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Elon Musk
Elon Musk, o homem mais rico do mundo e o maior acionista do Twitter| Foto: Alexander Becher/EFE/EPA

Foi-se o tempo em que ser considerado progressista era sinônimo de ser radicalmente contra qualquer tipo de censura. Se, historicamente, parte da esquerda foi por longas décadas associada à luta contra o controle do discurso praticado por regimes autoritários, hoje, amplas fileiras dos que, nos Estados Unidos, se denominam “liberals” estão cada vez mais ávidos por controle.

Vale lembrar que o termo “liberal”, em inglês, não necessariamente denota abertura a livre mercado – enquanto há, no Brasil, autoproclamados “liberais” que enveredam pelo mesmo caminho quando se trata de expressão. Um sintoma recente desta guinada foi a reação de influenciadores e intelectuais progressistas ao anúncio de que o bilionário sul-africano Elon Musk, o homem mais rico do mundo e um ferrenho defensor da liberdade de expressão, ofereceu comprar o Twitter por cerca de US$ 40 bilhões.

Em artigo para o City Journal, Corbin K. Barthold explicou como o anúncio de Elon Musk acabou por arrancar de vez a máscara dos progressistas que parecem não se incomodar quando a liberdade é ameaçada pelo Estado ou por oligarcas da tecnologia – exceto quando este defende que as pessoas deveriam ser “capazes de falar livremente dentro dos limites da lei”.

“Investi no Twitter porque acredito em seu potencial para ser a plataforma para a liberdade de expressão em todo o mundo, e acredito que a liberdade de expressão é um imperativo social para uma democracia funcional”, escreveu Musk, em carta destinada ao presidente do Conselho de Administração do Twitter. “No entanto, desde que fiz meu investimento, percebo que a empresa não prosperará nem atenderá a esse imperativo social em seu atual formato. O Twitter precisa ser transformado em uma empresa privada”.

É preciso ressaltar que a jogada de Musk não é, em si, uma garantia da manutenção da liberdade. Nas primeiras entrevistas concedidas pelo magnata depois de se tornar um dos principais acionistas da rede fundada por Jack Dorsey, o bilionário afirmou, por exemplo, que sua “prioridade máxima” seria eliminar mecanismos de spam, que são uma forma de comunicação legal. Além disso, Barthold lembra ainda que Musk não explicou completamente como se dará o financiamento da compra e já desfez negócios de grande porte antes.

Ainda assim, as primeiras horas que se sucederam ao anúncio da oferta, na última quinta-feira (14), renderam boas revelações: mal a notícia da negociação caiu na internet, e o jornalista Jeff Jarvis – evidentemente verificado pela rede - já apelou para a “cartada máxima” das discussões virtuais: a comparação com o nazismo. "Hoje o Twitter parece a última noite em uma boate de Berlim no crepúsculo (da República) de Weimar na Alemanha".

O que, exatamente, um bilionário libertário ameaçar comprar uma rede social para permitir que seus usuários se expressem dentro da lei – que já prevê as devidas punições para a incitação à violência - tem a ver com a ascensão de um ditador sanguinário permanece uma incógnita. Inclusive porque, como boa parte da “história” progressista tende a ignorar, a censura a panfletos nazistas em nada impediu sua chegada ao poder na Alemanha.

Na mesma linha, o historiador Max Boot expressou preocupação. “Estou assustado com o impacto na sociedade e na política se Elon Must adquirir o Twitter”, publicou. “Para que a democracia sobreviva, precisamos de mais moderação de conteúdo, não menos”. Faltou, é claro, explicar que raios de democracia é essa, quem pode fazer parte dela e, sobretudo, quem cuidará da tal “moderação de conteúdo”.

O próprio fundador do Intercept, o jornalista Glenn Greenwald, um notório esquerdista, ironizou o frenesi da esquerda progressista em sua newsletter: “Os progressistas americanos estão obcecados por encontrar maneiras de silenciar e censurar seus adversários. (...) Durante anos, sua tática de censura preferida foi expandir e distorcer o conceito de ‘discurso de ódio’ para significar ‘pontos de vista que nos deixam desconfortáveis’ e, em seguida, exigir que tais pontos de vista ‘odiosos’ fossem proibidos com base nisso”.

“Ao lado do analfabetismo funcional, a estrutura do ‘discurso de ódio’ para justificar a censura agora é insuficiente porque os progressistas estão ansiosos para silenciar uma gama muito mais ampla de vozes do que aquelas que podem acusar de forma crível de serem odiosas. É por isso que a mais nova e mais popular estrutura de censura é alegar que seus alvos são culpados de espalhar ‘desinformação’. Esses termos, por natureza, não têm significado claro ou conciso”, explica o jornalista, afirmando que “poucos eventos revelaram essa estrutura distorcida de forma tão vívida” quando o anúncio de Musk.

“O fato de Musk ter repetidamente denunciado o regime de censura cada vez mais pesado e claramente ideológico do Twitter não significa que ele seja sincero em sua intenção de restaurar a liberdade de expressão na plataforma, mas a mera possibilidade de que ele pretenda fazê-lo levou os progressistas defensores da censura em espasmos de pânico e histeria”, explica Greenwald, em consonância com vozes libertárias e conservadores que comemoraram a novidade.

O desespero, afinal, tem sua graça: a esquerda que migrou das causas sociais para um affair deliberado com bilionários identitários subitamente voltou a se preocupar com a concentração do poder. E tudo por conta de um espaço que é frequentemente descrito como a “praça pública” da Era Digital. Para a elite, ao que parece, não fica bem que ela seja frequentada, dominada e cultivada por gente... comum.

Como pontua o jornalista conservador Auron MacIntyre, “se você acha que a política está acima da cultura, observe como várias entidades corporativas se coordenam com empresas de investimento, agências governamentais, governantes estrangeiros e meios de comunicação para impedir que uma peça do aparato de produção cultural caia nas mãos erradas”.

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