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O lucro, que já foi proibido entre os católicos na Idade Média, potencializou o desenvolvimento do capitalismo a partir de uma ética protestante no início da Idade Moderna é hoje, em qualquer orientação cristã, parte fundamental de um costume solidário. Não por coincidência, alguns dos países mais filantrópicos do mundo são de maioria cristã e mais desenvolvidos, segundo ranking Caf World Giving Index 2017, da Charities Aid Foundation, divulgado em setembro.

A organização avalia a média obtida por um país em relação ao percentual mensal de pessoas que costumam ajudar estranhos, doar dinheiro para instituições de caridade e dedicar algum tempo para voluntariado.  Foi analisado o comportamento populacional de 139 países, através de entrevistas realizadas pela Gallup World Poll.

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Entre essas nações que aparecem no topo da lista de mais generosas estão Nova Zelândia, Estados Unidos, Austrália, Canadá, Irlanda e Reino Unido. “Em termos gerais, a filantropia - que etimologicamente se traduz como amor fraterno ao ser humano - remete às práticas individuais ou coletivas que envolvem atitudes de altruísmo e solidariedade. São práticas que, no cristianismo, tornaram-se expressão ética de uma de suas principais virtudes, senão a fundamental: a da caridade”, afirma o professor Bianco Zalmora Garcia, do Departamento de Filosofia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), na área de ética e política.  

Embora não seja exclusiva – porque no ranking, inclusive no topo, há países não cristãos, como Myanmar, Indonésia e Kenya –, a filantropia é inerente ao cristianismo, acrescenta Garcia.

“Hoje, cada vez mais, por coerência, a caridade cristã autêntica implica uma utopia e um compromisso político por uma sociedade fraterna e igualitária. Caridade e fraternidade são indissociáveis no cristianismo desde sua origem. Não há como negar, ao longo da história, que a filantropia - traduzida em atos de caridade - tornou-se prática predominante em contextos cristãos. Inclusive, como exemplo, a forte presença cristã em sociedades ocidentais com graves problemas de exclusão social, de guerras e de miséria, chegou a mobilizar a fundação de congregações religiosas voltadas para a filantropia como exercício da caridade”, ressalta o professor. 

Desenvolvimento

O chefe da Charities Aid Foundation, John Low, pontua que o desenvolvimento dos países também é um fator importante para estimular a cultura de doação. Embora as doações tenham diminuído nos últimos três anos, a prática está se fortalecendo em países mais desenvolvidos e também no continente africano.  “O que é claro é que, em países em desenvolvimento rápido, o potencial de dar está aumentando. Pessoas em todo o mundo estão se tornando empregados, a riqueza está começando a se espalhar, e milhões de pessoas estão desfrutando o aumento da vida padrões e renda disponível”, afirma ele no estudo. 

“Isso poderia gerar vastos recursos para ajudar a resolver os problemas sociais mais intratáveis do mundo, ajudar as pessoas necessitadas, construir verdadeiramente sustentável desenvolver e transformar vidas em todo o mundo”, diz Low.

Entre os 139 países que aparecem no ranking organizado pela organização, o Brasil ocupa a 75° posição com apenas 32 pontos, atrás de Jordânia, Sudão do Sul e Zimbabwe. A situação piora quando comparada entre as populações que mais doam dinheiro, deixando os brasileiros no 85º lugar. Apenas 20% dos entrevistados brasileiros afirmaram fazer trabalhos voluntários (63° posição) e 54% disseram ajudar o próximo (54° posição).

Secularização 

A cultura filantrópica, embora não seja exclusivamente cristã – obviamente outras religiões se fundamentam em valores altruísticos –, tem se enraizado no Ocidente secularizado, na avaliação do professor Bianco Zalmora Garcia. “Penso que estes países estejam incluídos num contexto muito mais amplo: o da cultura ocidental que se desenvolveu sob a influência marcante da tradição cristã. Mesmo sob uma forte tendência de secularização, os valores relacionados à caridade cristã (secularizados) vem sendo incorporados, na forma de filantropia, em ações de solidariedade social e de voluntariado mesmo que não exprimam ou não estejam associados a profissão de uma fé cristã.” 

Dom Geremias Steinmetz, arcebispo de Londrina, acredita que a religião cristã tem uma relação profunda e íntima com a filantropia. “É uma relação essencial, diríamos até umbilical. E os documentos da Igreja ultimamente têm chamado a atenção para essa realidade, de que os cristãos precisam se empenhar para estar presentes na questão da assistência social, se organizando para ajudar quem precisa”, ressalta. Até porque, segundo o arcebispo, o Evangelho de Cristo é dedicado aos pobres. 

Em junho deste ano, o próprio papa Francisco, atento a essa realidade, publicou uma mensagem e decretou o dia 19 de novembro como o Dia Mundial dos Pobres, com o tema “não amemos com palavras, mas com obras”. 

“Que este novo Dia Mundial se torne, pois, um forte apelo à nossa consciência crente, para ficarmos cada vez mais convictos de que partilhar com os pobres permite-nos compreender o Evangelho na sua verdade mais profunda”, diz o papa Francisco, no documento.  

 

Cobrar impostos 

É impossível quantificar o tanto de projetos sociais mantidos por igrejas e paróquias em cidades, nos estados e no país. Mas o número de ações solidárias e filantrópicas mantidas pela Igreja Católica, entre outras religiões cristãs, é tão grande que compensa o não pagamento de impostos, segundo o arcebispo Dom Geremias. “Se o governo fosse cobrar impostos da Igreja e a Igreja fosse cobrar todo serviço que ela presta aos brasileiros, teríamos uma diferença de um para seis: para cada R$ 1 que o governo deixa de cobrar, a Igreja devolve R$ 6 em serviço aos pobres”, avalia o arcebispo, ao pontuar que isso inclui áreas como saúde, educação, alimentação, assistência a doentes.

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