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Temos de analisar sobriamente os custos de se salvar uma vida. E só podemos fazer isso depois de deixar o pânico e a demagogia de lado.
Temos de analisar sobriamente os custos de se salvar uma vida. E só podemos fazer isso depois de deixar o pânico e a demagogia de lado.| Foto: Reprodução/ Twitter

Em tempos de crise, políticos querem mostrar que estão fazendo alguma coisa e não querem nem saber de limites à sua autoridade. Em tempos de crise, as pessoas querem que alguém faça alguma coisa e não querem nem ouvir falar em trocar uma coisa por outra.

Este é o cenário que dá origem a medidas grandiosas sob o mantra “tudo por uma única vida”. O governador de Nova York, Andrew Cuomo, invocou o mantra para defender suas políticas de quarentena. O mantra ecoou por todo o país, dos conselhos dos condados até os prefeitos, passando por conselhos educacionais, forças policiais e clérigo, como uma justificativa para quarentenas, toques de recolher e distanciamento social obrigatório.

As pessoas racionais entendem que não é assim que o mundo funciona. Independentemente de aceitarmos ou não, as trocas existem. E aceitarmos que elas existem é uma parte importante da criação de medidas eficazes.

Infelizmente, a simples menção a trocas em tempos de crise dá origem à acusação de que apenas monstros sem coração seriam capazes de trocar vidas humanas por dinheiro. Mas todos nós fazemos essa troca, e várias outras, todos os dias.

Cinco mil norte-americanos morrem todos os anos engasgados com alimentos sólidos. Poderíamos salvar todas essas vidas exigindo que todos os alimentos fossem transformados em purê. Os alimentos pastosos não são gostosos, mas, se eles são capazes de salvar ao menos uma vida, então a troca deve valer a pena.

Sua chance de morrer dirigindo um carro de pequeno porte é quase o dobro da sua chance de morrer ao volante de um SUV. Poderíamos salvar mais vidas obrigando todos a dirigirem carros maiores. SUVs são mais caros e poluentes, mas, se eles forem capazes de salvar ao menos uma vida, então a troca deve valer a pena.

Doenças cardíacas matam cerca de 650 mil norte-americanos todos os anos. Poderíamos diminuir a incidência de doenças cardíacas em 14% se obrigássemos todo mundo a se exercitar diariamente. Muitos não vão querer, mas, se isso for capaz de salvar ao menos uma vida, então a troca deve valer a pena.

Todas essas leis seriam ridículas e a maioria das pessoas sãs percebe isso. Como sabemos? Ora, todos fazemos escolhas como essas cotidianamente, escolhas que aumentam nossas chances de morrermos. E fazemos essas escolhas porque há limites quanto ao que estamos dispostos a deixar de lado para aumentar nossa chance de permanecermos vivos.

Verdade inconveniente

Nossas ações cotidianas provam que nenhum de nós acredita que o argumento “se isso salvar ao menos uma vida” é uma base razoável para a tomada de decisões. Ainda assim, diante da ameaça do coronavírus, procuramos por uma cura imaginável que salvará vidas sem que se faça concessões.

O presidente do Federal Reserve Bank de St. Louis estimou que a paralisação atual da economia gerará um desemprego de 30% e uma redução de até 50% no PIB do segundo trimestre de 2020. Isso equivale a uma perda de US$2,6 trilhões só no segundo trimestre. Antes do distanciamento social, a projeção mais pessimista do CDC para os Estados Unidos era de 1,7 milhão de mortes no país. Mesmo neste cenário e mesmo que o custo fosse apenas o de uma queda de 50% no PIB de um trimestre, a paralisação terá custado US$1,5 milhão por vida salva. Se a quantidade de mortos for menor e se o custo da paralisação econômica for maior, o custo por vida salva pode ser muito, muito maior do que isso.

O contra-argumento a isso é de que deveríamos “falas essas coisas para as famílias que perderam um ente querido para o vírus”. Mas isso serve para as duas coisas, há que também podemos usar esses dados como argumento para as famílias que perderão entes queridos para a pobreza, depressão, suicídio e violência doméstica que acompanharão a taxa de desemprego de 30%.

Todos os anos, há 10 milhões de casos de violência doméstica nos Estados Unidos e mais de 47 mil suicídios. A paralisação aumentará esses números, aumentando proporcionalmente o custo de US$1,5 milhão por vida salva. As ligações para os serviços de ajuda a pessoas com transtornos mentais aumentaram quase 900% desde a quarentena.

A verdade inconveniente é que nenhuma medida é capaz de salvar vidas. Elas só podem compensar vidas. Medidas boas resultam numa troca positiva. Mas não sabemos dizer se a troca foi positiva antes de analisarmos sobriamente os custos de se salvar uma vida. E não podemos fazer isso até que deixemos de lado essa bobagem de “se isso for capaz de salvar ao menos uma vida”.

Não sabemos qual a taxa de letalidade do vírus porque não realizamos exames aleatórios em massa na população. Não sabemos o custo econômico da quarentena porque nunca paralisamos nossa economia antes. O que sabemos é que as medidas criadas para impedir a disseminação do vírus a qualquer custo nasceram mais do medo do que de uma preocupação verdadeira com a vida. Já está na hora de analisarmos com sobriedade os custos dessa paralisação.

Dr. Antony Davies é pesquisador na FEE, professor de economia na Duquesne University e coapresentador do podcast Words & Numbers.

James R. Harrigan é diretor do Centro de Filosofia da Liberdade na Universidade do Arizona e pesquisador na FEE. Ele também é coapresentador do podcast Words & Numbers.

© 2020 FEE. Publicado com permissão. Original em inglês
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