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Desde que tomou posse como prefeito de Sao Paulo, João Doria tem sido alvo de críticas por supostamente estar alinhado ao fabianismo | Rovena Rosa/Agência Brasil
Desde que tomou posse como prefeito de Sao Paulo, João Doria tem sido alvo de críticas por supostamente estar alinhado ao fabianismo| Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Socialismo fabiano se tornou a expressão da moda nas discussões sobre política em redes sociais. O termo aparece em várias postagens no Facebook, sendo que grande parte delas presume uma ligação entre o socialismo fabiano e o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) e critica o possível candidato às eleições presidenciais de 2018 pelo partido, João Dória. 

O frenesi nas redes sociais também fez com que muitas pessoas recorressem à internet para entender melhor o significado de tudo isso, tanto é que o Google Trends aponta que na última semana de junho houve um pico de buscas sobre o que é socialismo fabiano, analisando-se os últimos cinco anos. 

Para ajudar os leitores a entender um pouco mais sobre esta doutrina política, a Gazeta do Povo falou com o professor da PUC-PR Másimo Della Justina, formado e pós graduado em Economia pela London School of Economics, escola clássica fundada pela Sociedade Fabiana, e com o analista político da Arko Advice, Carlos Eduardo Bellini Borenstein. A partir destas conversas, elaboramos uma lista com os pontos essenciais para compreender toda esta discussão em torno do fabianismo. 

1. Afinal, o que é socialismo fabiano? 

É uma doutrina que surgiu no final do século XIX, após o manifesto de Karl Marx, do Partido Comunista, mas, diferentemente deste, os fabianos viram que a transição para o socialismo deveria ser feita de forma gradual, sem ruptura revolucionária. O socialismo fabiano prega igualdade de oportunidade para todos, redistribuição de riquezas e justiça social, mantendo o direito à propriedade privada e à economia de mercado, embora regulamentada pelo Estado, o que também é diferente da proposta da corrente marxista que defendia o fim da propriedade privada e a socialização dos meios de produção. “Ele é considerado um socialismo cor de rosa que aproveita algumas ideias do capitalismo, mas que tem no Estado um regulador da economia e provedor de necessidades básicas”, comentou Della Justina. 

2. Origens 

Ao contrário do que muitos podem imaginar, o socialismo fabiano não nasceu na Rússia, mas sim no Reino Unido. Na época o país vivia um “capitalismo selvagem”, nas palavras do professor Della Justina, que resultou em pobreza e péssimas condições de trabalho para boa parte da população. Neste cenário, um grupo de intelectuais britânicos se reuniu e em 1884 fundou a Sociedade Fabiana (Fabian Society), o mais antigo instituto de estudos políticos britânico, conforme descrito no site da própria organização. 

3. Por que Fabiano? 

O fabianismo também se diferencia de outras vertentes do socialismo por acreditar que as mudanças poderiam ocorrer de forma gradual, por meio de reformas: evolução em vez de revolução. Foi por esta característica que o movimento ganhou o nome que tem. 

Trata-se de uma referência ao general romano Quintus Fabius, que durante a Segunda Guerra Púnica (218 a 201 A.C) tinha como estratégia cansar o inimigo e atacar suas linhas de suprimento, evitando confrontos diretos com tropas maiores. 

4. Quais foram os principais nomes? 

O casal Beatrice e Sidney Webb e o dramaturgo e jornalista George Bernard Shaw são nomes proeminentes quando se fala em Sociedade Fabiana. Em 1895 os três, junto com educador Graham Wallas, fundaram a London School of Economics, um dos mais prestigiosos centros de pesquisa acadêmica do mundo. O trecho a seguir foi encontrado escrito por Beatrice Webb em seu diário em 21 de setembro de 1894: “Sua visão é fundar, lentamente e silenciosamente, uma ‘Escola de Ciência Econômica e Política de Londres’ — um centro não apenas para aulas de interesses específicos, mas uma associação de estudantes que seriam direcionados e apoiados a fazer trabalhos originais”. O Primeiro Ministro do Reino Unido em 1922, Ramsay MacDonald, também foi um nome conhecido por ser o primeiro membro do Partido Trabalhista a assumir o cargo. 

5. Qual a influência na sociedade atual? 

Segundo o professor Másimo Della Justina, ideais do socialismo fabiano foram difundidas e estão presentes em algumas sociedades, como a ideia de que todos devem ter oportunidade econômica, e que, quando o cidadão não tem acesso a ela, seria obrigação de o Estado prover o mínimo necessário para que a pessoa possa sobreviver, dando também oportunidade para que ela possa ter seus próprios rendimentos. 

Entretanto, na opinião do analista político Borenstein, esta influência é pequena porque a parcela da sociedade que sabe fazer essa discussão de ideologias é muito reduzida. “Principalmente porque depois da Guerra Fria a gente tem um processo em que as ideologias perdem o valor na hora da decisão do voto” 

6. Existem partidos brasileiros que se alinham com os ideais do socialismo fabiano? 

O PT (Partido dos Trabalhadores), durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, implementou algumas políticas sociais que vão ao encontro de ideais do fabianismo, como o Programa Bolsa Família e o sistema de cotas nas faculdades públicas. O PSDB, em teoria, também pode ser associado ao socialismo fabiano pelo próprio estatuto que rege o partido, baseado na social democracia. 

Apesar disso, Borenstein afirma que estes partidos não podem ser considerados socialistas fabianos, porque, embora tenham alguns propósitos em comum com a doutrina, na prática de gestão, quando eles estavam no poder, tanto o governo de Fernando Henrique Cardoso quanto o de Lula e Dilma, se adaptaram à realidade e convergiram para uma política com viés mais de centro e liberal, abrindo mão de alguns programas ou deixando de lado ideologias que deram base à criação dos partidos. 

7. Por que virou o assunto da moda na roda do Facebook? 

Desde que tomou posse como prefeito de Sao Paulo, João Doria tem sido alvo de críticas pela denominada extrema-direita por supostamente estar alinhado ao fabianismo. “Vejo que existe um pessoal ligado ao MBL [Movimento Brasil Livre], com tendência mais de direita, que tentam dizer que o PSDB teoricamente representa o socialismo fabiano. Ligar o partido e o candidato deste partido ao socialismo é a forma que os estrategistas deles [pró-Bolsonaro] encontraram para desconstruir a imagem de um adversário que segue o mesmo viés de direita”, comenta Borenstein. 

O analista político acredita que Doria não seja um socialista fabiano. “Ele é um empresário, a favor de privatizações e desde que assumiu a Prefeitura de São Paulo até hoje não há nada do ponto de vista ético que possa ser usado para criticá-lo. Então esta é uma estratégia de campanha negativa por parte dos estrategistas do Bolsonaro” . 

Para o professor Della Justina, nas eleições brasileiras a construção da imagem é muito mais importante do que as ideologias. “Eu não diria que ele é socialista fabiano, mas sim que ele apresentará uma ideologia com o objetivo de atrair os votos dos brasileiros”.

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