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Assentada sobre os pilares das liberdades individuais, de expressão e econômica, a democracia transformou os Estados Unidos numa potência
Assentada sobre os pilares das liberdades individuais, de expressão e econômica, a democracia transformou os Estados Unidos numa potência| Foto: Pìxabay

Um modelo de Estado baseado na liberdade lançou os Estados Unidos ao patamar de maior potência mundial: liberdades individuais, liberdade de expressão e liberdade econômica são o tripé de sustentação do país que, não à toa, é conhecido como a terra da liberdade e da oportunidade.

O lema de “land of the free” [“terra dos livres”] remonta a Francis Scott Key, poeta que escreveu o hino nacional dos Estados Unidos em 1814. A expressão permaneceu como parte do hino nacional americano e tornou-se quase um lema entre os americanos.

Origens 

Apesar de hoje ser a estrutura de governo mais comum, democracia era algo raro na época em que Francis Scott Key escreveu o hino americano: as únicas democracias do mundo eram o próprio Estados Unidos e algumas nações menores no norte da Europa, ainda assim com modelos diferentes do que hoje se considera um regime democrático. O restante da Europa e quase toda a Ásia, África e América do Sul eram governadas por monarquias, aristocracias e regimes coloniais.

Já durante o século 20, os EUA e outras nações (incluindo a Grã-Bretanha, França, Canadá e Austrália) adotaram a causa da liberdade e lutaram para torná-la o padrão internacional de como as nações são governadas.

Os esforços pelas liberdades individuais foram expressos na Carta do Atlântico, proclamada pelo presidente americano Franklin Roosevelt e o primeiro-ministro britânico Winston Churchill em 1941. O documento precedeu a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), sendo uma das origens principais do atual modelo de liberdade nas nações.

Instrumentos próprios 

Por outro lado, a Declaração de Independência e a Constituição dos EUA são os documentos que formalizaram os ideais de liberdade do país. E nenhum documento teve influência maior sobre os cidadãos americanos.

“A Declaração de Independência marcou o nascimento de nossa República e estabeleceu nossos ‘direitos inalienáveis’ à vida, liberdade e busca da felicidade”, afirma o National Center for Constitutional Studies (NCCS). “Esses documentos foram um farol para todos os homens e mulheres que valorizam a liberdade. Eles são tão importantes agora como quando foram escritos”, acrescenta.

A Declaração de Independência, de 1776, marca o rompimento dos Estados Unidos com o reino britânico e a criação de uma nação independente. O documento diz que todas as pessoas são criadas da mesma forma e nascem com certos direitos dados por Deus, incluindo a “vida, liberdade e busca pela felicidade”. Também afirma que os americanos têm o direito de organizar qualquer forma de governo que acreditem proteger melhor suas liberdades.

Este princípio fundamental da formação do país também está na sua Constituição, adotada em 1787 e ainda em vigor, embora tenha sofrido alterações ao longo dos séculos. O documento estabelece todo o sistema de governo: poderes, instituições e atribuições. Esse sistema é sustentado sobre a pedra fundamental de formação da nação: a defesa dos direitos individuais dos cidadãos americanos.

É o primeiro registro na história de um país cujo princípio de governo era defender os direitos que seus cidadãos têm por natureza – ao contrário de governos anteriores, que se baseavam em conceder direitos a uns ou outros.

Terra da liberdade 

Com o mote da terra da liberdade, faz sentido que os Estados Unidos seja o destino de imigrantes há séculos. Entre 1840 e 1914, estima-se que mais de 60 milhões de pessoas deixaram a Europa e tentaram uma nova vida no Novo Mundo. Desse total, cerca de 35 milhões deles foram para os Estados Unidos.

Até o começo do século 20, os Estados Unidos tinham portas abertas para imigrantes, principalmente os europeus, que não precisavam de visto nem passaporte para entrar no país. Também durante a Guerra Fria, os Estados Unidos foram o refúgio de imigrantes e exilados cubanos que desejavam sair da ilha comunista – o processo de migração começou após a Revolução Cubana em 1959, quando Fidel Castro liderou a tomada comunista da ilha e a deposição do regime de Fulgencio Batista. A população cubana nos Estados Unidos cresceu quase seis vezes em uma década, de 79 mil em 1960 para 439 mil em 1970.

Até 2014, os imigrantes de Cuba mantiveram uma posição preferencial exclusiva na lei de imigração dos EUA – medida que foi derrubada pelo governo de Barack Obama. Os cubanos estão entre as dez principais populações de imigrantes nos Estados Unidos desde 1970. Em 2016, os Estados Unidos tinham quase 1,3 milhão de habitantes provenientes do país caribenho.

Uma parcela dessa população chegou ao país ainda criança, durante a década de 1960, na Operação Pedro Pan. O programa do governo dos Estados Unidos abrigou cerca de 14 mil crianças cubanas enviadas pelos pais aos EUA para evitar doutrinação comunista durante os primeiros anos do regime de Fidel Castro.

“Tudo começou depois que Fidel Castro chegou ao poder, inicialmente para crianças cujos pais estavam lutando contra ele, mas foi expandido para todas as famílias cubanas que queriam fugir por medo do futuro sob o novo regime”, explica Steve Velasquez, curador associado da Divisão de Vida Doméstica e Comunitária no Museu Nacional de História Americana do Smithsonian. “Os pais refletem que, na época, enviar seus filhos desacompanhados para os EUA era a melhor coisa que eles podiam fazer por eles”, acrescenta.

Momento atual 

Hoje o país continua recebendo fluxo migratório de todo o mundo. Entre 1990 e 2017, os Estados Unidos receberam 12,7 milhões de imigrantes do México, 2,4 milhões da China, 2,3 milhões da Índia, 1,2 milhões de Cuba, 890 mil do Canadá e 230 mil da Venezuela, segundo dados da Pew Research Center.

“Por que as pessoas vieram para a América e quase sempre ficaram? Simplificando, liberdade individual”, diz Richard Ebeling, o professor de ética e liderança em empresas livres na The Citadel, em Charleston, Carolina do Sul, e autor de “For a New Liberalism” [“Por um novo liberalismo].

“Nos Estados Unidos, muito mais do que na maioria das outras terras no passado e, em muitos casos, até hoje, o político está separado do econômico, do governo e do mercado. Não é que o governo não interfira nas atividades econômicas, mas, durante a maior parte da história americana, o padrão de intervenção política, regulação, controle e restrição foi notavelmente menor do que o praticado em outros países ao redor do mundo”, explica Ebeling.

Pilares 

Um dos pilares da terra da liberdade é justamente o livre mercado. As bases para o livre mercado nos Estados Unidos estão na sua fundação e colonização: na primeira fase de colonização, o país foi povoado por imigrantes britânicos com educação avançada, valores morais cristãos e disposição para empreender.

A busca por lucro, particularmente, foi a principal força motriz da colonização dos Estados Unidos, segundo análise de Joe Carlen no livro “A Brief History of Entrepreneurship” [“Uma breve história do empreendedorismo]. Para Carlen, os EUA se destacam por ser uma “sociedade empresarial por excelência”.

“Outra razão para a prosperidade americana inicial foi que a escassez de população em um vasto território havia aumentado custos da mão-de-obra desde o início da era colonial. No início do século XIX, os salários americanos eram significativamente mais altos que os da Europa. Isso significava que os proprietários de terras, para obter lucro, precisavam de altos níveis de produtividade – e isso, por sua vez, significava a mecanização da agricultura, iniciada nos Estados Unidos antes do exterior”, explica Guy Sorman, autor de “Economics Does Not Lie: A Defense of the Free Market in a Time of Crisis” [A economia não mente: uma defesa do livre mercado numa época de crise].

Sorman afirma ainda que a democracia também incentivou o mercado, com oferta de produtos cada vez mais baratos. “Na Europa, um empresário poderia prosperar servindo a um número limitado de aristocratas ricos - ou mesmo apenas um, desde que fosse rei ou príncipe”, diz.

“Não foi assim nos Estados Unidos, onde os empreendedores tiveram que satisfazer as necessidades de um grande número de clientes que comparavam preços entre vários fornecedores”, completa.

O modelo funciona há séculos. Na década de 1830 a renda per capita americana já era a mais alta do mundo, de acordo com o economista britânico Angus Maddison. Hoje o país ocupa o 13º lugar no ranking de maiores rendas per capita do mundo.

Já o espírito empreendedor está nos documentos de formação do país: a Constituição dos Estados Unidos foi a primeira na história a proteger os direitos de propriedade intelectual. O documento capacitou o Congresso a “promover o progresso da ciência e das artes úteis, garantindo por tempo limitado aos autores e inventores o direito exclusivo de seus respectivos escritos e descobertas”.

O livre mercado, porém, não é mencionado diretamente na Constituição dos Estados Unidos, mas o documento criou um sistema de leis para garantir a liberdade individual e a liberdade de escolha, de acordo com os direitos naturais concedidos pelos fundadores. A partir daí, ele floresceu naturalmente.

“O poder econômico da América está enraizado em uma cultura empreendedora e em uma paixão por inovação e tomada de riscos, características nutridas pelo compromisso da nação com o estado de direito, os direitos de propriedade e um conjunto previsível de políticas tributárias e regulatória”, diz Sorman.

Hoje os Estados Unidos têm uma das economias mais livres do mundo: o país ocupa a 12ª posição no ranking de liberdade econômica, segundo dados da Heritage Foundation. Em comparação, o Brasil está no 150º lugar do ranking. [9]

“É o princípio liberal de que os assuntos econômicos devem estar livres de direção política, o princípio de uma separação completa entre as esferas do governo e da economia. Essa ausência de interferência do governo em grande parte da vida econômica e social se destacou como uma qualidade única para a experiência americana”, diz Richard Ebeling.

Ebeling acredita que o maior perigo atual nos EUA é a mudança ideológica do livre mercado para uma mentalidade que deseja um planejamento político da sociedade baseado em uma política de identidade de raça e gênero.

“É um desagrado e desrespeito pelas ideais de liberdade individual, livre iniciativa e associação voluntária para dignidade humana, melhoria material e harmonia social e paz”, diz.

“Se essas ideias coletivistas triunfarem sobre a tradição individualista sobre a qual os EUA foram fundados e prosperaram, poderá chegar um dia em que a história da América chegará ao fim e o mundo todo será pior por isso”, afirma.

Liberdade absoluta 

Por outro lado, uma das bases para sustentação da “terra da liberdade” é a liberdade de expressão. Nos Estados Unidos, esse direito é garantido pela Primeira Emenda da constituição americana, embora não especifique exatamente o que se entende por liberdade de expressão. A definição de quais tipos de discurso devem ou não ser protegidos por lei recai amplamente nos tribunais – parte do esforço de tornar a constituição simples e concisa.

“O texto da Primeira Emenda é simples, conciso, direto e claro. Enumera cinco liberdades fundamentais - expressão, imprensa, religião, assembleia pacífica e o direito de pedir a reparação de nossas queixas. Para muitos de nós, a liberdade de expressão é primária - a primeira liberdade, sem a qual as outras não poderiam existir”, diz Sanford J. Ungar, diretor do Free Speech Project na Georgetown University.

A origem da Primeira Emenda começa na Convenção Constitucional americana, em 1787, com a visão do presidente James Madison e dos redatores da Constituição que retornaram da Revolução Americana céticos em relação ao poder do governo sobre o povo e à propensão do governo de abusar desse poder, recorrendo à censura ou à aplicação agressiva das leis para punir a expressão ou divergência.

A chave para a liberdade de expressão americana é defender todas as formas de expressão, até mesmo aquelas que causam controvérsia – lá o politicamente correto não é a prioridade, mas sim a liberdade individual.

“É fácil proteger a expressão que não incomoda as pessoas, mas a Primeira Emenda também protege o discurso ofensivo e repugnante”, diz Roy Gutterman, professor e diretor do Centro Tully para a Livre Expressão da Escola S.I. Newhouse de Comunicações Públicas, da Universidade Syracuse. [12]

“Por mais que a Primeira Emenda nos dê o direito de nos expressarmos livremente, o modo como foi redigida limita o poder do governo e o potencial abuso desse poder. A Primeira Emenda é uma declaração às pessoas de todo mundo que os Estados Unidos respeitam nossos oradores e que nosso governo não pode limitar seus direitos”, conclui.

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