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“Enquanto critica o nacionalismo, Macron, no entanto, fala e age como se ele fosse um chauvinista francês inseguro” | Yoan  Valat/AFP
“Enquanto critica o nacionalismo, Macron, no entanto, fala e age como se ele fosse um chauvinista francês inseguro”| Foto: Yoan Valat/AFP

Quase tudo que o presidente francês Emmanuel Macron disse recentemente sobre negócios estrangeiros, Estados Unidos, nacionalismo e patriotismo é bobo. Ele repreende implicitamente Donald Trump por retratar a ideia do nacionalismo como um credo no qual os cidadãos das nações soberanas esperam que seus líderes coloquem em primeiro plano os interesses de seus concidadãos e em segundo plano os de outras nações. E, enquanto critica o nacionalismo, Macron, no entanto, fala e age como se ele fosse um chauvinista francês inseguro.

O presidente francês sofre dos habituais sonhos de algum tipo de “império” europeu – César, Napoleão, Hitler e… Bruxelas? Ele provavelmente imagina uma nova Roma dirigida por elites culturais francesas cuja sabedoria, estilo e sofisticação substituiriam os tanques e bombardeiros poluentes, representando os filósofos da Grécia dizendo às legiões romanas da Europa: “É sobre a Europa ter de se tornar uma espécie de império, assim como a China é. E como os EUA são”.

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Mas, além do fato de que a Europa Ocidental, preocupada com a imigração, e o sul da Europa, em meio de crises financeiras, serem cada vez mais céticos em relação ao ecumenismo imperial do norte da Europa, será que Macron consegue citar qualquer “império” no passado – persa, romano, otomano, britânico – que não era antes de mais nada “nacionalista”?

Um “império europeu” não nacionalista colocaria os interesses dos Estados Unidos ou da China em um plano igual ao seu? Seguiria os ditames da ONU? Macron se opõe ao nacionalismo apenas porque outros nacionalistas são mais poderosos do que ele, com seu próprio tipo de nacionalismo (seja ele francês ou europeísta)? E ele, portanto, busca influência competitiva através de um projeto nacionalista imperialista europeu? As nações não seriam nacionalistas singularmente, mas seriam nacionalistas coletivamente?

Macron é abjetamente ignorante em história. Ele faz referência ao espantalho do chamado “nacionalismo” que, supostamente, no piloto automático, causou as 20 milhões de mortes da Primeira Guerra Mundial. De fato, o nacionalismo salvou a civilização ocidental de agressões no fim das contas. 

Lembre-se da resiliência francesa em Verdun, da coragem britânica na Bélgica e da confiança americana e orgulho nacional em enviar mais de dois milhões de soldados para a Europa para impedir um imperador alemão de criar um “império” alemão pan-europeu. Sonhos internacionalistas bolchevistas de compartilhar um comunismo europeu coletivo ajudou a arruinar a Rússia, já que os comunistas cederam grande parte da Rússia europeia industrializada para ocupantes autoritários prussianos sob o Tratado de Brest-Litovsk, do início de 1918.

O que quase arruinou a civilização ocidental em 1918 não foi o próprio nacionalismo, mas sim o militarismo autoritário, corporificado pelas suposições do Kaiser Wilhelm de que a Alemanha era econômica, cultural e militarmente superior aos seus vizinhos. Em sua análise de custo-benefício, Berlim, portanto, pensou que seria lucrativo tomar pela força o que a Alemanha achava que merecia naturalmente.

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Vinte anos depois, a própria ausência de um nacionalismo britânico e francês – simbolizado pelo debate da União de Oxford de 1933 ou a relutância das escolas francesas na década de 1930 em fazer referência ao heroísmo sangrento em Verdun – levou ao apaziguamento e à confiança fatal em uma Liga das Nações fraca e moralmente neutralizada, a uma série de tratados inexequíveis de limitações de armas e à “opinião internacional”. 

A Liga se gabou de sua sabedoria coletiva e poder ético, mas simplesmente permitiu que Hitler violasse sistematicamente o Tratado de Versalhes. E ficou parada enquanto o Japão começava a anexar faixas da Manchúria, e a Itália enviava suas tropas sem impedimento pelo Canal de Suez, a caminho de criar seu novo “império” italiano na Abissínia. 

Parar Mussolini exigiu mais do que o “internacionalismo” britânico e o coletivismo. Exigia a confiança nacionalista na frota britânica imensamente superior de Sua Majestade, cujos couraçados e transportadores poderiam facilmente expulsar as forças expedicionárias de Mussolini do Mediterrâneo antes que pudessem metralhar e bombardear etíopes mal armados. 

O que salvou a Europa uma segunda vez, na Segunda Guerra Mundial, foi uma redescoberta de que os ingleses eram pessoas singulares e orgulhosas, capazes de se unir ao espírito nacionalista de Winston Churchill; não confiavam mais na diplomacia internacionalista fracassada e complacente de Stanley Baldwin, de Neville Chamberlain e do conde de Halifax. O que mais tarde restaurou a Europa continental foram os americanos mobilizados que chegaram confiantes nos valores de seu país e empoderados por sua força econômica nacional e frenéticos esforços civis patrióticos em casa. 

Macron vê o nacionalismo como uma corrupção tóxica do patriotismo. Isso pode ser compreensível, dado que, no passado recente da França, Philippe Pétain (cuja carreira na Primeira Guerra Mundial, ironicamente, foi elogiada por Macron) tinha esperança de uma França de Vichy independente, nacionalista e colonial, aliada à Alemanha nazista, um Estado com poderes antissemitas, racistas e coloniais.

Assim, Macron sofre da condição psicológica conhecida como projeção, na qual as próprias falhas e preocupações são empurradas para os outros, como forma de aliviar as inseguranças e a culpa de alguém. 

Dado que o fervor autoritário racial na França, Alemanha, Grécia, Itália, Portugal e Espanha na década de 1930 derivou de ideias pseudocientíficas de superioridade genética e da noção de que a cidadania era baseada na raça, pode ser natural que Macron seja defensivo com o assunto do “nacionalismo” num estilo europeu. Talvez seja reconfortante culpar as ditaduras raciais europeias por um “nacionalismo” mais genérico ao qual todos os países supostamente são propensos.

Macron se esquece completamente do fato de que quando pequenos grupos de nacionalistas raciais na América se identificam, eles o fazem com os adjetivos necessários: os nacionalistas “negros” dos anos 60, os nacionalistas “La Raza” da mesma época e os nacionalistas “brancos” de hoje. Por sua própria nomenclatura, todos aceitam que sem tais adjetivos qualificativos, a idéia do nacionalismo americano não seria deles, mas naturalmente e normalmente entendida como uma noção ecumênica de que todos os americanos de todas as raças vêem seu próprio futuro coletivo e unido como frequentemente distinto e ocasionalmente em desacordo com as agendas de outros povos e nações.

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Os americanos no exterior, mesmo quando de etnias e raças diferentes, identificam-se mais facilmente uns com os outros do que com estrangeiros que parecem superficialmente semelhantes a si mesmos. Quando vou para o exterior, naturalmente tenho mais em comum e me preocupo mais com um turista afro-americano ou um expatriado mexicano-americano do que com os escandinavos. Não desejo nenhum mal aos meus ancestrais escandinavos, mas tenho pouco em comum com eles, e me preocupo com o país deles muito menos do que com o meu.

Macron também adverte contra a Rússia, a China e os EUA como novos rivais iguais ou inimigos de seus militares europeus. A idéia de um exército pan-europeu que, em teoria, deteria os EUA é tão louca quanto historicamente deselegante. Os países que atualmente não podem sequer cumprir seus prometidos 2% do PIB para seus próprios gastos com defesa dificilmente podem falar em criar outra aliança militar transnacional. 

Na concepção de Macron de uma força da OTAN e da União Europeia (EU), os pilotos da Grécia realizam missões da Otan às segundas-feiras e missões da UE às terças-feiras, ou talvez eles lutem uns contra os outros às quartas-feiras? Os isolacionistas nos EUA estariam dispostos a aceitar a ideia, porque liberaria os EUA do que eles consideram o caro albatroz europeu.

Em teoria, sem a garantia de que uma América intervencionista intercederia em nome da Europa, talvez os europeus de Macron fossem forçados a se defender – o que não seria ruim. Na realidade, dada a história do século 20, há poucas evidências de que os Estados Unidos representem alguma ameaça à Europa, ou que uma Europa ameaçada esteja segura sem a parceria com a América.

O grande idealista Macron é, na verdade, um realista frio que aceita que não há nada diferente entre uma República americana constitucional e ditaduras na China e na Rússia? Foi essa a verdadeira lição da Primeira e da Segunda Guerras Mundiais: que a França teve que se defender de regimes autoritários na Alemanha e na Itália, bem como de uma América democrática agressiva? Em 1944, a França estava preocupada que uma América libertadora iria se agarrar ao território francês que libertou, como os alemães haviam feito com o que conquistaram e exploraram em 1940? Os cemitérios dos EUA na França são uma prova do imperialismo norte-americano?

Macron considera os Estados Unidos – tanto em seu papel no século 20 como em seu atual status de aliado de uma França muito mais fraca – como amplamente irrelevantes? Ele realmente acredita que os EUA representam uma grande ameaça para a França, como a China e a Rússia? Será que ele entende que, se isso for verdade, então o americano de hoje obviamente não precisa se associar à França ou mesmo considerá-lo um aliado? É claro que o governo americano não vê a França como um inimigo em potencial, como a China e a Rússia. Mas devemos perguntar a Macron: deveríamos?

O que faz um Macron revelar sua idiotice tão abertamente, além de sua ignorância inata?

Primeiro, ele vê oportunidades decorrentes dos problemas na Alemanha, a erosão do governo de Merkel e os crescentes temores europeus sobre um possível Quarto Reich. Talvez Macron se considere como outro Charles de Gaulle levando a França ao sucesso. Como homem de “ideias”, ele oferece uma visão oposta que pode inspirar uma Europa cada vez mais influenciada pela noção de Donald Trump de que, quando as nações cuidam de seus próprios assuntos primeiro, é mais provável que consigam ajudar os outros. 

Em segundo lugar, Macron não pode aceitar que um Trump rude tenha tido muito mais sucesso que um Macron dândi. Em todos os principais indicadores econômicos recentes, os EUA têm um desempenho muito superior ao da França: desemprego (3,7% da americana versus 9,3% da França), crescimento do PIB (3,5% versus 0,4%), e em todos os vários indicadores globais de confiança do consumidor. Nas recentes decisões de política externa dos EUA, desde rejeitar o acordo iraniano até a mudança da embaixada dos EUA de Tel Aviv para Jerusalém, as advertências francesas sobre o caos e a catástrofe revelaram-se vazias. 

Em terceiro lugar, líderes franceses in extremis (a popularidade de Macron é de 25%) muitas vezes difamam os EUA e exaltam a grandeza não realizada da França. Será que nos lembrados do ex-comunista, traficante condenado e colaborador petroleiro de Saddam Hussein, o primeiro-ministro Jacques Chirac, e de seu ministro das Relações Exteriores, Dominique de Villepin, autor de um panegírico de Napoleão, que transformou o debate da ONU sobre a Guerra do Iraque em um circo antiamericano? 

Em quarto lugar, Macron não é realmente um antinacionalista, mas um oportunista que, por falar nisso, não é contrário ou favorável a qualquer ideia de forma consistente. Em 2003 e 2004, foi útil para os políticos e intelectuais franceses atacarem os Estados Unidos como intervencionistas ingênuos, supostamente atrapalhados com o mundo, em meio à conversa de alto nível de George W. Bush sobre a liberdade universal, entendendo o desejo nos corações de todos os homens de viver em liberdade democrática. Os franceses zombaram dessa ideia internacionalista tanto quanto condenam a noção nacionalista de Trump de que os americanos cuidarão de seus próprios negócios primeiro e não pressionarão os outros sobre suas próprias ideias da vida boa e segura.

Em quinto lugar, o nacionalismo atual é expresso na Europa não como uma supremacia racial, mas como profunda aversão à elite da União Europeia, que é vista como arrogante e imune às consequências de suas próprias crenças utópicas. Em referendos honestos, os eleitores em cerca de um terço dos países da UE podem agora rejeitar os seus pactos anteriores da UE. O que os mantém, por enquanto, é um cálculo realista de que o dinheiro redistribuído que recebem é maior do que os impostos que depositam – não o amor a Bruxelas, nem o desejo de um exército continental nem mais solidariedade pan-europeia, ou o anseio pelo império de Macron ou o ódio pelos Estados Unidos.

Monsieur Macron posou como o grande europeu educando implicitamente Donald Trump sobre as lições da história e da ciência política – e nisso provou apenas que sua suposta educação de elite e treinamento profissional não é um substituto para o senso comum, uma compreensão básica da história e alguma experiência prática sobre como o mundo funciona.

* Victor Davis Hanson é pesquisador sênior do Instituto Hoover e autor de The Second World Wars: How the First Global Conflict Was Fought and Won [As Segundas Guerras Mundias: Como o Primeiro Conflito Global foi Lutado e Ganho].

Tradução: Gisele Eberspächer

©2018 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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