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O que São Paulo precisa resolver para deixar de ser o símbolo do subdesenvolvimento brasileiro
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A cidade de São Paulo, com seus mais de dez milhões de habitantes, pode ser considerada um ótimo retrato do que vai bem e vai mal no Brasil. A cidade é uma potência econômica, para ela confluem os maiores talentos do país em todas as áreas, possui imigrantes de todas as partes do mundo e mesmo assim não consegue resolver problemas básicos de infraestrutura.

Assim como o Brasil nunca deixa de ser o país do futuro, falta a São Paulo o salto decisivo para levar a prosperidade de bairros como os Jardins, Morumbi e Pinheiros a todos os rincões do município, como Brasilândia e Sapopemba, Jardim Nordeste e Itaquera.

No aniversário de 464 anos da cidade, listo problemas que mostram o que falta para São Paulo se igualar a metrópoles como Tóquio, Nova York e Berlim.

Rios poluídos

Em 2001, quando foi lançado um projeto de despoluição do Rio Pinheiros, por meio de flotação (um produto químico é jogado na água e faz a sujeira flutuar, tornando na teoria mais prática sua retirada), um dos membros do governo estadual disse que pretendia pescar ali mesmo um ano depois.

Em 2004, o tucano Ricardo Tripoli, que havia sido secretário de meio-ambiente no governo Mário Covas, usou a Folha de S. Paulo para detonar os críticos da flotação implantada pela administração estadual.

“Se o Estado, governado pelo PSDB, obtém sucesso nessa empreitada, transformando o entorno do Pinheiros num oásis dentro da capital de São Paulo, num grande parque público, tal feito irá eclipsar qualquer intervenção urbana que tenha sido realizada pela prefeita do PT [então era Marta Suplicy], colocando em grande risco a reeleição desta.”

Hoje, 17 anos depois, é bem seguro dizer que desde então nenhum peixe vivo foi avistado no Rio Pinheiros e que nenhum parque público “transformou o entorno” do Rio Pinheiros. Pelo contrário, o rio, que outrora abrigava práticas como natação e remo, continua sendo um grande e malcheiroso esgoto a céu aberto. Mais de R$ 80 milhões gastos nestes anos todos inutilmente com a flotação não melhoraram a qualidade de um mísero centímetro cúbico da água.

Nossas convicções:

Despoluir o Tietê e o Pinheiros não é uma tarefa impossível. Outras metrópoles mundiais como Paris e Londres despoluíram respectivamente os rios Sena e Tâmisa, que foram no passado até mais poluídos que os rios que cortam São Paulo. O Tâmisa tinha um mau cheiro tão forte que obrigou o cancelamento de sessões do Parlamento Inglês, que fica à beira do rio. Paris possui um projeto para tornar as águas do Sena aptas para a natação até 2024. Salmões voltaram a ser presentes no rio em 2009.

São Paulo tem dinheiro para despoluir seus rios. Já foram investidos bilhões (sim, bilhões, com “b”), na despoluição do Tietê. Enquanto eles continuarem como uma mancha negra e fedorenta à beira de avenidas modernas e ricas como a Berrini, ou de construções grandiosas como o Shopping JK Iguatemi e Cidade Jardim, a cidade de São Paulo continuará um grande retrato do Brasil subdesenvolvido, onde bolsões de riqueza convivem lado a lado com a miséria e o permanente improviso urbanístico.

Trânsito

O Brasil ocupa o vergonhoso terceiro lugar entre os países que mais matam no trânsito, com 37.306 mortes e 204 mil feridos registrados em 2015. Em um país assim, uma das prioridades deveria ser evidentemente a redução do número de acidentes.

Em São Paulo, após um período de queda no número de mortes na Marginais, resultado da diminuição do limite de velocidade, eis que o prefeito João Dória (PSDB) resolve aumentar novamente os limites. O resultado em 2017, primeiro ano de sua gestão, foi um aumento de 23% no número de mortes nas vias expressas Tietê e Pinheiros.

Nossas convicções:

João Dória talvez nem seja o principal culpado, já que o aumento no limite era uma demanda da própria população. Espertamente, o prefeito transformou isso em uma de suas bandeiras de campanha. O bom estadista, no entanto, e Dória certamente almeja ser um estadista, já que andou sondando até se candidatar à presidência, às vezes precisa proteger o povo de suas próprias vontades, principalmente quando atentam à segurança e à vida de parte da mesma população.

Transporte público

São Paulo possui a maior rede de metrô do Brasil. Ainda é muito pouco. Inaugurado em 1974, o metrô de São Paulo tem 81 quilômetros de extensão. Seria covardia comparar com cidades como Paris e Madri, que possuem população muito menor que a capital paulista e mais de 200 quilômetros de extensão de metrô.

Então a melhor comparação é com outras capitais sul-americanas. Como informou o El Pais, Buenos Aires tem 2,9 milhões de habitantes e 55 quilômetros. Santiago, a capital do Chile, tem 94 quilômetros para atender 6,3 milhões de habitantes. A Cidade do México possui 202 quilômetros para 8,8 milhões de pessoas. Até a venezuelana Caracas possui uma relação melhor de quilômetros de metrô por pessoa: 67 quilômetros para 2 milhões de habitantes.

Nossas convicções:

As razões para São Paulo estar atrás até na América Latina são muitas. O metrô brasileiro, por alguma razão, é muito caro. A linha 5-Lilás do metrô paulistano teve um custo total previsto de R$ 7 bilhões — já está em R$ 10 bilhões. Além disso, os prazos de entrega nunca são cumpridos: a mesma linha 5-Lilás ainda não foi totalmente entregue, sendo que a previsão inicial era de 2014. O famoso monotrilho, que primeiro foi previsto para a Copa do Mundo e depois ficou para 2016, só terá as primeiras estações inauguradas este ano. A conferir.

Como retrato do Brasil, é bom lembrar que Salvador, Brasília e Rio de Janeiro possuem malhas ainda inferiores em extensão.

Tecnicamente, São Paulo e o país são capazes de construir e entregar no prazo. Mas a corrupção atrapalha. A justiça de São Paulo investiga um esquema de fraude na licitação feita em 2009 para a operação e manutenção dos trens metropolitanos da capital. O valor era de R$ 1,8 bilhão.

Combate às drogas

O termo “cracolândia” não nasceu à toa em São Paulo. Há décadas, viciados e traficantes praticamente privatizaram todo um espaço público no bairro da Luz, em São Paulo. Governos municipais e estaduais tentaram seguidamente combater o problema sempre com paliativos, às vezes os piores possíveis.

O prefeito Gilberto Kassab (2006 – 2012) fechou comércios da região, afastando ainda mais a população do local, deixando a região mais deserta e propícia ao tráfico. Nunca houve cooperação nas esferas federal, estadual e municipal.

Nossas convicções:

Enquanto cidades como Nova York enfrentaram crises piores que a de São Paulo e conseguiram resolvê-las, São Paulo continua testando modelos falidos e caros. O problema das cracolândias não é exclusivo de SP. Uma vez mais, porém, uma cidade com as melhores universidades e profissionais, e recursos à disposição, deveria ser a primeira a ter pelo menos controlado o problema.

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