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Foram muitos os carros ruins produzidos ao longo do século XX. Mas o Trabant, símbolo do comunismo na Alemanha Oriental, é o pior de todos.
Foram muitos os carros ruins produzidos ao longo do século XX. Mas o Trabant, símbolo do comunismo na Alemanha Oriental, é o pior de todos.| Foto: Pixabay

Todas as pessoas sabem apontar o pior carro que elas já tiveram. Para mim, a honra vai para o Saturn SL2 1994. Comprei o carro do meu futuro cunhado em 2007, depois que meu confiável Toyota Corolla (descanse em paz!) finalmente morreu. Eles me ofereceram o carro de graça, mas insisti em lhes pagar algumas centenas de dólares.

A única virtude do meu Saturn era o consumo, mas ele era econômico provavelmente porque alcançava no máximo 120km/h (quando então começava a tremer todo) e acelerava tanto quando um rinoceronte depois de uma ceia de Ação de Graças. Apertado e lerdo, dentro dele você sentia que estava dirigindo um carro de palhaço com um volante enorme. E ele era feito do plástico mais barato possível.

No dia em que a transmissão do meu Saturn quebrou, eu estava no casamento de um amigo, como padrinho. Estávamos saindo de um bar rumo à festa, mas quando entramos no carro o motor não ligava. Quando o guincho chegou, agradeci ao motorista e lhe dei as chaves do carro. Nunca mais o vi de novo.

Por pior que fosse o meu Saturn fosse, ele não era o pior carro da história. Na verdade, meu Saturn era um carro de luxo em comparação com o vencedor do prêmio de Pior Carro de Todos os Tempos. Essa honra é do Trabant, o péssimo veículo fabricado entre 1957 e 1990 pela montadora VEB Sachsenring Automobilwerke Zwickau, da ex-Alemanha Oriental.

Uma lista enorme e notável

Os veículos ruins são muitos. O Ford Edsel, lançado em 1955, ficou famoso por sua feiura. O Delorean só é lembrado com carinho hoje em dia por causa do filme ‘De Volta para o Futuro’, mas não se pode esquecer que seu péssimo projeto – ele era pesado demais e seu motor, muito fraco – levou seu criador à falência.

O Gremlin, carro fabricado pela American Motors Corporation, empresa que fechou na Era Reagan, parecia feito para um gremlin de verdade; pior: sua dirigibilidade era ruim e ele tinha uma suspensão horrível. E não nos esqueçamos do Pinto, da Ford, cujas falhas de engenharia incluíam um tanque de combustível que pode ter inspirado uma cena famosa de ‘Clube da Luta’ e certamente inspirou uma cena de ‘Top Secret! Superconfidencial’. (Por sinal, se você nunca viu ‘Top Secret!’, está perdendo).

Mas o Trabant consegue ser pior do que todos.

O Trabant custava um ano de salários

O Trabant, carinhosamente chamado de "Trabi" por pessoas que nunca o dirigiram, foi lançado na Alemanha Oriental em novembro de 1957. A princípio, o carro não era um desastre, pelo menos não completamente. Na verdade, ele tinha algumas características invejáveis para a época. Seu chassi de duroplast, motivo de muito riso na época, era uma novidade. O sistema de transmissão quatro-por-quatro do veículo e a suspensão independente também eram características modernas, de acordo com um motorista do Trabant.

Mas é aí que as virtudes do carro terminam e os problemas começam.

Não era só que o Trabant tivesse um motor fraco em dois tempos, embora tivesse. Não era só que o Trabant era feito de lixo reciclável (geralmente lã e algodão), embora fosse. Não era só que o Trabant tinha velocidade máxima de 96km/h e “fizesse mais fumaça do que um campo de petróleo iraquiano em chamas”, como escreveu alguém.

Não. O maior problema do Trabant era o fato de ele jamais ter passado por melhorias. Talvez não seja surpresa que o Trabant 1957 não tinha tacógrafo, seta, cintos de segurança ou indicador de combustível, forro no porta-malas e usava uma mistura de diesel e gasolina. O fato de essas características básicas ainda não terem sido implementadas quando Taylor Swift nasceu é mais surpreendente. Na verdade, quando o último Trabant foi produzido, em 1989, ele ainda não corria a mais de 96km/h e demorava 21 segundos para chegar a essa velocidade. O Aston Martin Virage, lançado no mesmo ano, demorava 6,5 segundos.

Surpreendente também é o preço do Trabant. O modelo P601, que começou a ser fabricado em 1963 e foi o Trabant produzido em maior quantidade, era vendido por 7.450 marcos orientais pelo Estado (US$1.862 em 1963, ou US$15.600 em 2019). O salário médio mensal de um alemão oriental em 1960 era de 558 marcos, o que significa que o Trabant custava mais do que o salário anual de um trabalhador comum, e era pago adiantadamente.

Os Trabants, contudo, eram até mais caros. Por causa da escassez de automóveis, no mercado negro um Trabant usado era vendido por mais do dobro do preço de um novo, de acordo com Eli Rubin, professor de história da Western Michigan University. Por que as pessoas pagavam tanto por um carro tão ruim? Porque elas não tinham alternativa.

O outro carro da Alemanha Oriental, o Wartburg, um monstro de aço duas vezes mais potente do que um Trabant e que era vendido pelo triplo do preço, era produzido para exportação (e para os nomes mais importantes do Partido). Na verdade, a despeito de uns poucos itens e da falta de confiabilidade, os alemães orientais se consideravam pessoas se sorte se conseguiam um Trabant. O tempo de espera médio era de 10 anos.

Quando o Muro caiu

Apesar de seus muitos problemas, um total de 2.818.547 Trabants 601s foram produzidos – e todos eles se tornaram obsoletos no dia 9 de novembro de 1989.

Naquele dia, o Muro de Berlim caiu. Sem aquela cicatriz grotesca que separava a Alemanha, os dias do pobre Trabant estavam contados. Richard Leiby, antigo editor do Washington Post que escreveu um livro sobre a unificação da Alemanha, diz que, com seu motor fraco e a falta de controle de emissão de poluentes, o Trabant era “claramente infelizmente a praticamente todos os carros fabricados na Europa”.

Muitos Trabants foram vendidos por um punhado de marcos. Outros simplesmente foram doados ou abandonados por famílias que fugiram para a Europa Ocidental. Um dos motivos disso é que os países europeus não queriam esses carros. Os Trabants emitiam quatro vezes mais gases poluentes do que um carro europeu típico, diz o historiador Victor Sebestyen em Revolution 1989: The Fall of the Soviet Empire [A revolução de 1989: a queda do império soviético], o que significa que ele não se enquadrava nos padrões dos demais países europeus. Mas isso não impediu que milhares de alemães o usassem para migrar para o oeste, num fenômeno que alguns chamam de “a Trilha dos Trabi”. (Na Tchecoslováquia, o evento foi apelidado de A Invasão dos Trabi).

O legado dos Trabant

Apesar de ser um carro horrível, possivelmente o pior já produzido em massa, o Trabant ocupa um lugar importante na história. Este é o carro que “conferiu ao comunismo uma má reputação”, um carro tão inferior aos outros veículos produzidos na Europa e nos Estados Unidos que poucos eram capazes de ainda negar os fracassos do sistema. Em resumo, ele se tornou, uma piada.

E sua memória permanece. O Museu Internacional de Espionagem, em Washington, D.C, promoveu recentemente o 13º. Desfile Anual de Trabants para celebrar a queda do Muro de Berlim. Na L'Enfant Plaza, amantes da história, fanáticos por carros e proprietários de Trabants se reuniram para celebrar e “admirar” os 33 mil Trabants que ainda existem.

Que a memória do Trabant viva para sempre.

© 2019 FEE. Publicado com permissão. Original em inglês.

Jonathan Miltimore é editor do FEE.org.

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