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Registro do único debate entre Carter e Reagan, realizado em outubro de 1980 e considerado fundamental para a eleição do republicano.
Registro do único debate entre Carter e Reagan, realizado em outubro de 1980 e considerado fundamental para a eleição do republicano.| Foto: EFE/UPI

O empreendedor britânico Steven Barlett garante que "O Diário de um CEO: 33 Leis para os Negócios e a Vida" (editora Sextante) não é um livro sobre estratégias.

Segundo ele, "estratégias mudam todos os anos", e seu objetivo é transmitir conhecimentos permanentes no campo das boas práticas. Para isso, recorreu a estudos científicos, entrevistas e fatos históricos — como o debate que, de acordo com especialistas, levou o republicano Ronald Reagan à presidência dos EUA em 1980.

No trecho a seguir, Barlett usa o exemplo de Reagan para ensinar que uma simples pergunta pode trazer resultados surpreendentes.

Estamos no ano de 1980, nos Estados Unidos. Ronald Reagan é candidato à presidência contra Jimmy Carter, que tinha sido eleito em 1976. A situação econômica vai de mal a pior, e Reagan precisa convencer os eleitores de que é hora de tirar Carter da Casa Branca.

Na última semana da campanha presidencial, no dia 28 de outubro, os dois candidatos realizaram o primeiro e único debate na TV, e 80,6 milhões de espectadores os acompanharam – tornando aquele o debate mais assistido da história dos Estados Unidos até então.

Segundo as pesquisas, no dia da transmissão o presidente Carter estava oito pontos percentuais à frente de Reagan. Reagan sabia que precisava usar o péssimo desempenho econômico do adversário contra ele, porém, em vez de seguir o que todo candidato à presidência antes dele tinha feito e apresentar esses fatos, ele optou por algo inovador, mas que passou a ser adotado a partir de então.

Ele fez uma pergunta simples, mas lendária: “Você está melhor agora do que quatro anos atrás?”. Reagan disse:

“Na próxima terça-feira, todos vocês irão às urnas, farão fila nas seções eleitorais e vão tomar uma decisão. Acho que nessa hora o ideal seria perguntar a si mesmo: você está melhor agora do que estava quatro anos atrás? Está mais fácil comprar as coisas hoje do que há quatro anos? Há no país mais ou menos desemprego do que havia quatro anos atrás? Os Estados Unidos continuam sendo respeitados no mundo inteiro? (…) E se responder ‘sim’ a todas essas perguntas, então acho que não há dúvidas sobre o candidato em quem você deve votar”.

Uma enquete realizada pela ABC News logo depois do debate recebeu cerca de 650 mil respostas – e quase 70% dos espectadores disseram que Reagan tinha se saído melhor no debate. Sete dias depois, em 4 de novembro, Reagan derrotou Carter por 10 pontos de diferença, uma vitória esmagadora e histórica que o tornou o quadragésimo presidente dos Estados Unidos.

Foi só uma pergunta? Não, foi magia política respaldada pela ciência. Por quê? Perguntas, ao contrário de afirmações, provocam uma resposta ativa, ou seja, fazem as pessoas pensarem.

É por isso que pesquisadores da Universidade do Estado de Ohio concluíram que, quando é evidente que os fatos estão do seu lado, perguntas tornam-se extremamente mais eficientes do que simples declarações.

O poder do efeito pergunta/atitude

Todos nós assumimos compromissos que não conseguimos cumprir. Quantas vezes você disse “Este ano vou comer melhor” ou “Esta semana vou malhar todos os dias” e acabou não realizando o planejado?

É óbvio que nossa intenção é fazer tudo, mas boas intenções não são suficientes para gerar mudanças significativas. Uma pergunta bem-feita, porém, pode bastar.

Depois de esquadrinhar mais de cem estudos que abarcam 40 anos de pesquisas, uma equipe de cientistas de quatro universidades americanas descobriu que, quando se trata de influenciar o comportamento nosso ou o de outras pessoas, é melhor perguntar do que mandar.

David Sprott, um dos coautores da pesquisa na Universidade Estadual de Washington, afirma: “Quando você questiona uma pessoa sobre a tomada de uma atitude futura, a probabilidade de que essa atitude se concretize muda”.

Perguntas geram uma reação psicológica diferente da produzida por declarações. Isto significa, por exemplo, que um cartaz com os dizeres “Recicle, por favor” tem uma efetividade muito menor do que “Você vai reciclar?”.

Dizer a si mesmo “Hoje eu vou comer verduras” funciona muito menos do que fazer a si mesmo a seguinte pergunta: “Hoje eu vou comer verduras?”.

Surpreendentemente, os pesquisadores concluíram que transformar uma declaração em uma pergunta pode influenciar o comportamento da pessoa por até seis meses. O efeito pergunta/atitude é ainda mais poderoso quando a pergunta só pode ser respondida com sim ou não.

Chega ao ápice com perguntas usadas para estimular atitudes que condizem com as ambições pessoais e sociais do destinatário (ou seja, quando responder “sim” o aproxima de quem ele quer ser).

Começar a pergunta com “você vai” sugere responsabilização e ação e intensifica ainda mais o efeito pergunta/atitude do que começar o questionamento com palavras como “você pode” ou “você poderia”, que dão a entender que a questão tem mais a ver com capacidade do que com ação.

Essa construção também é mais forte do que uma que comece com “você faria”, que é condicional e indica mais possibilidade do que probabilidade.

Como usar a dissonância cognitiva a seu favor

“Dissonância cognitiva” é o desconforto mental que você sente quando sua melhor versão – a pessoa que você quer ser – não corresponde à pessoa que você é no momento.

Digamos que você seja aspirante a mestre de tai chi chuan e que um amigo lhe pergunte se você pratica todos os dias. Responder “não” criaria uma dissonância cognitiva, pois chamaria a atenção para uma incompatibilidade desconcertante entre quem você quer ser e quem você de fato é.

Para se livrar desse descompasso, é provável que você responda sim. E, tendo feito isso, aumenta a probabilidade de sua aspiração se tornar realidade, porque a pergunta não apenas lhe lembrou de quem você quer ser, mas da trajetória necessária para se tornar essa pessoa, e você estabeleceu uma intenção de seguir essa trajetória – tudo sob a forma de uma curta mas poderosa pergunta.

Isso funciona com ainda mais eficiência quando se responde a uma pergunta “sim ou não” porque essas escolhas binárias não dão margem a justificativas e desculpas – duas coisas que nos permitem fugir da realidade de quem desejamos ser e do que precisamos fazer para chegar lá.

Caso tenha lido meu primeiro livro, você já sabe que minha maravilhosa assessora pessoal, Sophie, adora anunciar todas as semanas que vai voltar para a academia “na segunda que vem”.

Às vezes, quando tenho a ingenuidade e a credulidade de lhe perguntar se ela cumpriu o prometido, Sophie responde com uma justificativa longa e detalhada explicando por que não conseguiu, seguida de um novo anúncio de que na semana seguinte, com certeza, ela irá. Já faz oito anos que ela faz a mesma coisa.

A melhor coisa de uma pergunta “sim ou não” é que ela não lhe dá nenhum espaço para enganar a si mesmo. Ela força você a se comprometer, de um jeito ou de outro. Portanto, se você começar a dar desculpas pelo seu comportamento ou quiser dar sermão em alguém sobre como deve agir, experimente fazer o seguinte: faça a si mesmo, ou à outra pessoa, uma pergunta simples que só possa ser respondida com “sim” ou “não”.

Funciona bem mesmo quando o questionamento é focado em uma área em que uma motivação a mais seria bem-vinda. “Vou à academia hoje?” “Peço comida saudável para o almoço?” Não dê espaço para explicações. Apenas “sim” ou “não”.

Recentemente, saí para dar uma corrida perto da casa da minha namorada, na cidade do Porto, em Portugal. É uma região conhecida pelas ladeiras íngremes, e conforme me aproximava de um morro ainda mais desafiador, tão íngreme que parecia quase vertical, o efeito pergunta/atitude me salvou.

Perguntei a mim mesmo: “Você vai continuar correndo até chegar ao alto da ladeira?” Respondi a mim mesmo: “Sim.” Não tenho como explicar, mas por algum motivo aquilo me ajudou de verdade, e consegui chegar ao topo sem precisar parar no caminho.

A resposta matou qualquer desculpa possível que eu poderia ter usado para interromper a corrida, criando uma promessa a mim mesmo que eu não queria descumprir.

Utilize o efeito oergunta/atitude para ajudar os outros. Pergunte a um amigo ou à pessoa amada: “Você vai adotar uma dieta mais saudável?” ou “Você vai pedir para ser promovido?”. Já foi provado inúmeras vezes esse tipo de desafio gentil leva a mudanças significativas e duradouras e incentiva as pessoas a serem a melhor versão de si mesmas.

Use isso no trabalho. Se você for um garçom servindo uma mesa de clientes bem-humorados, em vez de dizer a eles “Espero que tenham gostado” ao tirar os pratos, pergunte “Que tal a comida?” bem na hora em que estiver entregando a conta, logo antes de eles decidirem quanto dar de gorjeta.

Como nos ensinou o presidente Reagan, quando é evidente que os fatos estão do nosso lado, perguntas se tornam ferramentas extremamente poderosas para incentivar o comportamento que você deseja.

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