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Reunião da Copppal em Honduras, em 2017
Reunião da Copppal em Honduras, em 2017| Foto: Divulgação

Um grupo quase desconhecido de partidos progressistas, reunidos para traçar estratégias políticas na América Latina que incluem pedidos pela liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Embora pareça uma trama conspiratória, essa é a Conferência Permanente de Partidos Políticos da América Latina e do Caribe (Copppal), um fórum internacional de partidos políticos progressistas, social-democratas e de esquerda.

Fundada em 1979, em Oaxaca, no México, a Copppal foi criada por iniciativa do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que comandava o México na época. A organização teve como primeiro presidente o mexicano Gustavo Carvajal Moreno (PRI), que também fora Secretário da Reforma Agrária, senador e deputado federal.

Hoje sediada em Buenos Aires, na Argentina, a organização é composta por mais de 60 partidos políticos de 29 países. Curiosamente, inclui em seu rol representantes nacionalistas de Bonaire (Partido Democrático de Bonaire), Canadá (Parti Québécois), Curaçao (Frente Obrero Liberashon 30 Di Mei 1969 - Partido Trabalhista Krusada Popular) e Porto Rico (Partido Independentista Puertorriqueño).

Do Brasil, fazem parte o PDT (de Ciro Gomes) e o PT (de Lula, Dilma e Haddad). A surpresa é o MDB, de Michel Temer, que assumiu a presidência no lugar de Dilma Rousseff, e foi rotulado como ‘golpista’ pela esquerda.

Questionado pela Gazeta do Povo sobre o papel do partido da conferência, como funciona a articulação entre os participantes e qual o objetivo da organização, o MDB não se manifestou até o fechamento desta reportagem.

Objetivos

Em sua “Declaração de Princípios”, a Copppal se define como um foro de partidos “democráticos e progressistas que priorizam o tema da soberania, o estabelecimento de um governo internacional justo e equitativo e a união dos povos latinoamericanos”.

A declaração também estabelece que o foro “deve defender a democracia pela participação das maiorias e minorias nas funções decisórias do Estado, com medidas jurídicas que garantam as liberdades do indivíduo e a defesa da diversidade ideológica”.

Em paralelo, a Copppal levanta bandeiras predominantes da esquerda como, por exemplo, o desarmamento. Além disso, seu posicionamento característico é sempre a favor das utopias da esquerda latinoamericana, como integração regional irrestrita e ações conjuntas para estabelecer uma ordem econômica internacional na região.

Lula Livre e o mundo de conspirações

A organização é, hoje, presidida por Manolo Pichardo, jornalista, escritor e deputado. Vice-secretário da Secretaria de Relações Internacionais do Partido da Libertação Dominicana (PLD), Pichardo também foi o primeiro presidente dominicano do Parlamento Centro-Americano, o PARLACEN.

Já o vice-presidente é Rubén Berríos Martínez, também presidente honorário da Internacional Socialista e presidente do Partido Independentista Porto-riquenho, que defende a independência do Porto Rico (hoje território dos Estados Unidos) e alega perseguição pelo FBI (Federal Bureau of Investigation) – sem apresentar nenhuma prova concreta para fundamentar as alegações.

Em maio, a Coordenação Geral da Copppal se reuniu em Buenos Aires, na Argentina, em uma campanha mundial de solidariedade, pedindo a liberdade imediata do ex-presidente Lula. Segundo a entidade, o encarceramento é “absolutamente irregular e carente de provas”.

“O único crime que o presidente Lula cometeu foi tirar da miséria mais de 40 milhões de pessoas, tirar o Brasil do Mapa Mundial da Fome, implantar programas sociais estruturais e não permitir o desmonte do Estado brasileiro”, diz a resolução.

Lado definido

Em 2016, o presidente da Copppal, Manolo Pichardo, expressou preocupação e indignação com um “golpe parlamentar” no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff — algo que poderia ter sido resolvido internamente, já que o MDB faz parte da organização.

"O que vivenciamos nesses meses angustiantes foi a crônica de uma morte anunciada que responde a um plano orquestrado por forças de países poderosos e transnacionais em aliança com setores conservadores do Brasil, ligados ao conhecido passado sombrio da nação sul-americana", disse Pichardo na época.

Segundo ele, a América Latina passa por uma série de “golpes suaves” que devem ser impedidos pela Copppal. Ele afirmou ainda que esses “golpes” avançam e representam “o desmantelamento das conquistas sociais” e, consequentemente, um estado de inquietação, tensão e incerteza que “colocará em risco a estabilidade política, social e econômica da região”.

Passado recente

Combater os “golpes suaves”, aliás, foi o ponto central da 34ª Reunião da Copppal (Conferência Permanente de Partidos Políticos da América Latina e Caribe), realizada em outubro de 2016, em Assunção, no Paraguai. Na ocasião, Pichardo comparou o impeachment de Dilma Rousseff ao de Fernando Lugo, no Paraguai, classificando ambos como golpes de Estado.

No mesmo evento, Lugo afirmou que os latino-americanos têm a tarefa de avançar na construção da integração dos povos, sob um modelo latinoamericano de justiça social. Segundo ele, há necessidade de fortalecer os processos democráticos na América Latina e Caribe diante de projetos “autoritários” e “antipopulares”.

Para Pichardo, o impeachment de Dilma foi parte de um plano maior, que ele chama de Plano de Atlanta. “O que aconteceu no Brasil é parte do que defini como o Plano de Atlanta, já que foi nessa cidade americana, em 2012, que foi revelado o desenho de uma estratégia regional para eliminar os governos progressistas da América Latina, sem a participação do voto dos cidadãos ”, disse.

Ele conta que presenciou “por acaso” uma conversa entre ex-presidentes latino-americanos em uma suíte no hotel Marriot, em Atlanta (EUA), no final de novembro de 2012. A reunião teria o objetivo de derrubar lideranças progressistas na região por meio de uma articulação envolvendo a mídia e o judiciário de diferentes países. A “conspiração” foi “revelada” por Pichardo em um artigo no jornal dominicano Listín Diario.

O primeiro estágio da conspiração seria iniciar uma campanha de falsas acusações na mídia contra os presidentes progressistas da região para minar a confiança do público. A pressão da mídia levaria ao segundo estágio: o início de processos judiciais para interromper o mandato dos governantes.

“Indivíduos ligados a instituições judiciais da região comprometidos com a conspiração levariam aos chamados ‘Golpes Suaves”, derrubados por julgamentos políticos precedidos por escândalos de corrupção, ou campanhas destinadas a exaltar comportamentos supostamente questionáveis ​​na vida interna dos líderes progressistas; incluindo, se necessário, familiares, amigos ou pessoas próximas", afirmou Pichardo.

Pichardo questiona ainda se as quedas dos presidentes de Honduras em 2009 e do Paraguai em 2012 teriam servido de laboratório para futuras ações do Plano de Atlanta em países de maior peso na América Latina.

"Manuel Zelaya e Fernando Lugo foram tubos de ensaio para alcançar os demais, os presidentes dos países com maior peso econômico da região, até atingir a 'joia da coroa', que é, sem discussão, Lula da Silva, o líder mais influente, provocando o efeito dominó que eles parecem procurar? Parece-me que o compromisso de desestabilizar o Brasil tem a ver com o peso de sua economia e sua influência na região e no mundo, não podemos esquecer que o gigante sul-americano faz parte dos BRICS”, diz Pichardo.

Segundo ele, Lula construiu uma liderança que influenciou a região e promoveu esquemas de integração regional na América Latina. “Mais do que um sentimento de pátria, é um Projeto de Independência que nos leva a uma agenda própria que nos distancia de ser o quintal dos Estados Unidos. Lula, portanto, é um alvo”, acrescenta.

Pichardo afirmou ainda que, ao final do 'encontro conspiratório' foi assinada a Declaração de Atlanta, uma carta de compromisso assinada pelos ex-presidentes que participaram da 1ª Cúpula da Missão Presidencial da América Latina (MPL) — um evento que nunca foi secreto. Na Declaração, os membros da MPL defendem laços estreitos entre a América Latina e os EUA com o objetivo de fortalecer o comércio, investimentos, troca de experiências e tecnologia em longo prazo. Entre os ex-presidentes membros do MPL estão políticos mais pró-mercado como o mexicano Vicente Fox e o chileno Ricardo Lagos, mas entre os convidados está o ex-presidente uruguaio e esquerdista José Mujica.

O objetivo da cúpula era "impulsionar uma nova era de relações internacionais entre os Estados Unidos e a América Latina", segundo comunicado divulgado à imprensa em 30 de novembro de 2016.

A opinião é compartilhada por outros membros da Copppal, como Francisco Cafiero, presidente do Centro Latino-Americano de Estudos Políticos e Econômicos da China (Clepec). “Enfrentamos a dicotomia de defender o Estado de bem estar social ou deixar avançar a agenda do capital financeiro internacional. O que se busca com o impedimento de Lula concorrer, com a perseguição a Cristina Kirchner, é fazer prevalecer o modelo neoliberal que extingue direitos, que foi derrotado nas urnas”, afirma.

Recente

No final de 2018, Pichardo afirmou que a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) foi “o maior êxito do Plano Atlanta” e representa “um triunfo das forças conservadoras alcançado, como já denunciado, através de uma aliança com a mídia e setores do judiciário”. Segundo ele, a eleição foi resultado de uma nova forma de fraude eleitoral.

“A eleição de Bolsonaro é um duro golpe para as forças progressistas, tanto para os que estão no governo quanto para aqueles que estão na oposição, pois acaba enfraquecendo a luta individualmente e como um todo”, disse.

Picardo ainda arriscou fazer previsões. Afirmou que a eleição de políticos conservadores no Brasil e no mundo não terá sucesso e a esquerda ganhará força. “Embora a direita tenha alcançado algum sucesso em nossa região, as forças de esquerda estão vivas, elas têm simpatia da população, elas têm força”.

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