• Carregando...
Oswaldo Eustáquio, filie-se ao PSOL
| Foto: Divulgação

Quem é Oswaldo Eustáquio? O leitor deste jornal na certa há de se lembrar dele como o homem preso ilegalmente pelo STF, no famigerado inquérito de Alexandre de Moraes contra o inexistente crime de fake news. Nesta Gazeta, ele é referido como jornalista; em jornais outrora respeitáveis, é referido como “blogueiro bolsonarista”.

Se ele é blogueiro, há de ter um blogue. E quem é censurado merece ser lido. Assim, digo que o blogue na verdade é um site, e é este aqui: oswaldoeustaquio.com.br. Aí podemos ler a aba “Sobre o autor”, e descobrir como ele se descreve. (Se autodeclaração vale para o sexo, por que não para profissão?) Eustáquio se descreve como jornalista, e menciona inclusive prêmios recebidos nessa condição. Seu lugar original de atuação é o litoral do Paraná. Nunca vi as agências de checagem chamarem de fake news os seus prêmios jornalísticos.

Será bolsonarista? Eu sei reconhecer bem um bolsonarista quando vejo um: é o sujeito monotemático que vai defender Bolsonaro até em festa de aniversário de boneca. Não admite críticas ao Mito, está sempre com raiva de algum possível concorrente de direita em 2022, e faz o possível para desconversar quando perguntamos por Kassio Nunes no STF. O site de Eustáquio não revela esse perfil.

Mas eu sei também que, para um setor nada diminuto dos letrados, o mero fato de não ser um antibolsonarista faz de você um bolsonarista. Eu certamente não sou uma antibolsonarista, e não tenho peias em dizer que votaria nele de novo à falta de coisa que eu julgue melhor. Logo, sou uma bolsonarista para muita gente, e isso faz de mim um ser moralmente inferior aos seus olhos. Só não me mandam pra cadeia porque não podem mandar todo “bolsonarista” para lá. Mas se eu (e talvez o leitor) fosse pra cadeia, seria uma “bolsonarista” presa também. E ainda chamariam de fake news qualquer coisa que eu escrevesse aqui ou pelo WhatsApp.

Aliás, o que foi que Oswaldo Eustáquio escreveu e foi decretado fake news pelo Supermo Tribunal da Verdade, ou melhor, pelo Supremo Tribunal Federal? Acredito que o motivo tenha sido esta live, na qual o entrevistado – não o entrevistador – faz acusações ao STF. Mas é só uma especulação minha. Afinal, ninguém sabe ao certo o motivo, porque o inquérito corre em segredo de justiça. E todo mundo acha normal, porque bolsonarista é gente inferior. Contra “bolsonarista”, pode tudo!

Acidente

O homem não deveria estar preso. Preso, sofreu um acidente causado por problemas hidráulicos da cela. Ao que parece (segundo o tuíte afixado no perfil dele), ele está sem sentir as pernas. Ontem ainda circulou a notícia de que ele estava paraplégico, mas a deputada Bia Kicis afirmou que, de acordo com a ressonância, não ficou. Enfim: tudo um grande disse-me-disse, porque não há interesse muito grande de parte da maioria da imprensa de ir se inteirar do que realmente aconteceu.

Eu poderia dizer que Oswaldo Eustáquio tem a cor errada, a orientação sexual errada e o sexo errado, mas seria mentira. Todo mundo sabe que negro de direita é duplamente difamado. Oswaldo Eustáquio tem é a orientação política errada. O carimbo de “bolsonarista” faz dele um ser humano de segunda classe, cujos direitos podem ser violados.

Lembram-se de Eduardo Guimarães?

Eduardo Guimarães faz jus à qualificação de “blogueiro petista”. Tem um site chamado Blog da Cidadania, não se descreve como jornalista, e, durante a era petista, tratava mais de emitir opiniões governistas do que de apurar fatos. Quando Moro o conduziu coercitivamente para se explicar (por ter divulgado no blogue antecipações da investigação), foi um escarcéu. Os Jornalistas Sem Fronteiras se manifestaram. Chegou-se a um consenso de que blogueiros deveriam gozar do direito ao sigilo da fonte, coisa tradicionalmente reservada a jornalistas. Um blogueiro era tão bom quanto um jornalista e deveria ter direitos iguais. O ato de conduzir um blogueiro para depor representava a enésima fase do golpe, o fim da democracia, da liberdade de imprensa, aquela coisa toda.

Mas prender jornalista ilegalmente e largar lá por meses, pode.

Outra celeuma é a das algemas. Um escarcéu progressista é dizer que a algema fere os direitos humanos do bandido e devem ser usadas só quando “necessário”. (O necessário é o que der na telha do advogado de defesa.)

Entende-se que se use algema em enfermos, porque o hospital é melhor pra fugir, e preso não vira santo quando está dodói. Assim, não é de admirar que o pessoal da cadeia tenha tratado Eustáquio segundo os seus costumes, e o algemado à maca. Alguém fotografou isso e postou no Twitter dele. É claro, porém, que para quem não deveria estar ali, essa é uma humilhação maior ainda. De cidadão livre, passou a presidiário quebrado e algemado à maca.

Veja bem: se você for um traficante, um líder de organização criminosa sangrenta, entende-se que você teve uma infância pobre e expressa a sua revolta contra o capitalismo. Não será ainda mais traumatizado com um par de algemas. Mas se for carimbado como “bolsonarista”, aí pode tudo. Pode até matar, dar facada, botar culpa no Mossad.

A solução

Todo mundo sabe que, se Oswaldo Eustáquio fosse de esquerda (preferencialmente eixo Rio-São Paulo), a prisão, a queda e as algemas seriam o fim do mundo. Não ia sobrar uma vidraça na Avenida Paulista. A hashtag da vez subiria aos Trending Topics do Twitter. Levitsky declararia que as democracias não morrem mais por golpes de Estado clássicos, mas sim por meio de expedientes mais criativos, como a corrupção do Judiciário. E se Levitsky dissesse isso à luz de Eustáquio, eu concordaria com ele.

Seria bom se a sociedade se mobilizasse contra a escalada autoritária do STF. Não é Bolsonaro quem tem o poder efetivo de mandar alguém ilegalmente para a prisão. É o STF. É ele, portanto, o ator político que merece mais pressão e vigilância dos democratas.

Mas o cidadão ordeiro e trabalhador não tem tempo nem expertise em manifestação. A solução mais fácil é Oswaldo Eustáquio dizer que doravante é Oswalda e se filiar ao PSOL. (Se o PSOL negar, alegue transfobia.) Aí, sim ele deixa de ser um humano de segunda. Quem é do Partido Sol é um humano de primeira. Um nobre.

E nobre é tão nobre, que não é nobro nem nobra. Já vem em linguagem neutra, pronto para reinar na pós-modernidade.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]