificação será utilizada pela área administrativa da Universal“.

Patrimônio industrial

Urbanistas e pesquisadores ouvidos pela HAUS ao longo do movimento Reação Urbana são unânimes em enfatizar a importância de se preservar e dar novo uso ao patrimônio industrial das cidades. Dessa forma, classificam a demolição da antiga fábrica da Matte Leão como um dos exemplos simbólicos do descaso da sociedade com esse patrimônio.
Antes e depois da edificação. Foto: Leão Alimentos e Bebidas
Antes e depois da edificação. Foto: Leão Alimentos e Bebidas
“Diante da catástrofe que foi a autorização da demolição do conjunto de edifícios da Matte Leão em 2011, um dos nossos registros mais importantes do patrimônio industrial de Curitiba, é insuficiente preservar um ou mais registros isolados diante de um grande desmantelamento que o Rebouças vem sofrendo. O bairro pertence aos que vêm depois de nós e, por questões de cunho ético, cultural e científico, nós não temos o direito de apagar sua história, seus vestígios e muito menos tratar com desrespeito o que deve ser preservado”, critica Iaskara Florenzano, arquiteta e urbanista com especialização em Gestão Técnica do Meio Urbano pela PUC-PR.
Apesar de reconhecer a importância da manutenção da UIP, a professora reforça que o Ippuc deveria se ocupar em levantar e preservar todo o patrimônio que ainda resta na cidade. “Temos que ter consciência de tudo aquilo que estamos perdendo, tudo aquilo que nem sabemos que já perdemos, do valor inestimável desta área para o entendimento da cidade de Curitiba como nós a conhecemos, e da falta de reconhecimento do valor cultural da área e sua paisagem como um bem preservável“, aponta.

A Leão Júnior

Fundada em 1901 por Agostinho Ermelino de Leão Junior como companhia de industrialização de erva-mate no Paraná, a Leão Junior enfrentou três grandes incêndios em suas fábricas, mas superou as adversidades e, na década de 1920, já era a maior empresa do setor, com um volume de exportação de mais de 5 mil toneladas por ano.
Agostinho Ermelino de Leão Junior, fundador da Leão Junior. Foto: Leão Alimentos e Bebidas
Agostinho Ermelino de Leão Junior, fundador da Leão Junior. Foto: Leão Alimentos e Bebidas
Também no início de sua história, a Leão Junior exportou a erva-mate na forma de chimarrão para a Argentina, o Uruguai e o Chile. Nessa época, a erva-mate era apenas vendida verde, para chimarrão.
No calor do Rio de Janeiro na década de 1950, então capital federal, surgiu o hábito de tomar mate gelado. A bebida era muito vendida nas praias e no Maracanã. Anos depois, nos anos 1980, reconhecendo a importância desse hábito, a Leão lançou o Matte Leão em copos selados, produto pioneiro no Brasil no ramo dos chás prontos para beber.
Antiga embalagem do Matte Leão. Foto: Leão Alimentos e Bebidas
Antiga embalagem do Matte Leão. Foto: Leão Alimentos e Bebidas

Maria Clara

No início do século 20, era raro ver uma mulher à frente de grandes empresas, principalmente no interior do Paraná. Mesmo assim, em 1907, a viúva de Agostinho Ermelino, Maria Clara de Abreu Leão (que dá nome à estação-tubo na Av. João Gualberto), enfrentou o desafio após a morte do marido. Em fevereiro de 1908, ela assumiu o comando da companhia, tornando-se uma pioneira nesse ramo de negócios no país. Uma curiosidade: por um curto período de tempo, a empresa chegou a se chamar Viúva Leão Junior, sendo logo rebatizada Fábrica Leão Junior.
Em 2007, a Leão Junior passou a integrar o Sistema Coca-Cola Brasil e, em 2012, após a conclusão do processo de incorporação, ganhou o nome oficial de Leão Alimentos e Bebidas.
*Especial para a Gazeta do Povo.

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