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O coronavírus revelará que temos muito em comum com aqueles que sofreram com outras pandemias antes de nós.| Foto: Cristian Hernandez / AFP

Temos oficialmente uma pandemia de um vírus novo. O presidente declarou emergência nacional em reação à Covid-19. O povo norte-americano — nós, as massas — diminuímos o ritmo ao essencial. Estamos em casa e não vamos mais à escola, trabalho, universidade e a conferências. Não vamos nem mais às celebrações religiosas.

A causa da Covid-19 é o SARS-CoV-2, popularmente conhecido como coronavírus. Apesar de ele ter se originado na China, ele se espalhou pela Itália e Coreia do Sul, duas sociedades livres, antes de chegar aos Estados Unidos. Assim, temos o benefício dos bons dados e de vermos como sociedades livres reagiram ao vírus. Estamos mais bem preparados.

Ainda assim, é impossível dizer com precisão quantas pessoas o vírus infectará e matará. Previsões são difíceis. Mas nós nos conhecemos um pouco, então podemos ousar dizer o que esse momento incomum revela a nosso respeito.

Uma coisa é certa: isso também passará. Quando passar, prevejo que teremos aprendido três coisas sobre nós meses. É quase certeza. Uma delas é motivo para otimismo, outra para pessimismo e a terceira não é uma coisa nem outra.

A sociedade civil ainda funciona

Primeiro, vamos descobrir que a sociedade civil nos Estados Unidos ainda funciona. Quando os especialistas em saúde pública confirmaram que a ameaça era série e iminente, não precisamos de um líder autoritário ou de um governo central para nos obrigar a agir. Milhares de associações e organizações, desde sindicatos e ligas esportivas até escolas e universidades, organizações patronais e de caridade, igrejas e outros grupos religiosos, a iniciativa privada e milhões de famílias voluntariamente optaram por mudar os planos e atividades a fim de reduzir a disseminação da doença.

Apesar de alguns casos de compras desenfreadas (boa sorte com o papel-higiênico e lenços umedecidos), o povo norte-americano tem agido com responsabilidade. A vida segue em frente, mas não com aglomerações. E o mais importante, as pessoas que têm autoridade sobre vários grupos, associações e instituições dentro da nossa sociedade levaram a sério a responsabilidade de tomar decisões difíceis para o bem dos membros e vizinhos.

Isso não quer dizer que as previsões dessas pessoas todas se cumprirão. Talvez descubramos que poderíamos ter feito menos. Mas no fim disso tudo veremos que os presidentes de associações profissionais e reitores, os diretos das escolas e os pais, e outras autoridades privadas e locais agiram com base nas poucas informações, motivados em proteger a saúde e o bem-estar das pessoas afetadas por essas decisões.

Os norte-americanos estão acostumados a administrar as próprias famílias, comunidades e associações, e geralmente agem com sensatez. Respeitamos o conhecimento e cedemos às opiniões embasadas. Às vezes exageramos e, quando as pessoas agem em manada, nós as seguimos sem pensar. Mas isso também mostra que confiamos uns nos outros e que percebemos o valor da sabedoria e prudência nos outros.

Assim, minha primeira previsão é a de que a nossa reação à Covid-19 revelará que o pragmatismo norte-americanos está em boa forma. (Nada mau para um para um país de 243 anos). Esse é o lado bom.

O governo não pode proteger as crianças do colapso familiar

Em segundo lugar, aprenderemos (mais uma vez) que famílias intactas são importantes. Com as escolas fechadas e os pais reassumindo um papel maior na educação das crianças, estamos prestes a ver claramente os limites da educação governamental. As escolas estatais não podem compensar a perda que as crianças sofrem quando a família se rompe.

Uma criança que está sendo educada num lar com os pais presentes tem mais chance de aprender neste momento do que uma criança num lar sem um dos pais. Além disso, muitas crianças que vivem em lares desfeitos dependem das escolas públicas para comer, e muitas mães e pais solteiros dependem dessas escolas para deixarem seus filhos durante o dia a fim de que possam ganhar a vida. Essas dependências multiplicarão os desafios das famílias colapsas neste período de dificuldade.

Há algum tempo sabemos que crianças em famílias intactas se saem melhores do que crianças criadas em outras estruturas familiares no que diz respeito ao desempenho estudantil (e outros parâmetros). Os motivos são bem óbvios. As pessoas naturalmente se preocupam com seus filhos e, em médio, se preocupam mais com eles do que com os filhos dos outros. Pai e mãe também são capazes de dividir o peso da criação, enquanto mães e pais solteiros têm de suportá-lo sozinhos. Homens e mulheres têm talentos diferentes no que diz respeito à criação e educação dos filhos, por isso as crianças aprendem melhor com a mãe e o pai presentes. E famílias intactas têm mais recursos, em média, e menos problemas, além de passarem por menos rupturas e transições do que famílias divorciadas.

Pense que hoje quatro em cada dez crianças norte-americanos nascem fora do casamento. Prevejo que essas crianças sofrerão mais com essa epidemia — talvez não em termos de saúde, e sim em termos de perdas que se manifestarão como desigualdades no longo prazo. Esse é o lado ruim.

Tecnocratas x humanistas e as falsas dicotomias

Agora o lado nem bom nem ruim. Ao longo dos últimos anos, temos visto um debate cada vez maior entre críticos e defensores de algo chamado “liberalismo”. Ainda que o debate seja multifacetado, uma das discordâncias está centrada na revolução tecnológica e científica da modernidade. De um lado estão aqueles que veem as descobertas e inovações como bênçãos. De outro, aqueles que acham que o advento da ciência empírica e da inovação tecnológica trouxe consigo custos sociais pelos quais ele não é completamente responsabilizado, sobretudo no que diz respeito ao colapso das famílias e das comunidades.

É possível se deparar com versões mais e menos inteligentes desses argumentos. Algumas são extremadas. Alguns céticos sugerem que a ciência empírica vai contra a natureza humana. Eles desprezam o valor da inovação e industrialização. Há quem os chame de “humanistas”. Por outro lado, os que acreditam mesmo na ciência parecem incapazes de encontrar qualquer coisa na natureza humana que não possa ser empiricamente verificada. Eles desprezam a mente e a alma. Há quem os chame de “tecnocratas”.

Prevejo que os humanistas céticos e os tecnocratas pragmáticos terão muito a dizer sobre este momento histórico. E prevejo que eles discordarão até o fim.

Quem se pode culpar pela pandemia? E quem tem mais potencial de mitigar as perdas? Sem uma compreensão rigorosa e científica do vírus e do comportamento humano, estaríamos à mercê do novo coronavírus assim como as pessoas estiveram à mercê das pandemias do passado. Depois que ele deixou a China e invadiu o mundo livre, as informações sobre o vírus e seus efeitos começaram a ser disseminadas mais rápidas do que o vírus em si. E os profissionais e especialistas em saúde sabem como interpretar dados. Ponto para os tecnocratas.

Por outro lado, o vírus se espalha rápido pelo mundo justamente porque nosso mundo está todo conectado pela indústria, comércio e tecnologia. E a ciência não impediu a estupidez humana que deu origem a essa coisa. E agora há pessoas morrendo. E mais morrerão. A ciência não pode transformar as pessoas ou o mundo. Não criamos a natureza; não podemos recriá-la. O melhor que podemos fazer é dominá-la como usuários da boa terra que herdamos e que deixaremos para trás, como há muito ensinam as tradições cristã e hebraica. Do pó ao pó. Ponto para os humanistas.

Se ficar provado que essa coisa veio de um laboratório chinês, como alguns especulam, os humanistas céticos se declararão vitoriosos. Mas a maioria das pessoas não se importará com isso. Elas perceberão, corretamente, a falsa dicotomia. Somos um povo ativo, criativo e produtivo que ama ter novas ideias. Também somos um povo que ama a beleza e acredita em várias causas para a felicidade, que admira a virtude e o amor ao próximo. Absorvemos o bem quando possível e o mal a gente tolera.

Nossas dúvidas criativas e nossa responsabilidade social são dois lados da natureza humana. Mas nossas inovações e nossa capacidade administrativa são aspectos do nosso domínio sobre o mundo, o cargo que ocupamos como seres criados com a capacidade fenomenal de preservar o que é bom por natureza e criar novos bens por meio do trabalho. Erramos quando abdicamos desse cargo, seja usando inovações tecnológicas para prejudicar a natureza ou minar as liberdades civis e instituições que tornam a criatividade humana possível. Esse momento desafiador revelará que estamos sendo bem-sucedidos em certos aspectos e fracassando em outros.

Somos seres humanos capazes de produzir bens e causar problemas graves. Geralmente fazemos as duas coisas ao mesmo tempo, como estamos fazendo agora. Em resumo, o coronavírus revelará que temos muito em comum com aqueles que sofreram com outras pandemias antes de nós.

Adam J. MacLeod é professor de direito na Faulkner University.

© 2020 The Public Discourse. Publicado com permissão. Original em inglês
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