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Milhares de manifestantes protestam em Richmond, Virgínia
Milhares de manifestantes protestam em Richmond, Virgínia, no dia 13 de junho de 2020.| Foto:

No mês passado, protestos contra o racismo foram realizados diariamente nas maiores cidades dos Estados Unidos. Começaram como um movimento negro contra a brutalidade policial, mas agora estão diferentes. Em muitos casos, os brancos assumiram o controle. Eles fazem gestos conciliatórios, pedindo desculpas por seu "privilégio branco" e, em pelo menos um caso, lavando os pés dos negros para expiar seus pecados coletivos.

Celebridades, atletas e empresas americanas seguiram o exemplo. O chefe do departamento de polícia de Portland renunciou, pedindo para ser substituído por um homem negro, e o CEO da Chick-fil-A (uma rede de fast food) pediu aos brancos que lustrassem os sapatos dos negros para mostrar um "sentimento de vergonha". Inúmeros outros prometeram milhões de dólares para acabar com o racismo. Vendo tudo isso, alguém se pergunta: por que agora?

Para descobrir o que estava motivando o debate sobre raça nos EUA, tive que ouvir o que os brancos estavam dizendo. Ouvi os manifestantes, conversei com meus amigos brancos e li artigos e postagens nas mídias sociais daqueles que apoiam o movimento. Duas coisas deixaram tudo mais claro para mim. A primeira foi um vídeo que eu vi compartilhado nas mídias sociais explicando o "racismo sistêmico". O vídeo compara dois amigos -- Jamal, que é preto, e Kevin, que é branco. "Este é Jamal", começa o narrador. "Jamal é um garoto que vive em um bairro pobre. Ele tem um amigo chamado Kevin, que vive em um bairro rico. Todos os vizinhos de Jamal são afro-americanos e todos os vizinhos de Kevin são brancos." O vídeo começa com uma imagem de Jamal em pé na frente de uma casa fechada com janelas quebradas. Isso parece excessivamente simplista, projetado para mostrar um ponto extremo.

Então ouvi as notícias sobre as universidades que decidiram parar de usar o ACT ou o SAT (testes padrão aplicados em todo o país, uma espécie de ENEM americano) para admissões, porque os testes são tendenciosos contra os negros. As escolas não dizem que os negros não são espertos o suficiente para pontuar bem no teste -- isso seria racismo vulgar --, mas que crianças negras não podem pagar professores particulares ou aulas preparatórias que as crianças brancas usam para aumentar sua pontuação. Isso soa tão redutivo em suas suposições sobre a vida econômica negra quanto o vídeo sobre Jamal e Kevin. Em cada caso, os negros são retratados como desesperados e derrotados, sem nada em termos de recursos materiais ou pessoais para se libertar da miséria.

"Eu entendo o seu ponto", disse um amigo branco, "mas você não acha que os negros estão sendo oprimidos?"

Foi quando percebi que a consciência culpada do branco é o novo fator em nossa vida nacional. Foi incorporado à consciência dos brancos que todos os negros são iguais e que todos enfrentam barreiras impossíveis de melhorar -- do Jamal fictício aos testes padronizados, até os homens negros sendo presos no noticiário noturno. Um número crescente de brancos acredita que esses episódios são típicos da vida cotidiana dos negros.

A maioria dos brancos não tem muitos amigos negros que possam lhes contar em primeira mão quais são suas experiências com o racismo. Embora a maioria dos negros sofra alguma discriminação ou preconceito racial, raramente é violenta e não os impede de seguir adiante em um sentido significativo. O racismo é uma força “sistêmica” ou “institucional”? Faz mais de meio século que os Estados Unidos não têm mais leis que impeçam os negros de fazer qualquer coisa que os brancos possam fazer, e os órgãos e tribunais do governo monitoram de perto a vida socioeconômica em busca de vestígios de discriminação em moradias, empregos ou locais públicos.

A mídia oferece uma visão distorcida da vida negra. Vemos isso nas histórias que eles decidem denunciar - e não denunciar. Em 2018, a polícia matou 54 homens desarmados; 22 eram negros. Em comparação com a porcentagem de negros na população dos EUA, esse número parece desproporcional -- mas os negros cometem uma quantidade desproporcional de crimes violentos e, portanto, tendem a ter mais interações com a polícia. Todo tiroteio policial deve ser investigado minuciosamente e de maneira justa, mas também devemos exigir uma cobertura justa e completa pela mídia desses tiroteios. É revelador que tantas pessoas saibam de cabeça o nome de alguns dos homens negros desarmados mortos pela polícia, mas poucas lembram de qualquer um dos homens brancos.

Os negros ficam atrás dos brancos em muitos indicadores socioeconômicos -- mas a maioria dos negros não vive na pobreza, não têm problemas constantes com a polícia e não são ignorantes. É importante olhar para as disparidades raciais dentro do contexto adequado. Embora os negros cometam mais crimes violentos do que os brancos em termos relativos, em termos absolutos, a porcentagem de pessoas que cometem crimes violentos é pequena. A taxa de crimes violentos praticados pelos brancos é de 0,12%; para os negros, é de 0,44%. Por qualquer padrão, a maioria das pessoas não é um criminoso violento, independentemente de sua raça. A taxa de desemprego negro varia em média entre 7% e 12% desde que o Bureau of Labor Statistics (Departamento de Estatísticas do Trabalho) começou a manter registros, em 1954 -- exceto para uma alta de 19,5% em 1983 -- enquanto para os brancos, a média ficou entre 4% e 7%.

Essa disparidade também vale para a pobreza. A partir de 2018, a taxa de pobreza entre negros era de 20,8%, enquanto a taxa entre os brancos era de 8,1%. Embora uma subclasse negra persistentemente pobre tenha surgido desde a era dos direitos civis, a experiência da subclasse não descreve a vida de dezenas de milhões de pessoas negras. Embora devam ser feitos esforços para diminuir o déficit de pobreza entre negros e brancos, os números não são consistentes com a suposição de que os negros americanos estão amplamente empobrecidos.

No entanto, os não-negros simpáticos à causa costumam ver os negros como vítimas oprimidas, com oportunidades limitadas. Desde o assassinato de George Floyd, tenho tido muitas conversas com brancos, a maioria centrada em meu próprio bem-estar. Muitos de meus amigos negros contam histórias de suas empresas dizendo aos funcionários para "verificar" como estão seus colegas de trabalho negros. Há muitas mensagens de culpa branca ou privilégio branco, com pessoas listando, entre lágrimas, as coisas que elas podem fazer que os negros supostamente não podem fazer, como ir às compras sem serem seguidos, ou receber comida antes de pagar por isso, ou comprar doces enquanto usa um capuz -- coisas que na verdade os negros fazem todos os dias.

Onde quer que se olhe, as instituições estão demonstrando sua solidariedade com o "black lives matter" -- tanto o lema quanto a organização. O Uber Eats cancelou suas taxas de entrega para empresas geridas por negros. Acesse o YouTube ou faça um pedido na Amazon e você verá mensagens de suporte para "a comunidade negra". A Nike, a NFL e outros fizeram do dia da abolição da escravatura nos EUA um feriado remunerado para todos os funcionários. Percorra as categorias na Netflix e você encontrará: "História Negra, Dificuldade e Esperança". Quem mais, além dos negros, receberia "dificuldades" como característica? Esses gestos, principalmente simbólicos, indicam as coisas com as quais os brancos acreditam que os negros estão preocupados. Eles parecem insinceros.

Desde que os protestos começaram, os brancos “engajados” clamavam por uma maneira de fazer sua parte. Como eles não têm muitos negros em seus círculos sociais, e ter conversas com negros -- o curso de ação mais construtivo -- é constrangedor e pode levar tempo, eles optam por ações fáceis e que os façam sentir-se bem, a maioria das quais não terá efeito na brutalidade policial, na qualidade das escolas ou bairros negros, ou na vida dos negros em geral.

Quando a atriz Julianne Moore diz que os negros estão sendo massacrados nas ruas, mortos em suas próprias casas, soa muito sem noção. Ela pode se importar, mas esse tipo de afirmação -- tidas como fato - não estão ajudando, porque simplesmente não são verdadeiras. Esforços para acabar com a discriminação e os estereótipos perpetuam a percepção de que vidas negras são realmente inferiores. Como resultado, se tem a percepção que a vida negra é difícil, a vida negra é pobre, a vida negra é assustadora e a vida negra é triste. Os brancos engajados não estão dizendo que vidas negras são importantes. Eles estão dizendo que cabe a eles fazer com que vidas negras importem.

Os próprios negros não estão livres dessas crenças. Quando Gary Clark Jr., um artista vencedor do Grammy, diz que está preocupado com a possibilidade de morrer ao sair de casa, e o astro da NBA Lebron James, glorificado desde os 15 anos de idade, diz que os negros são "literalmente caçados todos os dias”, estão dizendo aos negros que qualquer esforço é inútil. Se um adolescente negro está tentando algo melhor na vida e admira Lebron, ouvir a declaração do astro de basquete só vai fazê-lo se sentir pior.

Parece que um gigante adormecido foi despertado na América branca. A maioria dos brancos engajados provavelmente tem boas intenções, mas seus gestos simbólicos terão, na melhor das hipóteses, pouco efeito e, na pior, causarão danos reais. A campanha contra a polícia é um bom exemplo. O amplo sentimento antipolicial já fez com que os policiais se tornassem menos proativos em bairros com altas taxas de criminalidade, com o resultado previsível de mais tiroteios em todo o país. Os brancos estão envolvidos em ativismo motivados por uma percepção equivocada sobre a vida negra que não se compara à realidade da maioria dos negros. Vendo os negros como coitados e perpetuamente oprimidos, os brancos engajados seriam mais úteis se não fizessem nada.

Charles Love é diretor executivo assistente da Seeking Educational Excellence e ex-apresentador de rádio em Chicago.

© 2020 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês

Conteúdo editado por:Jones Rossi
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