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Lachlan Watson|
Lachlan Watson|| Foto: Reprodução

Pense numa mulher jovem de seios amputados. A que essa imagem lhe remete? Se você for de cultura católica, provavelmente pensará na imagem de Santa Águeda, reconhecível por segurar uma bandeja com um par de seios. Ninguém precisa ser psicanalista para apontar o simbolismo presente: seios de mulher jovem estão ligados à sexualidade, e a jovem cristã, ao desafiar o poder secular para seguir seu ideal de castidade, suportara uma brutal castração.

Saindo do reino simbólico (mitológico, para quem não tem fé) e partindo para o quotidiano, seios amputados remetem a câncer de mama. A mastectomia é tida por grande trauma para as doentes, e felizmente a cirurgia plástica avança de modo a tornar as próteses  mais convincentes. Nada repara, porém, a capacidade de amamentar e de sentir prazer erótico ali.

De um jeito ou de outro, amputação de seios remete a castração e sofrimento. Qual não será a reação do leitor ao descobrir que na sociedade norte-americana as pessoas já se defrontam com capas de revista onde uma moça maquiada exibe o torso com cicatrizes no lugar dos seios. Amputação pop.

Se o leitor clicou e não entendeu nada, cabe explicar que a moça se identifica como transgênero não-binário. Descobre-se fácil que é uma atriz nascida em 2001 e tem um verbete até na Wikipédia lusófona. Aí encontramos a informação de que fez mastectomia para se adaptar à própria identidade de gênero, e tem como fonte uma reportagem de 2018 em que ela, já amputada, trata da própria transexualidade.

Conta que começou a se sentir “um pouco queer” aos 13 anos, considerou-se uma lésbica cisgênero (cis é o contrário de trans) durante um ano e meio, mas concluiu que o rótulo “não encapsulava a dor que eu estava sentindo de verdade. Havia algo relacionado ao corpo, havia algo a mais aí, e tudo o que tive de fazer foi rotular isso como eu ser trans.”.

Aos 14 ou 15 anos, é normal meninas se angustiarem com o próprio físico; anormal é estarem tão versadas no vocabulário da ideologia de gênero, e acharem que rótulos resolvem problemas. Continuando: “O rótulo abrangeu de maneira precisa a rejeição de Watson à sua forma feminina, e cerca de dois anos e meio depois [de deixar de se considerar lésbica], Watson se preparava para do próximo passo na sua transição e foi até a clínica de gênero da Duke University”. Depois, “olhando para as cinco páginas com os efeitos colaterais da testosterona […], Watson percebeu que o crescimento de pelos faciais e o engrossamento de sua voz pareciam tão errados quanto o crescimento dos seus seios. ‘Eu percebi que o problema não era eu não ser homem, o problema era só eu ser mulher’, disse ele [sic]. E assim chegou à fase atual […] como não-binário, residindo no ‘vazio do gênero’. Identificar-se como não-binário significa que uma pessoa não se identifica totalmente como homem, nem como mulher, mas existe em algum lugar no espaço ou/ou, nem/nem. Como todas as áreas do espectro de gênero, ser não-binário pode diferir bastante entre as pessoas.”

O livro de Abigail Shrier

Esse caso não está arrolado no livro da jornalista Abigail Shrier Irreversible Damage: The transgender craze seducing our daughters [Dano irreversível: A loucura transgênero que seduz nossas filhas], mas se enquadra em tudo o que ela descreve. Sem tradução para o português, o livro foi lançado ano passado nos Estados Unidos, e contou com a propaganda involuntária dos censores. A Amazon proibiu a editora de fazer publicidade paga. Grandes jornais se recusaram a fazer resenhas. Quando Joe Rogan fez uma entrevista com a autora, os funcionários do Spotify fizeram pressão para que fosse retirada do ar. Tudo isso sob a alegação de que o livro era transfóbico.

Abigail Shrier tem uma tese sobre os Estados Unidos e o Canadá: existe uma loucura transgênero ceifando adolescentes problemáticas, que têm um perfil de doentes muito parecida com a anorexia, e conta com o apoio institucional de médicos e educadores.

A doutrinação começa ainda na pré-escola, quando, sempre a pretexto de combate ao bullying, surge a figura do especialista em gênero, que apresenta o biscoitinho humano (o “genderbread person”) ou o unicórnio do gênero, explicando que orientação sexual, identidade de gênero e sexo biológico são coisas totalmente independentes umas das outras.

Com o sexo, essa gente faz a distorção contrária à da cor de pele. Existem mestiços de várias cores, mas são enquadradas no esquema binário de raças branca ou preta. Existem apenas homem e mulher (sexos masculino e feminino), mas inventa-se que o “gênero” é um espectro contínuo com os dois polos, que são “homem” e “mulher”. Tudo o que está no meio é “não-binário”, “genderqueer” e sei lá mais o quê — toda hora inventam alguma denominação nova.

Em nome do combate ao bullying, apresenta-se então às crianças e adolescentes  as definições psicológicas do que é ser homem ou mulher. E essas definições poderiam sair da boca de um aiatolá. Cito Shrier: “Se ‘mulher’ não pode mais ser definida conforme características físicas ou biologia [– o que seria transfobia –], como as definimos? A proeminente autora transgênero Andrea Long Chu tem a resposta: ‘fêmea é uma “condição existencial universal definida pela submissão aos desejos de outrem’.”

É uma pena que “machismo” seja uma palavra gasta, porque serve exatamente para descrever a ideologia de gênero. A misoginia é tamanha, que as mulheres passam a ser referidas como “breeders” (parideiras) e “bleeders” (sangradeiras), tudo em nome da separação entre biologia e identidade de gênero.

Assim, as meninas da escola que se saem bem em esportes e matemática são tidas como não conformantes de gênero. Talvez a menina Watson fosse assim, daí dizer-se um pouco queer. Queer, literalmente, significa aberração, e era um xingamento dirigido a gays. Foi apropriado pelos ideólogos de gênero como uma coisa elogiosa. De todo modo, uma menina que não se vê como fêmea de aiatolá se acha uma aberração, alguém que não pode ser uma mulher.

Depois, chega a adolescência. Nessa época, as meninas estão todas recebendo uma porção de hormônio novo, ficando mais fracas que os colegas, ganhando peito e bunda, menstruando, tendo cólicas. Meninos morrem de orgulho do buço. Enquanto isso, muitas meninas andam recurvas, com vergonha, quando começam a precisar de sutiã. É natural que sintam um mal estar, e a australopiteco fêmea na puberdade devia sentir também. Mas hoje a cultura geral é a de levar os filhos para a psicoterapia quando eles se sentem mal. O passo seguinte é dar antidepressivo.

Abigail Shrier acha que os pais tentam fazer das filhas umas Belas Adormecidas, que passam uma adolescência indolor e despertam como mulheres feitas. Uma coisa que ela não aponta, mas que eu acho que valia a pena notar, é que muito antidepressivo tem perda de libido como efeito colateral, o que deve fazer muita menina se achar “assexual” ou “agênero”. A humanidade não tem documentação massiva de como é chegar à puberdade com libido inibida.

A escola nos países desenvolvidos é em tempo integral — ao contrário do Brasil, onde tipicamente as crianças estudam ou de manhã, ou de tarde. A faculdade dos Estados Unidos afasta ainda mais o adolescente de casa, pois eles ficam em internatos. Tanto num quanto no outro ambiente, é possível a criança ou adolescente fazer a dita transição social de gênero, ou seja, adotar um nome do sexo oposto e viver uma vida dupla, com um nome no ambiente educacional e outro na família.

O sistema encara os pais como transfóbicos potenciais e não se preocupam em avisar do que está acontecendo. Seu novo nome é o que consta na lista de chamadas. As adolescentes aprendem que agora elas têm uma glitter family, que é a sua verdadeira família, que a compreende e aceita, sem transfobia.

Se a menina ainda na adolescência revelar que é trans aos pais, eles farão aquilo que aprenderam como sendo correto: levarão ao terapeuta. Não saberão que a área passou por uma verdadeira caçada às bruxas (da qual participou inclusive Deirdre McCloskey), em que profissionais e cientistas com décadas de experiência no tratamento de disforia de sexo (identificar-se com o outro sexo) foram banidos como transfóbicos.

Shrier entrevista alguns deles. As práticas anteriores ao surto ideológico eram variadas e focavam em fazer a criança e o adolescente se sentirem bem com o próprio corpo. Mudança de sexo era uma possibilidade terapêutica admitida pela maioria. Todos, porém, tinham em comum um princípio elementar da medicina que consiste em negar o autodiagnóstico. Mas hoje, qualquer terapia que tenha por finalidade fazer a adolescente se sentir bem com o próprio corpo é tida por criminosa, porquanto transfóbica.

Machismo, homofobia e transfobia foram jogados no mesmo balaio retórico do racismo, como crime de ódio e discriminação inaceitável. Valendo-se desse clima, os ideólogos de gênero acusam os tratamentos científicos da disforia de serem análogos às terapias de “reconversão” à heterossexualidade. Consultórios tradicionais e bem sucedidos foram fechados. Restou a “terapia” afirmativa de gênero, que consiste em perguntar ao paciente o que ele é — ou mesmo sugerir que é trans — e aceitar a resposta. Ou seja: autodiagnóstico.

Transexuais têm um índice alto de suicídio. Valendo-se disso, os “terapeutas” dirão aos pais que eles têm que chamar a filha pelo nome desejado, senão ela vai se matar. Aterrorizados, os pais aceitam. O passo seguinte é “pausar” a adolescência com um bloqueador hormonal. O terapeuta dirá que é para esperar a jovem decidir se é menino ou menina, e que não há problemas em retardar a puberdade. Além disso, ver o corpo mudar pode fazê-la se matar – a ameaça de morte é uma constante.

O terapeuta não irá contar que o bloqueador hormonal é, originalmente, o composto usado em castração química de predadores sexuais, nem que o retardo da puberdade afeta também o desenvolvimento cerebral, nem que não há dados suficientes de efeitos colaterais em adolescentes fisicamente saudáveis.

Tampouco contará que mais de 90% das adolescentes quimicamente castradas escolhem mudar de “gênero”. O passo seguinte é tomar testosterona, que dá uma série de complicações, que vão desde a atrofia e secura vaginais ao desenvolvimento de câncer do útero. Por isso, uma histerectomia profilática (tirar o útero) costuma ser feita. Histerectomia causa menopausa precoce. Em suma, é uma bagaceira.

Mas calma que piora. Se a menina em idade escolar não contar essas coisas para o pai, quando chegar à universidade ela poderá começar a tomar testosterona por conta própria sem que os pais saibam. A universidade dá, desde que ela assine um termo de consentimento informado. A Planned Parenthood atua nos campi fornecendo testosterona, que sai pelo preço de uma assinatura da Netflix.

A testosterona termina por viciá-las. Todas essas adolescentes têm problemas de saúde mental além da disforia, sendo comuns a depressão e a ansiedade. A testosterona combate esses dois males, e, como elas não têm terapia honesta à disposição, acabam dependendo da testosterona para ficarem menos deprimidas e ansiosas. A testosterona multiplica as chances de infarto, tornando essas moças ainda mais propensas ao infarto do que homens.

Por fim, cabe assinalar que na faculdade a mania trans tende a acometer as moças com dificuldade de se adaptar. Se elas se revelarem trans, serão subitamente festejadas e aplaudidas. Abigail Shrier notou também que elas pareciam assexuadas. Adolescentes normais estão pensando em beijar alguém. Elas, não. Não demostravam nenhum despertar para o erotismo, normal da idade.  E é assim que elas têm os seios transformados em lixo hospitalar.

Não são poucas as que se arrependem. Abigail Shrier entrevistou algumas, que lhe revelaram a estrutura de seita do movimento. Cabe destacar que elas — as chamadas detransitioners — são acusadas de transfobia e removidas do Twitter.

Que fazer?

O Brasil tem a grande vantagem de não deixar os filhos totalmente entregues à burocracia educacional, mas a ideologia de gênero tem abocanhado algumas das nossas adolescentes ainda assim.

Abigail Shrier dá sete conselhos para prevenir o problema. Um é óbvio, que consiste em não aderir à ideologia de gênero. Outro é impopular: não dar smartphone às adolescentes, porque essa é uma inovação associada à piora da saúde mental das meninas, e é um tremendo instrumento de controle do grupo de ativistas sobre a sua filha. Outro que também deveria ser óbvio é não abandonar a autoridade de pai e mãe. Ao que parece, existe a noção de que os pais devem fazer os filhos se sentirem bem a qualquer custo, e isso impede os pais de dizerem “não” aos filhos. (Os pais da efêmera Rebeca Polzonoff não são assim.)

Foram três. Quarto: reintroduzir a privacidade à casa, ou seja, não ficar mostrando a intimidade familiar nas redes sociais. Se a sua filha resolver que é trans não-binária, a coisa será pior ainda se a internet inteira ficar sabendo; ela não poderá deixar a coisa de lado em paz, e achará que deve satisfação a todo mundo.

Quinta: pensar em dar grandes passos para tirar a filha do ambiente contaminado pela mania trans. Alguns dos pais que Shirer entrevistou resolveram o problema tirando a filha da faculdade e trazendo pra casa, ou mudando-se para a zona rural e deixando-a sem internet, ou (no caso de uma filha de indianos) mudando-se de uma cidade progressista para uma zona de imigrantes indianos.

Sexta: parar de tratar a adolescência como doença – aquilo de achar que dá pra dopar a filha como uma Bela Adormecida para ela não sofrer nesse período. Aí tome-lhe antidepressivos e dependência de terapia. Depois ela, que não amadureceu, vai ao terapeuta, e o terapeuta diz que ela é trans.

Sétima: dizer que é bom ser mulher. Shrier aponta que as feministas de hoje vivem falando alto demais que ser mulher é uma calamidade, e não é. As adolescentes ouvem e acreditam. Daí não ser de admirar que tenham medo de ser mulheres.

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