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Prorrogação subsídios Zona Franca de Manaus
Prorrogação da política de subsídios para a Zona Franca de Manaus deve custar R$16 bilhões à União| Foto: AFP PHOTO/Mauricio LIMA

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de ampliar os benefícios fiscais para a Zona Franca de Manaus (ZFM) foi baseada na Constituição de 1988, mas custará caro para todos os brasileiros que não moram na capital amazonense.

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Por 6 votos a 4, o plenário da corte decidiu que empresas que atuam fora de Manaus, mas que compram insumos isentos de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na ZFM, terão um novo benefício: elas poderão contabilizar o valor desse IPI a título de crédito tributário, como se tivessem arcado com a tributação. Estima-se que a decisão tenha um impacto financeiro de ao menos R$16 bilhões por ano, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).

A Zona Franca de Manaus foi criada em 1957, com a finalidade de desenvolver economicamente um estado desfavorecido por seu tamanho, isolamento e falta de infraestrutura. A partir daí, as indústrias que optaram por se instalar na região amazônica passaram a receber diversos benefícios fiscais. Entre eles, isenção de imposto de importação e exportação, isenção de IPI, alíquota menor de imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS) e isenção de IPTU nos primeiros anos da abertura. A política de subsídio, contudo, é contestada por distorcer o sistema de preços.

Segundo o economista e colunista da Gazeta do Povo Pedro Menezes, quando se criam subsídios os preços deixam de responder a condições de mercado, a fatores de produção e de produtividade, e sim a uma legislação.

“Com as distorções provocadas (por uma política de subsídios), os incentivos podem ficar um pouco bizarros: uma empresa que visa os consumidores paulistas vai para quase 4 mil quilômetros de distância deles porque na ZFM ficará mais barato produzir. Os incentivos dos sistemas de preços ficam distorcidos, passa-se a tomar decisões de produção que não necessariamente refletem os fatores de produção”, diz.

Ele complementa afirmando que, para alguém ser subsidiado, outros precisam pagar por isso. “Se um grupo contribuirá menos para a receita pública, haverá uma desvantagem de um grupo para outro”.

A consequência disso, segundo o economista Marcos Lisboa, é “tornar o Brasil um lugar mais pobre”. Ele defende a extinção da Zona Franca de Manaus ou, ao menos, um modelo para substituí-la.

“A Zona Franca vai contra a vocação econômica da região e tem impactos limitados na economia local. Deveríamos estar concentrados, além do potencial do turismo, nas riquezas da área, desenvolvendo pesquisas e produtos nativos, tocados por nativos. E não em levar fábricas para a floresta que não produzem nenhum parafuso lá”, afirma.

Outra consequência desse modelo de desenvolvimento é que, enquanto a União oferece às empresas localizadas nas zonas francas facilidades e isenções, todo o restante do empresariado nacional precisa arcar com uma via crucis tributária e burocrática.

O custo X o benefício da Zona Franca

Menezes afirma que, além do custo das políticas de subsídios, muitas vezes o impacto dessas políticas não é bem estimado, isto é, não se analisam os custos e os benefícios das medidas. Parece ser o caso da Zona Franca de Manaus.

Segundo a Superintendência da Zona Franca de Manaus, a renúncia fiscal das empresas instaladas na região corresponde a 8,43% do total de toda a renúncia nacional. "Em 2018, pelo menos 91,47% da renúncia fiscal brasileira ficou fora da Amazônia Ocidental", afirmou a entidade em nota. Não são valores desprezíveis.

Em 2018, o Tribunal de Contas da União (TCU) produziu auditoria sobre a ZFM e concluiu que, anualmente, os subsídios custam cerca de R$ 25 bilhões ao governo federal. Só de renúncia de IPI, o montante foi de R$ 105,2 bilhões entre 2014 e 2017. Considerando que o déficit fiscal da União em 2018 foi de R$ 120,3 bilhões, quase 90% de todo o desequilíbrio orçamentário atual estaria resolvido sem a ZFM.

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Vale ressaltar que, de acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional, em 2018 todos os investimentos públicos em infraestrutura (como rodovias, portos e aeroportos) somaram R$ 27,875 bilhões. Isto é, o subsídio dado apenas a ZFM é semelhante a todo investimento em infraestrutura do governo federal no país inteiro.

Acadêmicos apontam que, para se instituir uma política de subsídio, é preciso haver estudos prévios e posteriores a fim de medir seus efeitos. No entanto, esses estudos não foram feitos concomitantemente às propostas parlamentares para a criação da Zona Franca de Manaus em 1957, tampouco em 2014.

Um estudo publicado neste mês de maio por pesquisadores da Universidade de Brasília analisou os efeitos dos subsídios na Zona Franca de Manaus. O período verificado foi entre 2002 e 2014 e comparou a região com o restante do país em relação a vários indicadores. A pesquisa não encontrou efeitos positivos no PIB, na renda e tampouco na arrecadação tributária no Amazonas.

Que tal tornar o Brasil inteiro uma Zona Franca?

Diante disso, o que fazer para substituir a jabuticaba que se tornou a ZFM?

“Há modos mais inteligentes de fazer uma política regional, como investimentos em infraestrutura e em educação de base. Se queremos desenvolver norte e nordeste, seria mais inteligente se gastássemos mais em infraestrutura nessas regiões. Traria benefícios maiores visando o longo prazo. Se a política de subsídio acabar, o que restará de Manaus?”, questiona Menezes, se referindo ao fato da ZFM não ter criado raízes para um desenvolvimento sustentável.

No ranking de liberdade econômica, publicado com exclusividade pela Gazeta do Povo, o Brasil encontra-se apenas na 150º posição entre 186 países. Já no ranking mundial de competitividade o Brasil está na 61º colocação entre 63 países estudados. Enquanto na ZFM paga-se menos impostos de importação, há uma espécie de muralha comercial no restante do país, a um custo anual de R$130 bilhões para o bolso dos consumidores brasileiros.

A despeito de os parlamentares brasileiros terem prorrogado em 2014 os benefícios fiscais para a Zona Franca de Manaus até 2073, eles se recusam a estender essas mesmas condições ao restante do território nacional. Muito além do controverso modelo de subsídio para Manaus, é patente a necessidade de transformar todo o país em uma zona econômica especial, com baixos impostos e liberdade econômica, a fim de haver maior produtividade e desenvolvimento competitivo em todo o país.

O resultado seria tornar a Zona Franca de Manaus desnecessária.

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