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O senador dos EUA, Bernie Sanders, fala à mídia depois de uma apresentação a portas fechadas sobre o Irã no Capitólio dos EUA em Washington, DC, em 21 de maio de 2019.
O senador dos EUA, Bernie Sanders, fala à mídia depois de uma apresentação a portas fechadas sobre o Irã no Capitólio dos EUA em Washington, DC, em 21 de maio de 2019.| Foto: MANDEL NGAN / AFP

Bernie Sanders e eu temos pouco em comum, dado seu compromisso apaixonado com o socialismo "democrático" e minha firme crença na liberdade individual. Mas nós compartilhamos uma coisa: nós dois visitamos Moscou em 1988, embora por diferentes razões.

Sanders estava no que ele chamou de "uma lua de mel muito estranha" com sua noiva Jane. Eu estava viajando na União Soviética com uma delegação de jornalistas ocidentais e líderes de opinião.

Sanders, então com 46 anos e prefeito socialista de Burlington, Vermont, passou por momentos maravilhosos combinando negócios e prazer, e conhecendo “pessoas comuns” (cuidadosamente selecionadas pelo Partido Comunista, você pode ter certeza).

Atravessou a Praça Vermelha e viu o túmulo de Lênin, visitou Leningrado (agora São Petersburgo) e fez um passeio de barco pelo rio Volga. Ele viajou para Yaroslavl — a “cidade irmã” de Burlington — onde ele visitou fábricas, hospitais e escolas, tudo preparado para os visitantes americanos como uma cidade cenográfica onde tudo era falso.

Apesar de visitar por apenas dez dias, Sanders encontrou coisas de que gostava, incluindo as moradias, que custavam apenas 5% da renda dos russos, em vez dos 40% nos Estados Unidos. Obviamente, ele não pôde visitar, como eu, um apertado apartamento em Moscou de dois pequenos quartos ocupados por uma família de cinco pessoas.

A certa altura, Sanders criticou severamente a forma como os Estados Unidos interveem em outros países. Mas ele não mencionou as inúmeras intervenções soviéticas desde a Segunda Guerra Mundial — incluindo a Cortina de Ferro, que isolou 100 milhões de pessoas da Europa Central e Oriental, o esmagamento da Revolução Húngara de 1956, a Crise dos Mísseis de Cuba de 1962, e a supressão da rebelião tcheca de 1968, a proibição do sindicato Solidariedade na Polônia em 1980 e a invasão do Afeganistão em 1979.

Enquanto em Yaroslavl Sanders e seus companheiros de Vermont foram tratados com uma visita a uma sauna seguida por tantos brindes de vodka e canções folclóricas russas que um Sanders de peito nu e toalha foi inspirado a responder com o clássico socialista do cantor Woody Guthrie (1912-1967): “This land is yours” (A terra é sua terra)

A quase mil quilômetros a sudoeste, Sanders poderia ter visitado Chernobyl, local do pior desastre nuclear do mundo, três anos antes, que transformou aquele lugar na terra de ninguém. Qualquer nação pode ter um colapso nuclear, é claro, mas os soviéticos liderados por Mikhail Gorbachev mantiveram isso em segredo, permitindo que as pessoas adoecessem e milhares morressem.

Do que mais Sanders sentiu falta em sua lua de mel em Moscou?

Uma visita a GUM, a gigantesca loja de departamentos em frente à Praça Vermelha. Quando visitei, vi compradores desesperados vagando pelos corredores como lobos famintos procurando por chapéus, luvas e casacos. Dezenas de mulheres faziam fila para comprar pares de botas que, se não coubessem, trocariam umas com as outras na calçada.

Claramente, Sanders não teve a oportunidade, como eu, de visitar uma “mercearia” oficial sem mercadorias, exceto por dúzias de latas sem rótulo, ignoradas por compradores e algumas galinhas amareladas que até um homem faminto teria rejeitado.

De volta a Vermont, Sanders elogiou as habitações soviéticas e os serviços de saúde e criticou abertamente os Estados Unidos. Mas ele deixou de fora a sistemática repressão soviética de dissidentes corajosos como Natan Sharansky, que estaria até hoje no gulag se o presidente Ronald Reagan não tivesse determinado o fim da Guerra Fria a vencendo.

No ano seguinte, Sanders visitou Cuba e, embora não tenha conseguido uma audiência com Fidel Castro, voltou com elogios ainda maiores a Cuba do que à União Soviética.

Enquanto admitia que Cuba tinha “enormes deficiências” em direitos humanos, ele declarou que nunca viu uma criança faminta ou um sem-teto, mas viu uma revolução “que é muito mais profunda e profunda do que eu entendo que seja”.

É uma pena que Sanders não tenha voltado a Cuba alguns anos depois e passeado com as Damas de Branco — as esposas e parentes de muitos dissidentes cubanos presos. As damas vão à missa todos os domingos vestidas de branco e depois caminham silenciosamente pelas ruas de Havana.

Este é o verdadeiro rosto da Revolução Cubana, que Bernie Sanders não parece interessado em ver.

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