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A base para o crescimento da produtividade está na educação de qualidade, que deve ser construída desde agora para que seus efeitos sejam percebidos no longo prazo | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
A base para o crescimento da produtividade está na educação de qualidade, que deve ser construída desde agora para que seus efeitos sejam percebidos no longo prazo| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

A produtividade do trabalhador brasileiro é, hoje, pior do que era em 1994. Mais de 20 anos se passaram e junto com eles governos de diferentes partidos e espectros políticos, mas a capacidade brasileira de transformar recursos em bens e serviços em nada melhorou. A conclusão é de um estudo feito pelo Insper em parceria com a consultoria Oliver Wyman, divulgado na semana passada, o qual analisou dados nacionais e internacionais sobre produtividade. 

No Brasil, entre 1996 e 2010, o índice que mede a produtividade, chamado de PTF (produtividade total dos fatores), caiu de forma acentuada em comparação com o resultado americano, saindo de 69% em 1996 para 48% em 2014. O relatório “Panorama Brasil” mostra que no final dos anos 1990 esta queda foi acompanhada pelos países emergentes e da América Latina, mas a partir daí, no início dos anos 2000, estes outros países conseguiram alterar os rumos para uma trajetória ascendente, enquanto que o Brasil continuou registrando níveis cada vez piores de produtividade

Em 2007 esboçamos uma reação, com um crescimento de 2,9% da PTF, sendo que o ano seguinte foi quando obtivemos o melhor resultado de produtividade do trabalhador nas duas décadas analisadas. Mas a partir de 2011 a taxa voltou a cair — aceleradamente — atingindo o pior índice em 2016, último ano disponível na série. 

“A nossa capacidade de transformar trabalho em renda vem caindo há muito tempo. Não é problema de um ou dois governos, é problema do país há décadas. Mas desde 2011 esse problema vem se agravando muito. Ameaçamos uma recuperação da produtividade a partir de 2002 e 2003, mas a partir de 2010 fizemos alguma coisa muito errada que a nossa produtividade voltou a cair em relação ao resto do mundo”, comentou Marcos Lisboa, presidente do Insper, durante a apresentação do relatório na semana passada. 

No fim de 2014, a taxa de produtividade brasileira já havia caído até se igualar à média dos países emergentes, que sempre esteve abaixo da nossa. Em relação à América Latina, estamos cada vez mais distantes de alcançar a média de produtividade dos países da região.  

PIB por trabalhador 

A PTF é um dos componentes usados para calcular o PIB por trabalhador, junto com os índices de capital físico e capital humano, que medem, respectivamente, os investimentos em equipamentos e estrutura que os trabalhadores empregam na produção de bens e serviços, e a qualificação dos trabalhadores. 

Segundo análise feita pela Oliver Wyman e pelo Insper, nas últimas duas décadas o Brasil pouco avançou em sua produção por trabalhador: passou de 25 mil dólares em 1994 para 30 mil dólares em 2016, registrando um crescimento de apenas 19% em mais de 20 anos. Relativamente à produção por trabalhador dos Estados Unidos, estamos em um patamar pior do que estávamos na década de 1990, já que o crescimento do PIB por trabalhador americano registrou crescimento de 48% no período estudado. 

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O que explica essa evolução positiva, embora fraca, da produção por trabalhador, é o desempenho brasileiro nos dois outros medidores: capital humano e físico. 

Desde 2005 o Brasil tem aumentado o estoque de capital por trabalhador, chegando a 36% do capital físico em relação ao americano em 2014. O índice de capital humano também tem crescido — embora mais lentamente — devido, principalmente, ao aumento da escolaridade dos trabalhadores brasileiros: a média de anos de estudo passou de 4,7 anos em 1990 para 7,9 em 2010. Mas, infelizmente, mais investimentos em estrutura e educação não foram revertidos em produtividade. De quem, então, é a culpa? Do trabalhador?

Educação e infraestrutura

Nada disso, segundo a coordenadora do relatório “Panorama Brasil”, Ana Carla Abrão, da consultoria Oliver Wyman. Uma série de fatores que está além do alcance dos trabalhadores influencia os baixos níveis de produtividade no Brasil. Educação e investimentos em infraestrutura continuam sendo os principais problemas. 

“O Brasil hoje conseguiu avançar quanto ao acesso dos jovens à escola e em número de anos de estudo, mas esses jovens não receberam uma educação de qualidade que permita que eles sejam mais produtivos”, disse, explicando o motivo pelo qual a educação ainda é um desafio para o Brasil, mesmo com o aumento da escolaridade. “Nossos jovens chegam aos 15 anos aprendendo português e matemática muito menos do que os jovens de outros países, inclusive os emergentes”, contou Lisboa. 

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Os investimentos em infraestrutura, apesar de terem avançado, mal são suficientes para manter o que já existe. “E quando investimos, investimos mal”, concluiu Vinicius Carrasco, professor do departamento de Economia da PUC Rio, citando como exemplo os recentes investimentos realizados nos aeroportos Viracopos, em Campinas, e Tom Jobim, no Rio de Janeiro, muito além do necessário e que agora têm uma parte de sua capacidade ociosa. “Também podemos citar o fracasso dos leilões de transmissão de energia em decorrência da limitação de retorno para investidores”, acrescentou. 

Outros fatores 

A qualidade da educação e os investimentos ruins em infraestrutura vêm acompanhados de uma série de fatores que prejudica ainda mais a produtividade brasileira. Por aqui, o ambiente de negócios, que é o conjunto de regras e procedimentos as quais os trabalhadores e empresas estão submetidos, é um dos piores do mundo. De acordo com a pesquisa Doing Business do Banco Mundial, o Brasil ocupava em 2017 a 125ª posição do ranking de ambiente favorável para negócios, que avaliou 190 países. 

A gestão empresarial também é motivo de preocupação. O Brasil tem empresas excelentes, mas a média das companhias com baixa produtividade é muito maior aqui do que em outros países. Abrão lembra também que, em parte, isso ocorre pela alta concentração da atividade econômica nas mãos do setor público — cerca de 50%, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). 

O mercado de crédito e a ineficiência do setor público também têm uma participação negativa na composição da taxa de produtividade brasileira. “A burocracia bancária e a alta dívida pública restringem os investimentos que poderiam alavancar a produtividade no Brasil, porque o investimento produtivo concorre com o título público, que devido às altas taxas de juros tem um retorno financeiro maior para o investidor”, explicou Juliana Inhasz, professora de Economia do Insper. Soma-se a isso uma economia extremamente fechada, onde se torna ainda mais caro importar maquinários, que poderiam aumentar a produtividade, devido aos alto custo dos impostos. 

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Para começar a reverter esse cenário, segundo Abrão, o país precisa agir em múltiplas frentes, que vão desde a reforma fiscal, tributária e trabalhista até investimentos mais eficientes que melhorem a infraestrutura do país. Mas ela salienta que a base para o crescimento da produtividade está na educação de qualidade, que deve ser construída desde agora para que seus efeitos sejam percebidos no longo prazo. 

“Analisando os itens que compõem a produtividade, nos momentos bons que tivemos, fomos um pouco melhores do que outros países, mas nos momentos ruins fomos muito piores. E por isso precisamos olhar para os problemas e tentar resolvê-los. Vamos pensar os problemas brasileiros, encarando-os de frente, para mudar essa situação que nos caracterizou nos últimos anos”, concluiu Abrão.

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