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Ao buscar ajuda para a filha autista que se dizia menino, Sarah se viu sem opções, porque os terapeutas insistiam na transição para o sexo oposto.
Ao buscar ajuda para a filha autista que se dizia menino, Sarah se viu sem opções, porque os terapeutas insistiam na transição para o sexo oposto.| Foto: Pixabay

Esta é a experiência de apenas uma das mães norte-americanas cuja família navegou pela jornada trans nos últimos anos.

Para proteger a identidade da criança, serei deliberadamente vago quanto aos lugares e outros detalhes. Mas a família estava vivendo numa das maiores cidades dos Estados Unidos e só recentemente se mudou para um lugar mais agrário. Foi lá que conversei com a mãe da criança, a quem chamarei de Sarah.

Sarah é, em todos os aspectos, uma simples mãe de classe média. Ela cuida das crianças e o marido trabalha para sustentá-los. Ela descreve sua afiliação política como “ligeiramente à esquerda”. Há quatro anos, sua filha de 13 anos anunciou que era trans e que na verdade era um menino.

A filha já tinha sido diagnosticada com uma forma amena de autismo e tinha problemas para ser aceita por alguns de seus coleguinhas. Ela tinha problemas para entender sinais simples. Os convites para brincadeiras não eram respondidos e as roupas que ela usava não eram consideradas as melhores por suas amigas.

Em pouco tempo a filha de Sarah percebeu que os meninos da escola eram ligeiramente mais amigáveis do que as meninas. Mas mesmo assim que ela não conseguiu a aceitação que tanto queria.

“Por que ninguém gosta de mim?”, perguntava ela o tempo todo para a mãe. Tentando entender por que ela “não se dava” com as meninas, ela também tentava descobrir por que não se dava com seus colegas em geral.

Até que um dia ela anunciou para a mãe que na verdade era menino e que essa era a causa de seus problemas.

Sarah lhe perguntou o que a fez pensar que era trans. Afinal, para sua família tudo parecia repentino demais. A filha disse que ela teve a ideia depois de uma apresentação na escola.

Neste ponto vale dizer que cerca de 5% das crianças na escola da filha hoje se identificam como transgêneros. São crianças bastante diferentes, entre elas crianças que foram diagnosticadas com autismo e com um histórico de introspecção e de impopularidade entre os colegas.

Claro que a mãe da menina agora queria saber mais. Se não houvesse outras crianças na escola que se identificavam como trans, será que ela teria chegado à conclusão de que era menino? A filha de Sarah disse que não, ela não teria chegado a essa conclusão porque “não teria como saber que era uma opção”.

Não que ela pensasse ser um menino; ela era um menino. E mais, sua mãe não seria capaz de compreender isso, porque ela era “cis”.

Sarah nunca tinha ouvido a palavra “cis antes” e nunca tinha sido descrita dessa forma. A filha de Sarah disse à sua mãe repetidas vezes que “as crianças trans sabem quem são”.

Mas Sarah ofereceu apoio à filha. Ela concordou em chamar a filha por seu nome masculino e começou a se dirigir a ela usando o pronome masculino. Ela até passou a apresentá-la aos amigos como “seu filho”.

Tentando dar o máximo de apoio possível, mãe e filha até foram a uma manifestação “pelo orgulho trans” juntas e dançaram ao som de “Born This Way”, de Lady Gaga.

Sarah apoiava tanto a filha que até comprou o primeiro sutiã de que a filha precisou para esconder seus seios em desenvolvimento. Não havia nada mais para a mãe fazer.

Ao mesmo tempo, e compreensivelmente, Sarah começou a ler sobre o tema dos transgêneros. Era um assunto novo para a vida de sua família e ela queria obter várias opiniões a fim de chegar a uma conclusão própria.

Pelo que a própria Sarah diz, sua primeira impressão quanto ao debate online não foi das melhores. Boa parte do pensamento crítico estava, pensou ela, marcada por um sentimento “anti-LGBT”. As pessoas que escreviam sobre o assunto parecem, de acordo com a descrição dela, “preconceituosas ou religiosas”.

Ela nunca tinha explorado nenhum assunto com tanta profundidade. Ela só estava preocupada a filha. E assim Sarah foi conversar com alguns profissionais — a começar por alguns médicos especialistas em gênero.

O primeiro lhe disse algo que ecoa o que outras pessoas em sua posição já tinham ouvido. O médico lhe disse que “a aceitação parental era o primeiro passo para se evitar o suicídio”.

E, para qualquer pai ou mãe, isso era a ameaça do maior pesadelo imaginável. O médico também disse a Sarah que, como sua filha tinha sido “insistente, persistente e consistente” em suas afirmações, isso queria dizer que sua filha era de fato menino.

Sarah não estava só preocupada com o que os profissionais lhe diziam; ela também estava preocupada com o que sua filha lhe dizia. Sempre que a filha de Sarah descrevia sua disforia de gênero, sua mãe notava que as palavras pareciam “roteirizadas”.

E dizer que o roteiro era manipulador é menosprezar o problema. Em certo momento sua filha fez uma lista de exigências que incluíam chantagens e ameaças, a não ser que fossem cumpridas.

A filha de Sarah tinha 13 anos e meio quando anunciou ser trans. Aos 14 anos e meio, ela começou a ir a um terapeuta. Aos 15 lhe disseram que ela deveria começar a tomar o bloqueador de puberdade Lupron.

Em todos momentos enfatizava-se que era “um insulto” por parte de sua mãe questionar os sentimentos da filha, e isso servia tanto para trans quanto para autistas.

“Autistas sabem quem são”, tranquilizaram-na. Questionar até isso era um absurdo. Vários terapeutas foram consultados, até que mãe e filha voltaram ao primeiro.

Quando Sarah expressou sua preocupação quanto às opções dadas à filha, sobretudo a ideia de a menina começar a tomar bloqueadores de puberdade, disseram-lhe: “Você pode escolher entre os bloqueadores de puberdade e o hospital”.

E assim, aos 17 anos e meio, a filha de Sarah disse que queria “fazer a transição”.

Claro que Sarah perguntou à filha se ela queria mesmo fazer isso. Ela reforçou o caráter irreversível do caminho que a filha estava trilhando.

Ainda mais irreversível do que os hormônios era a transição. E se — Sarah perguntou à filha — depois de optar pela transição ela mudasse de ideia? E se depois da mudança ela decidisse que não queria mais?

A resposta da filha foi “Que se dane. Vou me matar”.

Embora nenhum pai ou mãe deva ignorar esse tipo de ameaça, parece haver um padrão nisso, como [a escritora] Germaine Greer dizia. E não apenas em jovens, mas também em alguns profissionais da saúde que defendiam um lado da história.

Por exemplo, em 2015 Michelle Forcier, médica, professora da Brown University e diretora dos Serviços de Saúde Sexual e de Gênero no Grupo Médico Lifespan, em Providence, Rhode Island, foi entrevistada pela rede norte-americana NBC.

Quando lhe perguntaram se crianças de 3 ou 4 anos eram capazes de saber o que queriam, Forcier respondeu: “Dizer que crianças de 3 ou 4 anos não compreendem o gênero é não dar crédito a seus filhos”.

Quando lhe perguntaram qual o problema de se esperar para se submeter à transição, ela respondeu: “Nada mais nocivo do que não fazer nada”.

Mas qual era o risco de se esperar?, perguntaram.

A resposta dela foi: “O risco do suicídio. O risco da fuga. O risco do vício em drogas. O risco de sofrer bullying e violência. O risco de depressão e ansiedade”.

Joel Baum, diretor do grupo Gender Spectrum, foi ainda mais enfático. A pais que temem aceitar que os filhos comecem a tomar hormônios, ele disse: “Vocês podem ter netos ou deixar de ter filhos, seja porque eles deixaram de falar com você ou, em alguns casos, porque eles escolheram um caminho muito mais perigoso para si mesmos”.

O problema de se apresentar as alternativas assim — da forma mais catastrofista possível — é que ela não abre espaço para a discussão e discordância.

Em vez disso, assim que uma criança diz que acha que pode ser do sexo oposto, elas devem receber apenas aceitação e, a partir daí, com um conjunto de etapas que mudarão sua vida, etapas que um grupo cada vez maior de profissionais parece querer estimular com a menor resistência possível.

Mas histórias como a da filha de Sarah estão cheias de reviravoltas. A filha de Sarah admite que ela talvez jamais tivesse cogitado a hipótese de ser menino se não houvesse outros alunos na escola dizendo a mesma coisa.

Tudo isso nos traz ao problema crucial.

Ainda que haja pessoas que realmente sofram de disforia de gênero, e ainda que para algumas delas a cirurgia seja a melhor alternativa, como diferenciá-las de pessoas pressionadas a cogitar a ideia de serem transgêneros e que mais tarde percebem que tomaram a decisão errada para si mesmas?

Entre os mais absurdos e usados argumentos para não se impedir a atual onda trans é a possibilidade de uma avalanche de processos. Ainda que o Reino Unido, incluindo o National Health Service, tenha corrido este risco, o potencial de sucesso de ações deste tipo não se compara ao potencial nos Estados Unidos.

Enquanto o serviço de saúde britânico se esforça para satisfazer uma demanda cada vez maior de cirurgias de mudança de sexo, nos Estados Unidos isso não é apenas um movimento; há um verdadeiro incentivo financeiro para se promover isso.

Um dos sinais de que no mundo trans as exigências sociais estão começando a atrair oportunidades de negócios está na extraordinária leviandade com que os ativistas — incluindo cirurgiões — hoje falam de cirurgias capazes de mudar a vida de uma pessoa. Alguns desses argumentos são de virar o estômago.

Este trecho foi tirado do livro “The Madness of Crowds: Gender, Race and Identity” [A loucura das massas: gênero, raça e identidade] e publicado com permissão.

Douglas Murray é editor do Spectator e autor de vários livros.

© 2019 The Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês
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