As instruções para chegar no escritório central mundial do Roger Stone - onde acontecem teorias da conspiração e autopromoção - são tão confusas e misteriosas como ele. A primeira versão, enviada por Stone por mensagem de celular, leva a um estacionamento deserto perto de uma construção vazia em Oakland Park, ao norte de Fort Lauderdale. Um lugar chamado Scandals Sallon fica do outro lado da rua, mas a verdade é que Stone mandou o endereço errado.
"Bom, você vai ter matar o lide", disse o homem que sabe o suficiente sobre essa dança com a profissão de jornalista para reconhecer o que poderia ter sido um detalhe sonoro no primeiro parágrafo. Afinal de contas, Stone raramente encontrou um escândalo com o qual não pudesse se enroscar e adorar.
A próxima parte das instruções para seu escritório pessoal e estúdio de transmissão pede que se encontre uma "porta discretamente marcada com um 'A'", o que pode ser útil, exceto pelo fato crucial que não há uma porta marcada discretamente com um "A" no endereço novo, próximo de um depósito de suprimentos para banheiro. Há, porém, uma porta pintada de preto com nenhuma marca, de onde sai um homem vestido com bermudas, tênis sem meia, uma gravata com nó solto e uma camisa branca - Stone, inequivocamente.
"O que aconteceu com nosso 'A'?", ele chama atenção de duas jovens assistentes. Do lado de dentro, Stone tem um bongo com o formato da cabeça de Richard Nixon e um desenho enquadrado de um rolo de papel higiênico com o rosto de Nixon em cada folha.
"P.S.: Eu não tenho clientes chatos"
No começo da década de 70, Stone se tornou um mestre da arte da política das trevas, se intrometendo sorrateiramente com os democratas, como parte do Comitê de Reeleição de Nixon como presidente, apelidado de CREEP. Depois disso, trabalhou como consultor político, lobista e estrategista, normalmente para candidatos republicanos.
Mais de quatro décadas e meia depois, Stone ainda gosta de acreditar que é um homem operando nas sombras. "P.S.: Eu não tenho clientes chatos", diz ele uma das noites, sem dizer nomes ou explicar exatamente o que faz. Mas o escritório desse parceiro do Presidente Donald Trump também está movimentado com os recentes acontecimentos políticos.
Uma pessoa comum pode achar perturbador que o Congresso americano esteja ameaçando trazê-lo antes do comitê investigar a possível participação russa na eleição presidencial de 2016. Mas Stone quer revelar tudo.
"Eu quero ser chamado", disse Stone, 64 anos, durante um jantar. "Eu só quero uma chance justa de contar o meu lado da história".
Criando presidentes
Stone desconsidera um de seus maiores perseguidores, o ex-promotor público e congressista democrático pela Califórnia Adam B. Schiff, por ser "muito cheio de si mesmo". Stone está pensando em processar Schiff por difamação, ainda que a imunidade congressional faça com que essa ação seja quase impossível.
Schiff é, de um certo sentido, um relações públicas fantástico e acidental de Stone. A atenção do Congresso não poderia ter vindo em um melhor momento para Stone, que lança o livro "The Making of the President 2016" (O Making of do Presidente de 2016) e é personagem do documentário "Get Me Roger Stone", lançado pela Netflix.
Stone é um autor prolífico, apresenta um programa de rádio, tem um site (stonecoldtruth.com) e nunca desapareceu da vida política. Ele tem falado sem parar por décadas, apontando um dedo acusador a Lyndon Johnson alegada cumplicidade com o assassinato de Kennedy, fuçando nos casos extraconjugais de Bill Clinton e chamando os Bush de "família do crime". A diferença é que agora tem mais gente ouvindo.
“Só ataca russos”
O estúdio dele — uma espécie de caverna assombrada repleta de memorabilia do Nixon e livros de conspiração do chão ao teto — foi equipada com luzes e áudios profissionais pelo neto de 19 anos de Stone, Nick.
A porta abre e entra uma mulher com roupas de academia com uma Yorkshire terrier de apenas nove meses de idade chamada Mimi. "Ah, Dona Stone!", fiz Roger Stone.
Mimi puxa sua coleira e se contorce. "Ela normalmente só ataca russos", brinca Stone.
Stone conheceu sobre mulher america-cubana, Nydua, durante uma das campanhas presidenciais de Ronald Reagan, quando ela trabalhava como fotógrafa. Em uma polaroid colada no monitor de seu computador, o futuro casal era esguio e estiloso com um bronzeado típico dos anos 80.
Mas Stone não tem tempo para recordar. Ele tem uma entrevista em breve, mas não sabe quem é o apresentador.
"De onde ele é?", pergunta Stone.
"Acho que de Minnesota", responde John, motorista e assistente de estúdio.
"Acho que é sueco", diz Stone.
Acaba não sendo nenhuma das opções. O programa é apresentado por Stefan Molyneux, um canadense nascido na Irlanda.
"Todos os dias são assim. Todos", conta a esposa de Stone com um suspiro e um sorriso. "Já fiquei surda de tanto ouví-lo".
Sob vigilância
Stone acha que o Google e outras empresas de internet estão tentando derrubar seu negócio bloqueando o tráfego ao seu site, que caiu drasticamente. "Eu não ganho milhões de dólares. Mas é um dinheiro bom", diz. Ele acredita estar sob vigilância de investigadores federais. Suas evidências são uma matéria do New York Times que diz que ele era escrutinado por possíveis relações com a Rússia e algumas reportagens sobre comunicações privadas que ele acredita terem sido vazadas por alguém do governo.
Ele pensa, ainda por cima, que alguém está tentando assassiná-lo — seja por envenenamento, seja por um atirador em um carro (ele sofreu um acidente de carro recentemente, quando foi fechado por um carro com vidros escuros que saiu disparado logo depois da colisão). "A lista de suspeitos seria infinita", afirma.
Se beber, não tuíte
Um santuário budista, conhecido como butsudan, fica na sala do bangalô de Stone em um canal em Fort Lauderdale. Nydia, cujo pai era um preso militar nos EUA antes do regime de Batista ser derrubado por Fidel Castro, hospeda encontros budistas no local.
"Eu canto para que a natureza budista de Roger apareça", ela diz.
Mas a efetividade disso é aberta a interpretação. Em seu livro, Stone chama o Senador Ted Cruz, eleito pelo Texas, "um patife" e "o mentiroso mais prolífico que já tentou a presidência". Ele frequentemente participa de tiradas injuriosas no Twitter. Stone assume que adquiriu uma tendência ao longo dos anos de beber enquanto twitta. "Dois martinis", diz ele. "Sou fraquinho".
No ano passado, ele foi banido da CNN depois de chamar a comentadora Ana Navarro de "uma p---a de uma diva com diploma" no Twitter. Ele também disse que ela era "gorda e estúpida". Em 2012, ele disse que o apresentador liberal Roland Martin é "um negro estúpido".
Stone diz que se arrepende dos comentários sobre Martin e lembra do discurso que fez pedindo para republicanos melhorarem seu alcance a afro-americanos. Mas ele não planeja aliviar para Navarro, vice-presidente do Conselho Consultivo Hispânico do então candidato à presidência John McCain, por achar que ela se aproveita demais de suas credenciais de "estrategista republicana".
Navarro não respondeu um pedido de entrevista. Martin chamou Stone de "criança superficial, petulante e racista". "A mídia", disse Martin, "tem a tendência de dizer que ele é peculiar, diferente. Não, ele é racista e machista".
50 ternos de inverno
Por anos, Stone manteve residências na Flórida e em Nova York, onde aluga um apartamento pequeno no Harlem. Na Flórida, ele costumava viver em South Beach, mas se cansou do barulho e se mudou para Fort Lauderdale, onde seu enteado é o vice-xerife.
O casal compartilha a casa com dois Yorkies — Mimi e Max que, com seus 16 anos, está cego, incontinente e quase surdo — e um ex-piloto de 80 anos de idade que tem câncer e precisava de um lugar para ficar. Caixas ocupam a sala, porque os Stones tiveram problemas com o proprietário da casa e estão no processo de mudança para outro lugar. A casa é cheia de móveis pesados de art deco, complicando a vida do neto de Stone, que está carregando tudo em uma picape estacionada ao lado do Jaguar XKR de Stone.
Stone, um acumulador de objetos nato, diz ter 50 ternos de inverno e 20 de verão, todos feitos sob medida. Em seu home office, cerca de uma dúzia de chapéus ficam em estruturas com formato de cabeça normalmente usados para perucas.
“ Concordar em não respirar”
Stone começou a trabalhar na campanha de Trump, mas não durou muito: foi ou demitido (versão de Trump) ou se demitiu (versão de Stone), mas continuou em contato como um conselheiro informal e promotor energético, fazendo contato entre Trump e o conspirador teórico Alex Jones (do infowars.com). Stone conta que, quando saiu, a campanha tentou fazer com que assinasse um contrato de confidencialidade que o impediria de conversar com repórteres.
"Eu teria que concordar em não respirar", ele conta.
A verdade é que jornalista voaram em bando para cima de Stone, em parte porque ele fala a mesma língua que eles e é fácil de citar. Ele sempre referência suas "fontes", se ocupando recentemente em atormentar a Casa Branca quanto ao uso de drogas.
O caos de empacotar uma casa cheia não distrai Stone. Afinal de contas, o Hollywood Reporter está no telefone, fazendo perguntas sobre a première do documentário.
"Eu tenho dois tickets", Stone conta. Um para si mesmo e outro para um "advogado liberal".
Conexão russa
Entre ligações, Stone faz a transcrição de uma fala de Schiff, o congressista da Califórnia, em um inquérito do mês passado sobre emails hackeados, vazado pelo WikiLeaks. Stone despertou a atenção de Schiff ao se vangloriar por ter contato com Julian Assange, o fundador do WikiLeaks (Stone agora afirma que era uma comunicação pelos bastidores, mediada por um jornalista).
Schiff questionou as mensagens diretas entre Stone e "Guccifer 2.0", um usuário do Twitter que é avaliado pela inteligência americana como parte da inteligência militar russa, conhecida como GRU. A suspeita é que as mensagens tenham alguma relação com uma suposta participação da Rússia na campanha presidencial americana.
Em sua escrivaninha, Stone lê a transcrição em voz alta.
"Schiff: O sr. Stone estava em comunicação direta com um indivíduo da GRU russa, Guccifer 2.0". Stone lê com um tom irônico.
"Não, eu não admito isso! Errado!", diz Stone com uma voz acusativa, como se Schiff estivesse no mesmo cômodo que ele. "Insuportável… é inócuo. Desculpe pessoal, mas vocês não conseguem provar que Guccifer era um agente russo. Quando a inteligência usa a palavra 'avaliado' significa que não sabem, que estão chutando".
Stone tem trabalhado na anotação por dias. Mas ele sempre interrompe seu trabalho. Ele tem um livro para lançar.
“Osso duro de roer”
As quase quarenta pessoas reunidas para conhecer Stone na livraria de Palm Beach - um lugar aconchegante na cidade onde Trump tem uma casa de verão — incluem um homem com uma perna vestindo uma camiseta com a frase "Make America Great Again" (slogan usado por Trump na campanha), que diz que participou de 14 comícios durante a campanha. Outro homem chegou de moto e pediu para que Stone convencesse o presidente a construir uma ponte que ligasse os EUA a Cuba.
"Você é um osso duro de roer, Sr. Roger!", grita o homem ao sair da livraria durante a fala de Stone.
Alguns momentos depois, uma jovem se aproxima e pede que Stone autografe o livro. "Eu que estava te mandando mensagens", ela diz.
Em um dos lados, Billy Benson — ex-político democrata cuja esposa, Grace Cohen, é dona da loja — vê a situação com diversão.
"A gente se odiava quando morávamos em Washington", conta Benson sobre Stone. "Ele fazia truques. Eu fazia truques. Nos damos bem agora".
Bronzeador da Clinique
Cinco mulheres jovens, incluindo a namorada do motorista de Stone, se posicionam ao lado dele para uma foto. Estão falando ucraniano. "Soa como o russo, mas é diferente", conta uma delas antes que outra interrompa a conversa.
Depois da fala, Stone explica para alguns dos participantes que pediu que seu alfaiate que fizesse uma calça com um cós de cinco centímetros e pernas folgadas para ficar parecido com o estilo de Cab Calloway.
Stone não tem tempo para ficar por ali. Uma equipe de filmagem está em um hotel próximo esperando por ele.
Ele está faminto quando a entrevista termina, mas ser Roger Stone é um trabalho de 24 horas, então vai receber pessoas da mídia para o jantar. Está ficando tarde e um dos repórteres menciona que vai começar o dia cedo.
Stone tira um produto do bolso do paletó: bronzeador da Clinique for Men. Ele adora isso.
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