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A “irresponsabilidade” dos jovens talvez seja sintoma não só da rebeldia, mas também da desconfiança em relação às medidas do governo.
A “irresponsabilidade” dos jovens talvez seja sintoma não só da rebeldia, mas também da desconfiança em relação às medidas do governo.| Foto: Pixabay

Na véspera do relaxamento da quarentena em Paris, que parecia a libertação da cidade, os jovens organizaram uma festa de rua perto do meu apartamento. Eles nunca foram obcecados em sua observância das regras de distanciamento social. Na noite seguinte, a polícia teve de intervir para dissipar uma aglomeração de jovens às margens do Canal Saint-Martin, onde eles se reuniram para beber, conversar e infringir as regras.

A princípio, reagi a essa irresponsabilidade como o idoso típico, mas daí me lembrei da minha própria juventude. Eu achava hilário dirigir depois de uma ou duas garrafas de champanhe e, durante anos, desprezei o perigo, sem pensar nos outros.

Os jovens, desde sempre desinclinados a respeitar a autoridade dos mais velhos (e supostamente dos melhores), podiam facilmente apontar os erros cometidos por esses velhos. A população, por exemplo, primeiro foi informada de que o uso de máscaras não era necessário. No final se revelou que a recomendação foi feita não porque se acreditava nela, e sim porque não havia máscaras o suficiente. Hoje o uso de máscaras é obrigatório no transporte público. Como disse Charles Dickens em David Copperfield, as crianças percebem facilmente a injustiça; adolescentes e jovens, já suscetíveis à rebeldia, percebem as hipocrisias e as contradições das autoridades. Por quê, então, eles deveriam obedecer àqueles que mentiram (ou a qualquer um) e que controlam o leme do Estado como marinheiros bêbados?

Além do mais, os jovens sabem que, para eles, o risco de contrair a Covid-19 é praticamente nulo — muito menos do que, digamos, andar de moto. Sim, se eles pegarem a doença e se forem assintomáticos ou se tiverem sintomas fracos, podem transmitir a doença a outras pessoas, sobretudo aquelas vulneráveis e com doenças graves. Quanto a isso, eles podem dizer que tomaram o cuidado e se mantiveram distantes dessas pessoas.

Há outro lado da moeda depois deste primeiro passo em direção ao desconfinamento:  há muito mais pedestres (e motoristas) usando máscaras, muitas feitas em casa, do que antes, quando o tempo que se passar ao ar livre era limitado. Será que isso significa que a responsabilidade civil aumenta quanto é voluntária, e não quando imposta? Ou será que as pessoas que agora estão nas ruas são diferentes?

Uma contradição aparente não passou despercebida pelos jovens pensativos, ainda que rebeldes: as lojas agora estão abertas, mas não os parques e os jardins públicos. Será que as lojas são de fato mais perigosas, do ponto de vista do contágio, do que os parques? Os franceses tendem a ver o lucro e o liberalismo econômico como a origem de todo o mal (o que não os impede de serem avaros). Abrir as lojas e deixar os parques fechados só os deixarão ainda mais desconfiados.

Assim que as pessoas ganharam um pouco de liberdade, o sindicato dos ferroviários, controlado pelos comunistas, entraram em greve. Sim, a vida definitivamente está voltar ao normal em Paris. E, quando penso na minha juventude, acho que, se fosse jovem hoje em dia, talvez eu participasse das festas às margens do canal.

© 2020 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês
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