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A partir de 19 de abril, Raúl Castro – irmão mais novo de Fidel, que morreu em 2016 – dará lugar para Miguel Díaz-Canel como presidente cubano | YAMIL LAGEAFP
A partir de 19 de abril, Raúl Castro – irmão mais novo de Fidel, que morreu em 2016 – dará lugar para Miguel Díaz-Canel como presidente cubano| Foto: YAMIL LAGEAFP

A geração que derrubou o ditador Fulgêncio Batista, em 1959, e que implantou a ditadura comunista no país caribenho, está deixando o poder. A partir de 19 de abril, Raúl Castro – irmão mais novo de Fidel, que morreu em 2016 – dará lugar para Miguel Díaz-Canel como presidente cubano. O futuro líder tem 57 anos, 30 a menos do que Castro. Mas, apesar da “juventude” de Díaz-Canel, não se pode esperar mudanças radicais

É algo que tem uma grande carga simbólica. “A saída de Raúl Castro simboliza a primeira vez em seis décadas que um Castro não estará no comando em Cuba”, enfatiza o consultor Antonio Quintanilla, da consultoria Prospectiva. 

O que não se deve esperar, segundo o professor Hélio Doyle, do Núcleo de Estudos sobre Cuba da Universidade de Brasília (UnB) é uma mudança abrupta no país caribenho, a exemplo do que ocorreu na União Soviética, no final dos anos 80, com a ascensão de Mikhail Gorbachov ao poder e que resultou no colapso do regime comunista. “O que vier de mudança política e econômica será muito lenta e gradual”. 

Um dos fatores que pesam contra mudanças mais abruptas é que a velha guarda não vai sair totalmente de cena. Apesar de não ser chefe de Estado ou de governo, Raúl Castro continuará sendo a figura política mais importante do país, com o cargo de primeiro secretário do Partido Comunista de Cuba, ressalta Quintanilla. 

Outros companheiros dos irmãos Castro na luta armada também ocupam posição de destaque em Cuba. É o caso de José Ramón Machado Ventura, de 87 anos, que é o vice-líder do partido. “Será uma transição extremamente controlada”, diz o consultor da Prospectiva 

Um agravante que também dificulta para que não haja fortes mudanças é o peso do Exército cubano na economia. Uma estimativa feita pelos professores Javier Corrales, do Amherst College, e James Loxton, da Universidade de Sydney, para o jornal “The New York Times” indica que empresas ligadas ao aparato militar tem controle de 60% do dinheiro que entra no país. 

O sistema econômico é extremamente fechado. As exportações e importações correspondem a 31,6% do PIB - e a presença privada na economia é pequena e fraca. O PIB do país era estimado pelo Banco Mundial em US$ 87,1 bilhões para 2015, último dado disponível.

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Quem é Miguel Díaz-Canel, o primeiro na linha 

Miguel Díaz-Canel é o primeiro na linha sucessória de Raúl Castro desde 2013, quando assumiu o cargo de primeiro vice-presidente do Conselho de Estado e do Conselho de Ministros. Antes, entre 2009 e 2012, foi ministro da Educação Superior. Desde 2003 integra o Politburo do Partido Comunista de Cuba. “É um quadro típico do partido, que foi ascendendo aos poucos”, diz Doyle. 

Segundo Quintanilla, alguns o caracterizam como um comunista firme, porém ele não seria um ideólogo. Em algumas ocasiões se manifestou favorável à abertura da internet e à liberdade de imprensa na ilha. Nas eleições realizadas em fevereiro, para a Assembleia Nacional do Poder Popular, ele disse que é necessário que a administração cubana tenha uma maior interação com a população e que é necessário ouvir o povo, identificar profundamente os problemas existentes e inspirar o debate sobre esses problemas. 

Mas, vídeos recentes – dele conversando com integrantes do partido – mostram um lado mais conservador, mais linha dura. Ele declarou recentemente que o presidente cubano deve defender a Revolução e que se deve manter o controle sobre liberdades políticas. 

O certo é que ele tem dado impressões diversas. “Não se sabe como governará até que tome o poder”, ressalta Quintanilla. 

O rumo que Díaz-Canel tomar será determinante no relacionamento com os Estados Unidos. “Nada deve mudar a princípio”, diz o professor da UnB, referindo-se ao arrefecimento na relação entre os dois países promovida pela administração de Donald Trump, após a abertura promovida por Obama – que resultou na criação de embaixadas nos dois países – e que contou com o envolvimento do papa Francisco. 

O poderoso lobby cubano-americano, que tem algumas figuras relevantes como os senadores Ted Cruz e Marco Rubio, que foram pré-candidatos republicanos à sucessão de Obama, está fazendo pressão para que Trump ignore quem seja o sucessor de Raúl Castro e mantenha o arrefecimento nas relações com Cuba. 

Quintanilla, da Prospectiva, acredita que o relacionamento entre Cuba e Estados Unidos será uma função de como um governo Díaz-Canel se comportar, da implementação de mudanças de âmbito político e econômico em Cuba e das ações que o governo Trump tomar. 

O legado de Raul Castro: um pouco de liberdade econômica e menos liberdade política 

Apesar das concessões, principalmente na área econômica, à população cubana, o país é “menos democrático” do que era quando Raúl Castro chegou efetivamente ao poder em 2008. O Índice da Democracia, calculado pela Economist Intelligence Unit (EIU), aponta que Cuba é um regime autoritário. Na escala que vai de zero (autoritário) a dez (democrático), o país caribenho tinha nota 3,31 em 2017, 6% a menos do que em 2008. 

Boa parte dessa retração aconteceu entre 2016 e 2017. Os fatores que contribuíram para a queda no índice de abertura política são o processo eleitoral e o “pluralismo”, o funcionamento do governo e as liberdades civis. 

Um dos exemplos da falta de pluralismo no país foi a expulsão, em abril do ano passado, da estudante Karla María Pérez González, do curso de Jornalismo da Universidad Central de Las Villas (UCLV). Ela foi acusada por seus colegas de não ser alinhada à Revolução Cubana e de escrever artigos críticos ao governo. 

Em se tratando de uma ditadura socialista, o país caribenho é o mais autoritário das Américas e ocupa a 131° posição em abertura política entre 167 países analisados. O pior é a Coreia do Norte. 

Outro centro de pesquisas a fazer uma análise da situação de Cuba é o conservador Heritage Foundation, dos Estados Unidos. Ele considera que houve alguns avanços em Cuba entre 2008 e 2018, mas, mesmo assim, aponta a economia cubana como fortemente reprimida. É a terceira pior do mundo, à frente apenas da Venezuela e da Coreia do Norte. 

A entidade considera que “embora o governo quase falido tenha facilitado as regras sobre o emprego privado, em um esforço para remodelar a economia e melhorar a eficiência, o desenvolvimento de um setor privado criador de empregos é improvável. Grande parte da força de trabalho desempenha funções de baixa produtividade no setor público inchado. Todos os tribunais estão sujeitos a interferência política e a propriedade privada é estritamente regulada. A burocracia excessiva e a falta de transparência regulatória continuam a limitar o comércio e o investimento.” 

O Índice de Liberdade Econômica avançou de 27,5%, em 2008 para 31,9%, em 2018, com uma queda de dois pontos percentuais no último ano, motivada pela retração relacionada aos direitos de propriedade, integridade do governo e aumento da carga tributária. 

Entre 2008 e 2015 - último dado disponível -, o PIB cubano cresceu a uma média de 2,7% ao ano, segundo o Banco Mundial. Só para comparar, a economia brasileira evoluiu ao ritmo de 2,2% ao ano nesse período e a mundial, 2,3% 

O Heritage Foundation aponta que “sem fornecimentos significativos de petróleo subsidiado da Venezuela quase falida, a economia disfuncional de Cuba é ainda mais dependente dos fluxos de entrada das remessas de emigrantes e da moeda estrangeira gerada pelo turismo. Os trabalhadores não ganham salários dignos, o setor agrícola está faminto por investimentos e o sistema bancário é primitivo”.

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