• Carregando...
Grupos pró-aborto protestando em Miami, Flórida, na semana passada
Grupos pró-aborto protestando em Miami, Flórida, na semana passada| Foto: EFE/EPA/CRISTOBAL HERRERA

O fim de semana passado foi feio nos Estados Unidos. Protestos eclodiram do lado de fora das igrejas católicas quando hordas pró-aborto invadiram seus arredores, irritadas com o rascunho vazado da decisão que derrubaria Roe vs Wade. As missas dominicais foram abafadas por slogans, enquanto aqueles que não conseguiam entrar tagarelavam com ainda mais extremismo. “Deus matou seu filho, por que não posso matar o meu?”, gritou uma manifestante do lado de fora de uma igreja em Nova York, como relatou Kathryn Jean Lopez, da Natioal Review. Outro acusou os católicos de “escravização de mulheres por dois mil anos”. Vitrais foram quebrados, paredes foram pichadas – “F*** a Igreja” era a frase mais comum – e propriedades foram destruídas. Resumindo, um centro pró-vida com conexões religiosas em Madison, Wisconsin, teve rabiscada em sua parede a mensagem sinistra: “Se abortos não são seguros, então você também não está seguro”.

Isso não foi totalmente espontâneo. Na semana passada, grupos pró-aborto têm direcionado manifestantes para igrejas católicas em todo o país. Eles foram designados pela esquerda para a reação. Como o grupo Ruth Sent Us escreveu no Twitter: “Se você é um 'católico por escolha', ex-católico, de outra ou nenhuma fé, reconheça que seis católicos extremistas decidiram derrubar Roe”. Enquanto isso, o Rise Up 4 Abortion [Lute pelo Aborto] pedia protestos ininterruptos e de uma semana nas igrejas – contra o que chama de “fascismo cristão”.

Que esses grupos tenham começado sua ofensiva no Dia das Mães – uma celebração da maternidade, o verdadeiro oposto do aborto – é irônico além de ser desrespeitoso. Além disso, é bastante inútil. A Igreja, como qualquer outra organização religiosa, não tem poder legislativo ou judiciário na América (de fato, a história da Reforma Ocidental envolve sua separação do poder estatal). Não pode alterar o veredicto do Tribunal nem decretar qualquer recurso político. Somente o Tribunal e o Congresso podem fazê-lo. Exigir “direitos” ao aborto fora de uma igreja, então, não leva a nada.

O que é intrigante, então, é o foco específico nas igrejas católicas. Sim, a Igreja Católica historicamente desempenhou um papel significativo na causa pró-vida. Mas é um entre muitos, e seu papel no próprio caso Dobbs é marginal em comparação com a atividade zelosa de outros em ambos os lados do caso. Não foi parte no caso. Não desempenhou um papel na elaboração da lei do Mississippi. Não liderou a campanha para construir apoio em Dobbs. Embora a Igreja há muito se oponha ao aborto e tenha apresentado vários amicus briefs [Nota da tradutora: Documentos legais apresentados por pessoas ou organizações que não fazem parte diretamente do caso, mas auxiliam um tribunal de apelação oferecendo informações ou argumentos adicionais e relevantes que o tribunal possa considerar antes de tomar sua decisão. Eles essencialmente mostram ao tribunal que sua decisão final afetará outras pessoas além das partes] no caso, essas ações não foram diferentes das milhares de outras partes que entraram com processos semelhantes e fizeram muito mais. Claramente, nesta rodada da luta contra o aborto, a Igreja se juntou a milhões de americanos torcendo do lado de fora em vez de pular na arena. A ideia de que seja responsável pela decisão de Dobbs de alguma forma significativa para merecer tais protestos é um exagero.

Isso faz com que nos perguntemos por que os ativistas são tão obcecados pelos católicos. Muitos grupos religiosos, ONGs e instituições em todo o país são pró-vida, mas nenhum protesto sistemático foi planejado contra eles. As igrejas católicas são os estabelecimentos – além das casas dos juízes da Suprema Corte – que foram escolhidos para manifestações.

Ruth Sent Us revela o propósito de forma bastante clara. Leia o tweet do grupo novamente: “seis católicos extremistas decidiram derrubar Roe”. Católicos extremistas . Essa calúnia é a única conexão real entre a Igreja e este caso: as crenças dos juízes católicos que votariam com a maioria. Não importa que o juiz Neil Gorsuch seja da Igreja Episcopal [Igreja que faz parte da Comunhão Anglicana], que o voto do presidente Roberts ainda não tenha sido determinado, ou que o projeto de opinião do juiz Samuel Alito não tenha se baseado em nenhum fragmento de lei canônica, escritura ou citação religiosa. Foi, como Michael Brendan Dougherty escreveu na semana passada, uma opinião “brilhante e perspicaz”, bastante citada, e abrangente em refutar legalmente todas as reivindicações de um direito constitucional ao aborto. Para a esquerda, nada disso importa. Como cinco membros da suposta maioria também são membros da Igreja, o catolicismo deve ser a fonte de seu governo, eles acreditam. Portanto, para eles, os católicos da América devem sofrer a indignidade de que seus lugares sagrados sejam alvos. A Igreja Católica está sendo bode expiatório da esquerda.

Esta resposta é pior do que ignorante. Ela continua uma corrente de sentimento anticatólico na vida americana, que remonta a 1789. Mesmo quando os Pais Fundadores escreveram a liberdade religiosa na Constituição dos EUA e proclamaram que “nenhum teste religioso será exigido” para cargos públicos , o fanatismo anticatólico da Inglaterra georgiana persistiu nas margens do jovem país, com “Noites do Papa” sendo realizadas para queimar efígies do pontífice. Arthur M. Schlesinger pai chamou isso de “o viés mais profundo da história do povo americano”. Atingiu um apogeu em 1960, durante a campanha de John F. Kennedy para a presidência, antes de retroceder mais uma vez.

Agora, essa antiga linha retornou com um novo sabor, à medida que a esquerda política usa a fé católica como seu espantalho para o medo, evocando velhos arquétipos da Igreja como uma marionetista dando instruções a seus seguidores (neste caso, os juízes). As pessoas diziam o mesmo sobre o católico Kennedy em 1960 – que ele receberia instruções do papa em Roma. Em 2017, vimos isso com a terrível declaração da senadora Dianne Feinstein (Democrata, Califórnia) – “O dogma vive alto em você, e isso é uma preocupação” – na audiência de confirmação do Tribunal de Apelações da então professora Amy Coney Barrett. Agora, em 2022, voltou a todo vapor, com ativistas pró-aborto em todo o país desviando sua raiva para a Igreja, com base na mentira de que é a éminence grise [eminência parda] dos juízes católicos sobre o aborto.

Essa mentira deve ser denunciada, ridicularizada e devolvida às cinzas. Os juízes não estão em dívida com a Igreja em suas decisões. A Igreja é, absolutamente, apenas uma das muitas vozes no robusto debate sobre o aborto nos Estados Unidos. Os católicos merecem praticar sua fé sem medo e assédio de multidões enfurecidas por uma decisão que não escreveram. Líderes democratas – muitos deles católicos, por exemplo, o presidente Biden e a presidente da Câmara Nancy Pelosi – devem condenar retumbantemente o fanatismo dos protestos pró-aborto de seu lado em todo o país. É um teste de sua própria fé: não na Igreja, mas na própria América.

Arjun Singh é formado em ciência política pela Universidade de Toronto.

©2022 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]