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Imagem de um exoplaneta: vida fora da Terra pode ser muito diferente do que se imagina | Divulgação/NASA
Imagem de um exoplaneta: vida fora da Terra pode ser muito diferente do que se imagina| Foto: Divulgação/NASA

Quem disse que cientistas não gostam de especular? Em "Aliens: The World's Leading Scientists on the Search for Extraterrestrial Life" (Alienígenas: os principais cientistas do mundo na busca por vida extraterrestre, em tradução livre), uma antologia com edição e introdução de Jim Al-Khalili, eles fazem quase nada a não ser especular. O resultado é fascinante. Os autores do livro utilizam fatos disponíveis para se lançar, figurativamente, para o espaço, onde certos planetas e/ou suas luas podem ser hospedeiros de vida orgânica. Em outras palavras, a especulação em "Alienígenas" é do tipo mais responsável — a que é informada pela ciência. 

Al-Khalili é um físico teórico britânico nascido no Iraque, cujos trabalhos anteriores incluem "Quantum: A Guide for the Perplexed" (Quantum: um guia para os perplexos) e "The House of Wisdom: How Arabic Science Saved Ancient Knowledge and Gave Us the Renaissance" (A casa da sabedoria: como a ciência árabe salvou o conhecimento antigo e nos deu a Renascença). Enquanto acompanhava seu último livro ser publicado, ele juntou os membros do que chama de "time dos aliens". É um grupo de 20 cientistas, dos quais muitos são renomados em suas áreas (que incluem astrobiologia, astrofísica, bioquímica, cosmologia, neurociência, zoologia e mais). Al-Khalili observa: "você vai descobrir que cada um deles oferece uma perspectiva única do assunto". 

E é verdade, principalmente porque os autores de "Aliens" não podem (ainda) desenvolver mais do que chutes bem informados sobre a existência da vida fora da terra. Assim, eles diferem muito na abordagem do tema e até nas conclusões que chegam. E isso é, contra os nossos instintos, uma das características mais interessantes do livro.

Condições necessárias para a vida

O maior objetivo de "Alienígenas" não é argumentar a favor ou contra a ideia de que não estamos sozinhos no universo, mas examinar um lado frequentemente ignorado de um tema que há muito tempo serve como matéria de entretenimento popular barato e teorias da conspiração malucas. Isso significa discutir condições necessárias para vida, a possibilidade de existência dessas condições em diferentes planetas e como poderíamos saber disso. 

Ainda que possam existir bilhões de planetas, isso não significa que qualquer um pode ter vida — pelo menos da forma como conhecemos. Em "Lar doce lar: o que faz um planeta habitável", Chris McKay explica que as características consideradas necessárias para a existência de vida são água líquida, energia da luz solar ou de químicos, carbono e moléculas associadas. Não só isso, mas como Paul C.W. Davies, autor de “Uma urgência cósmica: o quão fácil é começar vida?”, disse, "não é só porque um planeta pode ser habitado que ele será habitado".

Inteligentes, porém mortos. Vivos, mas não inteligentes

Também é possível que tenha havido vida em determinado momento em um certo planeta antes que ela tenha desaparecido por conta de uma mudança atmosférica ou pelo impacto de um asteróide. Na nossa busca por aliens, podemos acabar encontrando-os mortos.  

Tenha em mente também que os aliens em questão - vivos ou mortos - podem não se qualificar como seres inteligentes. Mais de um autor da antologia tenta baixar as expectativas de que a vida extraterrestre seja mais do que microrganismos unicelulares como bactérias.

"Se existirem 'aliens', é mais provável que centenas de milhares deles caibam na cabeça de um alfinete", como diz Matthew Cobb.

E isso é "mais provável", de acordo com Cobb, na improbabilidade de que aliens existam: seu artigo se chama "Sozinhos no universo: a improbabilidade de civilizações alienígenas". 

Numa abordagem oposta está o texto de Nathalie Cabrol, "O que estamos procurando? Uma perspectiva da procura por extraterrestres". Para ela, que conduz o Centro Carl Sagan para Pesquisas de Vida no Universo, "a descoberta da abundância de exoplanetas [planetas que estão fora do Sistema Solar] revolucionou o nosso conceito de quantos mundos habitáveis poderiam existir em apenas uma pequena fração da nossa galáxia. A astronomia e a astrofísica estão ampliando o potencial para mundos habitáveis nas 100 bilhões de galáxias que se estimam existir no nosso universo. A ideia de que podemos estar sozinhos é contrária a todas as estatísticas". 

Formas inorgânicas

Se ao menos uma parte das vidas extraterrestres em potencial se qualificarem como inteligentes, as chances de contato aumentam, já que os próprios aliens podem já estar tentando contato também. Mas, como Martin Rees aponta, existe uma possibilidade que, se esses alienígenas existirem há mais tempo do que os humanos, eles já possam ter começado uma transição para formas inorgânicas de vida. Afinal, a vida inteligente, ao menos aqui na Terra, parece desejar ainda mais inteligência.

De acordo com Rees, "isso sugere que se nós encontrarmos algum ET, é mais provável que seja inorgânico: é improvável encontrar inteligência extraterrestre na breve brecha de tempo em que ainda está na forma orgânica". 

De maneira mais assustadora, a descoberta de algo na Terra pode fazer com que a vida extraterrestre seja mais provável, de acordo com Nick Lane em "Origens Elétricas em fontes hidrotermais em regiões abissais: como a vida começou na Terra" e Davies, cujo artigo já foi mencionado.

O santo graal esquivo em questão é frequentemente apelidado de "Vida 2" ou "vida estranha", porque acreditamos que toda vida que conhecemos na Terra descendeu de uma única fonte. Se todas as criaturas da Terra, com toda a diversidade que vemos, têm um ancestral em comum, é fácil ver que, por várias circunstâncias durante todo o período da evolução, nós e todos os outros seres vivos no planeta poderiam nunca ter existido.

Descobrir uma segunda fonte de vida na terra - nem que seja nada mais do que uma micobactéria — não seria só animadora, mas também impulsiona a possibilidade de que vida extraterrestre esteja vagando por um planeta habitável e parecido com a Terra em algum lugar do universo. 

Ciência acessível

Para assegurar que "Aliens" não alienasse (trocadilho proposital) entusiastas do tema que não têm inclinação científica, Al-Khalili solicitou contribuições sobre extraterrestres na cultura popular. Dallas Campbell (cujo capítulo fala sobre visões de OVNIs), Ian Stewart (que fala sobre ficção científica), Adam Rutherford (filmes) e Chris French (psicologia de possíveis abduzidos por aliens) produzem textos informativos e energéticos, repletos de argumentos afetivos. Os outros autores se contentaram em tornar a ciência acessível para o público leigo. 

Nem sempre funciona. Por exemplo, o texto de Andrea Sella, "Aleatoriedade versus complexidade: a química da vida", se mostra difícil mesmo para os leitores que se orgulham de entender materiais confusos.

Enquanto isso, Johnjoe McFadden faz um trabalho considerável ao explicar física quântica em "Pulo quântico: a mecânica quântica pode explicar o segredo da vida (alienígena)?", mas a aplicabilidade do nascimento de vida que se auto replica na Terra (e, consequentemente, em qualquer lugar) permanece majoritariamente teórica. O artigo de Anil Seth tem uma conexão ainda mais tênue com o conteúdo do livro, mas tem um título inegavelmente legal: "Aliens na Terra: o que a mente de polvos podem nos dizer sobre a consciência alienígena". 

Futuro pós-humano

No outro lado do espectro, temos Giovanna Tinetti (Boa atmosfera: identificando sinais de vida em planetas distantes) e Saara Seager (Eles estão lá? Tecnologia, equação de Drake e a busca por vida em outros planetas). As duas autoras fazem um trabalho admirável numa tarefa impossível: explicar como a detecção de vida alienígena provavelmente não seria resultado de viagens interestelares ou mesmo transmissão de rádio, mas feita a partir do uso de imagens de telescópios e satélites para estudar mudanças na composição atmosférica de exoplanetas (Tinetti) ou identificar os gases que fazem a bioassinatura desses planetas (Seager). 

Talvez o aspecto mais espantoso do livro (e isso é significativo, considerando que o livro inteiro é sobre vida extraterrestre) é pensar em quem do nosso mundo faria contato com alienígenas, caso eles existam. Lembre o argumento de Rees sobre a chance de os aliens terem evoluído para algo inorgânico no momento que os encontrarmos? Bom, é uma via de duas mãos. O capítulo de Rees se chama "Alienígenas e nós: os pós-humanos poderiam se espalhar pela galáxia?".

Tanto Ress como Seth Shostak (O que vem a seguir? O futuro da busca por inteligência extraterrestre) argumentam que até o momento em que terráqueos e alienígenas se acharem, sem falar de se encontrarem, "nós" — ou alguns de nós — já não seremos mais humanos. Não só isso, mas a nossa evolução artificial em ciborgues ou em algo baseado em silicone será precisamente o que permitirá contato físico, ao contrário de apenas comunicação eletrônica. "Viagens interestelares só serão possíveis realisticamente para pós-humanos", garante Rees. 

Inteligência artificial

Parece forçado, mas se Rees e Shostak estiverem corretos, essa perspectiva tem pelo menos uma implicação séria agora e aqui. Na verdade, é tanto uma implicação séria como uma má notícia. Aqueles de vocês que acham conforto na crença que, mesmo que você falhe em conseguir juntar uma assembleia entre humanos e alienígenas, seus descendentes conseguiriam, pensem de novo.

Nem seus netos ou bisnetos, os terráqueos que eventualmente se encontrarem com alienígenas são provavelmente os substitutos dos seres humanos.

Shostak divaga que "é ao menos possível que uma vez que a GAI [General Artificial Intelligence - Inteligência Artificial Geral] estabeleça sua presença na Terra, ela deve dominar tantos recursos - materiais, energéticos e geográficos - do planeta que o Homo sapiens se tornará tão marginalizado quanto os gorilas". 

Para mim e você, terráqueos orientados por inteligência artificial seriam tão alienígenas quanto qualquer habitante de planetas distantes com os quais eles conseguiriam contato.

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