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153 dias depois do início do ano, o brasileiro finalmente vai começar a trabalhar para si
153 dias depois do início do ano, o brasileiro finalmente vai começar a trabalhar para si| Foto: Gilson_Abreu/ANPr/Divulgação

O Dia da Liberdade dos Impostos celebra o data em que o brasileiro, enfim, começa a trabalhar para si. Até hoje, tudo o que o brasileiro produziu foi usado para custear o Estado brasileiro. Em 2018, o brasileiro só começou a trabalhar para si depois de 153 dias, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação. Apesar de muito trabalho para pagar tributos, ainda sobram reclamações sobre a má qualidade das prestações de serviços.

Uma frase costumeiramente atribuída ao escritor e diplomata Roberto Campos diz que “o Brasil tem carga tributária escandinava e oferece serviços públicos africanos”. A despeito de haver muitos países com carga tributária superior à brasileira, se compararmos com outras nações emergentes, países latino-americanos ou exportadores de commodities, apenas Cuba, com 41,7% de impostos sobre o PIB, supera a carga tributária do Brasil, de 32,4%, segundo dados de 2016 da OCDE.

Pela estimativa do Tesouro Nacional, em 2018 a carga tributária nacional atingiu 33,58%, superando um terço de tudo que é produzido no país. Um dos líderes da Revolução Americana, Benjamin Franklin, afirmava que seria um absurdo um governo cobrar mais do que um décimo da renda da população. A maioria dos brasileiros discorda. Levantamento do Instituto Data Popular mostrou que, em 2014, 81% deles preferem ter serviços públicos melhores a pagar menos impostos.

A relação entre a carga tributária e o PIB vem aumentando gradativamente desde o final da década de 1940, quando o percentual era inferior a 15%. Com a escalada de despesas por parte do Estado, foram criados mais tributos e aumentou-se alíquotas dos impostos existentes para que eles custeassem o aumento dos gastos. O resultado tem atrapalhado a iniciativa privada e, consequentemente, gerado um crescimento econômico baixo. A Gazeta do Povo avalia que as últimas 4 décadas foram perdidas no Brasil em termos de desenvolvimento econômico.

Brasileiros querem Estado maior

Na literatura acadêmica, a métrica mais utilizada para avaliar o tamanho do Estado é o nível das despesas do governo, não a quantidade da carga tributária paga pelos cidadãos. Isso porque a tributação é o instrumento utilizado para financiar as atividades da administração pública. Nesse sentido, o Estado brasileiro consome muitos impostos porque se propõe a fornecer tudo quanto é serviço na forma de políticas públicas em diversas áreas. E, ao que tudo indica, esse é o desejo da maioria da população.

Pesquisa de 2018 realizada pelo Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação mostrou que, na cabeça do brasileiro, a economia deve ser regulada mais pelo Estado do que pelo mercado. Os entrevistados disseram ainda que as principais empresas devem pertencer ao Estado, considerado o principal agente de redução de desigualdades e de provimento de serviços básicos.

O levantamento pediu para os entrevistados avaliarem, de 0 a 10, o grau de presença do Estado que considerasse ideal. Dessa forma, 42,7% dos entrevistados concordaram totalmente com a ideia segundo a qual "o Estado, mais do que o setor privado, deve ser o principal responsável por prover educação". Número semelhante foi obtido na mesma pergunta sobre saúde: 42,2%. Um terço dos brasileiros está totalmente de acordo quando se diz que o Estado, mais do que o setor privado, deve ser o principal responsável pelo bem-estar dos cidadãos, além de ter de ser o principal responsável por reduzir a desigualdade de renda. Por fim, quase 40% acreditam totalmente que o Estado deve ser o principal responsável por garantir as aposentadorias.

Como popularizado pelo Nobel de Economia Milton Friedman, “não existe almoço grátis”. Para o Estado prestar algum serviço, é preciso que alguém pague por ele. Se, por um lado, a maioria dos brasileiros tem essa visão intervencionista do papel do Estado, é porque uma parcela considerável não sabe que ajuda a pagar os serviços que exige da administração pública.

Um estudo de 2014 realizado pela Fecomercio-RJ/Ipsos apontou que 45% dos brasileiros não sabem que pagam impostos ao ir às compras. Assim, a maioria percebe a incidência de tributos municipais, como o IPTU, mas não os impostos diluídos nas mercadorias. O cenário piorou em relação à pesquisa realizada pelas mesmas entidades em 2015: um em cada quatro brasileiros não sabe que paga imposto.

Mesmo entre os que sabem que pagam impostos, a situação não é das melhores. Uma pesquisa de 2019 realizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas e pelo Serviço de Proteção ao Crédito mostrou que 74% dos consumidores não sabem quanto pagam de imposto nas compras.

Dessa forma, há um contingente considerável na população brasileira que defende mais serviços estatais sem entender que pagará mais por isso ou ainda sem saber quanto a tributação pesa em seu poder de compra. Quem tem renda inferior a dois salários mínimos, segundo o IPEA, tem mais da metade de seu poder de compra comprometido com impostos: 53,9%.

Estado brasileiro: caro e não ajuda os mais pobres

Apesar de os 10% mais pobres pagarem proporcionalmente 44,5% mais impostos do que os 10% mais ricos, grande parte das políticas sociais financiadas com esse dinheiro não beneficia os brasileiros de menor renda. Um levantamento do Banco Mundial estimou que o Brasil gasta apenas 12,1% do PIB com os 40% mais pobres. Ou seja, há um benefício desproporcional aos mais ricos.

Portanto, há diversas ações patrocinadas pelo Estado brasileiro que, embora vendidas por burocratas como tendo finalidade “social”, resultam em aumento da concentração de renda.

Reforma tributária que tramita no Congresso não diminui impostos

Apesar do sonho de se pagar menos impostos ou de uma descentralização dos recursos da União para estados e municípios, como proposto pelo Ministro da Economia Paulo Guedes, uma mudança neste quadro é improvável a curto prazo.

Apenas entre os governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, cinco propostas de reforma tributária fracassaram no Congresso. Dilma Rousseff e Michel Temer também tentaram reorganizar o sistema tributário nacional, sem sucesso.

Articulada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, tramita no Congresso a PEC 45/2019, que propõe a reforma tributária defendida pelo economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal. A proposta substitui cinco tributos atuais por um único: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). É uma proposta de simplificação fiscal, não de diminuição da carga tributária.

O mestre em economia pela FEA/USP Guilherme Tinoco afirma que não há espaço para redução da carga tributária. “Isso só faria aumentar o déficit. Temos que controlar as despesas primeiro”, afirma. “Não vejo como descentralizar mais recursos para estados e municípios, uma vez que o governo federal tem déficits primários elevados e a perspectiva é de estar no negativo por pelo menos uns quatro anos mais”, complementa.

A meta do governo para 2019 é gastar cerca de R$ 100 bilhões a menos do que arrecada. O atual secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, admite que deve haver déficit pelo menos até 2022.

A redução da carga tributária no Brasil passa, portanto, por cortes de despesas por parte da administração pública. Para isso, contudo, é preciso que essa cultura de dependência do governo incutido na população — dos mais humildes aos mais ricos — seja superada. A atuação do Estado precisa deixar de ser regra para ser exceção.

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