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 | TOLGA AKMEN
AFP
| Foto: TOLGA AKMEN AFP

Nos dias que se seguiram a um suposto ataque químico fora de Damasco, a pressão na Síria aumentou dramaticamente. Com a disputa entre forças externas lançando ataques com mísseis contra alvos terrestres sírios e os países defensores do governo Assad, aqui está um resumo de quem são os principais envolvidos:

ERIC FEFERBERG AFP

Bashar al-Assad 

Scott Lucas, Professor de Política Internacional da Universidade de Birmingham

Entre aqueles que observam o conflito de sete anos da Síria, uma declaração simples, mas enganosa, está circulando: “Assad está ganhando”. Mas o regime de Assad só sobreviveu por causa do apoio político, econômico e militar da Rússia, do Irã e do Hezbollah. Agora é inteiramente dependente deles. 

E tudo isso para governar apenas uma parte da Síria. A oposição, embora muito dependente da proteção turca, detém grande parte do Noroeste, e também — por enquanto — o território no Sul ao longo da fronteira jordaniana. Grupos curdos tomaram grande parte do Norte e Leste da Síria depois de botar o Estado Islâmico (ISIS) para correr. 

Mesmo dentro das áreas que recuperou, o domínio do regime é tênue. Ele terá que lidar com muitos civis que não aceitarão seu governo, e há a perspectiva de uma insurgência em andamento. Em um país que perdeu 75% de seu PIB, a “reconstrução” é, por enquanto, um sonho. Os países defensores de Assad não têm os recursos necessários para mais do que uma recuperação de subsistência, e eles já estão procurando sua parcela do que restou da economia da Síria. 

Com seus militares apoiados por russos e iranianos, sua polícia secreta e suas prisões, e seus meios de propaganda, Assad ainda se apresentará como um presidente legítimo. Mas seu governo fez mais de 500.000 pessoas serem mortas durante a guerra e pelo menos 11 milhões de pessoas buscarem refúgio no exterior. 

Scott McIntyre Scott McIntyre

EUA 

Natasha Ezrow, Universidade de Essex 

A abordagem dos EUA em relação à Síria é confusa e errática. Ao longo de sua campanha e em seu primeiro ano no cargo, Donald Trump afirmou que estava "comprometido" em derrotar o Estado Islâmico, que na época ainda tinha uma pequena presença na Síria. Simultaneamente, sua administração prometeu se retirar da Síria, com Trump criticando seus antecessores por agirem militarmente. 

Enquanto Trump ordenou ataques em abril de 2017 e revelou que um total de 2.000 soldados estava em solo sírio, a administração em geral não manteve uma forte presença na Síria. As contradições continuaram desde então: apenas algumas semanas atrás, foi relatado que o Pentágono tinha planos de aumentar o número de soldados — mas Trump logo afirmou publicamente que as tropas americanas voltariam para casa "muito em breve", deixando os militares perplexos. 

Depois do mais recente aparente ataque químico a civis pelo regime de Assad (embora a Rússia tenha culpado a oposição pelo ataque), Trump voltou a agir e publicamente criticou a Rússia. Primeiro afirmou que os EUA enviariam mísseis, provocando a Rússia com uma série de tweets , antes de lamentar que o relacionamento entre os EUA e a Rússia estivesse no fundo do poço. E agora um conjunto de mísseis em colaboração com aliados dos EUA teve como alvo supostas fábricas de armas químicas e locais de armazenamento. 

Tudo somado, não está claro qual direção os EUA tomarão em seguida. E mesmo quando os militares parecem querer expandir seu papel, as preferências de Trump ainda são imprevisíveis ao extremo. 

MIKHAIL KLIMENTIEV AFP

Rússia 

Moritz Pieper, Professor de Relações Internacionais da Universidade de Salford 

A visão da Rússia sobre a Síria é instrumental. No Conselho de Segurança da ONU, a Rússia tem vetado constantemente resoluções que poderiam repetir a intervenção da Líbia em 2011, quando uma zona de exclusão aérea foi interpretada de forma liberal para justificar a mudança de regime

A Rússia não está protegendo Assad por causa de quaisquer laços econômicos ou militares significativos, mas por duas outras razões específicas. Por um lado, a Rússia apresenta a integridade das estruturas de governança síria como um baluarte contra as alternativas radicais islâmicas. Mas, em outro nível, a intervenção militar russa transformou o país novamente em um interlocutor geopolítico inevitável para o resto do mundo. 

Desde setembro de 2015, o destino de Assad está ainda mais dependente do planejamento de políticas russas e forçou o Ocidente a falar com a Rússia como uma “Grande Potência”, capaz de moldar as regras da política internacional assim como os EUA. 

HO AFP

Irã 

Edward Wastnidge, Professor de Política e Estudos Internacionais da Open University 

À primeira vista, Irã e Síria são estranhas companheiras. Uma talvez seja a teocracia mais proeminente do mundo, e a outra é um estado nacionalista árabe secular — e ainda assim sua aliança é uma das mais duradouras do Oriente Médio. Os dois compartilham uma visão estratégica sobre as principais questões regionais, especialmente a situação dos palestinos. Juntamente com o Hezbollah no Líbano, o Irã e a Síria formam um “ Eixo de Resistência ” autodeclarado, destinado a combater tanto Israel quanto os objetivos do Ocidente no Oriente Médio. 

A Síria tem historicamente atuado como um canal fundamental para o apoio iraniano ao Hezbollah, que resiste a Israel atuando no vizinho Líbano. Isso, por sua vez, significa que o Irã precisa de um governo amistoso em Damasco para salvaguardar sua influência estratégica na região. Durante toda a guerra civil na Síria, com o apoio do Irã, o Hezbollah serviu ao lado das forças iranianas como um aliado-chave de Assad. E, ao lado de suas forças, o Irã ajudou os combatentes voluntários de todo o mundo xiita a se juntarem à luta, inicialmente como defensores dos sagrados santuários xiitas.

Irã tem trabalhado com a Rússia e a Turquia para estabelecer zonas de desescalada na Síria, mas recentes ataques aéreos israelenses e a iminente ameaça da ação ocidental contra Assad trazem o espectro real dos confrontos diretos — com o Irã, o Hezbollah, a Síria e a Rússia de um lado, e forças ocidentais e israelenses do outro. 

O presidente turco Recep Tayyip Erdogan (à direita) cumprimenta o secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) Jens Stoltenberg durante reunião em Ancara. YASIN BULBUL/ AFP

Turquia 

Alpaslan Ozerdem, Professor de Construção da Paz, Co-Diretor do Centro para a Confiança, Paz e Relações Sociais da Coventry University 

No final de sua cúpula trilateral na Síria, em 4 de abril, os líderes da Turquia, Síria e Irã apresentaram uma demonstração de unidade — mas foi um tanto enganosa. Os três países ainda estão profundamente divididos sobre a guerra da Síria e sobre que tipo de paz gostariam de ver. 

Isso foi particularmente visível quando o presidente do Irã, Hassan Rouhani, alegou que o distrito de Afrin, capturado pela Turquia e pelo Exército Livre Sírio das forças curdas, deveria ser devolvido ao regime de Assad. Essa visão foi compartilhada pelo ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov — apesar do fato de que a operação só poderia ter sido realizada com a luz verde da Rússia. 

Essa dissonância diz muito sobre a posição precária da Turquia no conflito sírio, que é necessariamente definida por suas relações com o Irã e a Rússia. E enquanto Donald Trump parece estar mudando de ideia sobre a Síria diariamente, se ele voltar às suas recentes intenções de retirar a maioria das forças dos EUA em breve, isso poderia tornar a posição da Turquia contra esses dois países ainda mais fraca. 

Enquanto o Irã e a Rússia trabalharem para assegurar seus interesses geopolíticos no futuro da Síria, a posição da Turquia continuará muito desconfortável. Assim como sua relação com os EUA sobre a Síria é muito tensa nos dias de hoje, a Turquia está percebendo que apertos de mão calorosos do Irã e da Rússia não implicam necessariamente alianças duradouras. 

Curdos 

Cengiz Gunes, Professor Associado da Faculdade de Ciências Sociais da Open University 

Uma nova ação liderada pelos EUA contra Assad poderia beneficiar ou prejudicar a causa dos curdos da Síria — mas com a estratégia de longo prazo dos EUA tão incerta, é difícil fazer um prognóstico. 

A Federação Democrática multi-étnica e semiautônoma do norte da Síria (DFNS) até agora recebeu apoio militar e diplomático da coalizão liderada pelos EUA, e esse apoio vai determinar muito sobre o futuro dos curdos na Síria. Mesmo que o processo de paz de Astana, liderado pela Rússia , tenha o potencial de marginalizar completamente os curdos, uma intervenção liderada pelos EUA poderia potencialmente enfraquecer o regime de Assad a ponto de se sentir mais inclinado a negociar. Isso também significaria que os curdos poderiam contar com a influência dos EUA e da França para garantir um acordo melhor para a DFNS. 

Por outro lado, se os EUA atacarem o regime sem um forte compromisso de ver o conflito chegar a uma resolução, a Rússia, o Irã e o governo de Assad poderão ser obrigados a atacar a entidade liderada pelos curdos como um “inimigo interno”. Nesse cenário, a Rússia poderia até mesmo dar luz verde à Turquia para perseguir seu objetivo de desmantelar a entidade autônoma de origem curda, como aconteceu com a recente invasão turca de Afrin, no noroeste da Síria. 

A coalizão liderada pelos EUA não condenou veementemente a captura de Afrin pela Turquia, e Trump desde então insinuou que os EUA vão retirar suas forças da Síria "muito em breve". Isso gerou uma enorme quantidade de ansiedade entre a liderança curda na Síria, e levantou o espectro de seu maior medo: que uma vez que a ameaça do Estado Islâmico seja completamente eliminada, sua aliança crucial com os EUA poderia chegar a um fim abrupto

Iraque 

Balsam Mustafa, PhD Candidata em Línguas e Políticas Modernas, Universidade de Birmingham 

Um ataque aéreo ou intervenção liderado pelos EUA na Síria poderia afetar profundamente a segurança dentro do Iraque. Há uma preocupação real no Iraque de que uma escalada na Síria possa criar um perigoso vácuo de segurança, fortalecendo a posição de militantes do Estado Islâmico que já estão presentes perto da fronteira entre o Iraque e a Síria. 

Em uma coletiva de imprensa em 10 de abril, o primeiro-ministro iraquiano, Haider al Abadi, enfatizou que as forças iraquianas estão fazendo o melhor que podem para "proteger todas as terras iraquianas" e que estão "realizando operações em áreas desérticas". Ele também revelou que havia falado com Donald Trump para enfatizar que as medidas mantidas serão tomadas para derrotar o EI no Leste da Síria, “em coordenação com nossos parceiros, incluindo a Rússia e a Síria”. 

Israel 

Beverley Milton-Edwards, Professora de Política da Queen's University em Belfast 

O governo de Israel enfrenta um crescente desafio de segurança em sua fronteira Sul, onde há protestos semanais de milhares de palestinos na Faixa de Gaza. Mas a preocupação de segurança mais séria é a tensa fronteira norte do país com a Síria. 

O maior medo do governo israelense é uma dramática escalada regional e a possibilidade de que a Síria se torne um palco de conflito aberto entre a Rússia e estados como os EUA, o Reino Unido e a França. Se os EUA responderem ao ataque de armas químicas em Douma com força intensa, isso pode desencadear um efeito dominó que poderia atrair Israel ainda mais para a luta — especialmente se o Irã assumir o lado do governo de Assad em resposta. 

PRU AFP

Os aliados da OTAN 

Simon Smith, Professor de Relações Internacionais da Universidade de Staffordshire 

Uma coalizão liderada pelos EUA opera contra o EI na Síria e no Iraque desde 2014. Ela inclui vários aliados da Otan: Bélgica, Canadá, França, Alemanha, Holanda e Reino Unido. A OTAN não contribuiu para os últimos ataques aéreos como uma organização — eles foram realizados pelos EUA, Reino Unido e França. 

Os países da OTAN têm realizado consultas ativas sobre a situação na Síria após o ataque químico à Douma. Numa conferência de imprensa em 12 de abril, o Secretário Geral da OTAN, Jens Stoltenberg, declarou que: 

Condenamos, nos termos mais enérgicos, o uso de armas químicas e pedimos ao regime sírio e seus apoiadores que permitam acesso total e irrestrito à assistência médica e ao monitoramento internacional. A OTAN considera o uso de armas químicas uma ameaça à paz e segurança internacionais. E os responsáveis devem ser responsabilizados. Devemos fazer tudo o que pudermos para proteger a proibição do uso de armas químicas. 

Mas enquanto esta declaração implica alguma semelhança de unidade entre os membros da OTAN, a realidade é que, embora não na mesma escala das divisões causadas pela guerra do Iraque em 2003, a Síria realmente dividiu a aliança. 

Parte disso decorre da preocupação de que quaisquer ataques com mísseis levem a um conflito mais amplo no Oriente Médio e, potencialmente, entre a Rússia e o Ocidente de forma mais ampla. Mas a guerra na Síria também levou a divergências entre aliados específicos, em particular entre certos países membros e a Turquia. 

Em certo momento, a Turquia revelou até mesmo as posições das tropas francesas e das bases norte-americanas no nordeste da Síria. O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdoğan, criticou duramente seu colega francês , Emmanuel Macron, por se encontrar com líderes curdos em Paris e por se oferecer para mediar entre a SDF e a Turquia. No que diz respeito a Erdoğan, isso equivale a negociar com terroristas. 

Como os outros membros da OTAN lidam com isso, por enquanto, está no ar. Mas eles certamente estão sentindo a pressão. Como disse Angela Merkel: 

“A Alemanha não participará de uma possível ação militar - quero deixar claro novamente que não há decisões — mas vemos e apoiamos que tudo está sendo feito para enviar um sinal de que esse uso de produtos químicos armas não é aceitável.”

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