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Encontro da Aliança Progressista em Madri
Encontro da Aliança Progressista em Madri, em fevereiro deste ano: Thorben Albrecht (Partido Social-Democrata da Alemanha), Gleisi Hoffmann (Presidente do PT), Maria João Rodrigues (Vice-Presidente do Grupo Socialistas e Democratas no Parlamento Europeu), Sergei Stanishev (Presidente do Partido Socialista Europeu), Jochen Steinhilber (Fundação Friedrich Ebert), Manish Tewari (Presidente do Congresso Nacional Indiano) e Konstantin Woinoff (Coordenador da Aliança Progressista).| Foto: Dirk Bleicker/Divulgação

Em 22 de maio de 2013, a cidade alemã de Leipzig viu o nascimento de uma das mais ambiciosas organizações globais de centro-esquerda e esquerda do mundo: a Aliança Progressista (AP) foi fundada como um órgão supranacional onde os partidos desse viés político pudessem se encontrar e discutir ações em comum. Sua própria origem já era, de certa forma, com os olhos no exemplo de outra organização anterior, a quem a AP tenta suplantar — a Internacional Socialista (IS).

Tudo começou com uma desavença sobre os rumos tomados pela IS. No início de 2012, as lideranças do Partido Social-Democrata Alemão (SPD) deram a largada para um movimento de desfiliação da velha congregação mundial de socialistas, alegando que a IS estava cada vez mais afastada dos valores democráticos que, supostamente, deveria defender. Sigmar Gabriel, então presidente do SPD, citava, por exemplo, a presença de nomes como o ditador egípcio Hosni Mubarak — membro de longa data da IS, que só foi expulso após ser derrubado em 2011, em um dos episódios mais famosos da chamada Primavera Árabe.

Com a largada dada pelo SPD, não tardou para que outros movimentos ideologicamente próximos buscassem aproximação: o Partido Socialista da França, o Partido Democrata da Itália, o Partido Socialista da Argentina, entre outros, passaram a dialogar com os alemães a respeito da formação de uma alternativa. Quando a Aliança Progressista finalmente nasceu, seus braços já estavam amplos o bastante para englobar cerca de 70 partidos ao redor do mundo. Hoje, seis anos após a formação da AP, os organizadores do grupo estimam que o número dobrou, com participantes vindos de quase uma centena de países — incluindo, no Brasil, o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB).

Objetivos

A Aliança Progressista diz que quer “fazer do século 21 um século de progresso democrático, social e ecológico”, promovendo ideias como a igualdade de gênero, os direitos da população LGBT, a luta contra o racismo, a regulamentação do mercado, o combate às mudanças climáticas, etc. A organização se define como uma associação de partidos socialistas, trabalhistas e social-democratas, que quer trabalhar com ONGs, fundações, sindicatos e afins para propor “respostas coletivas e coordenadas aos desafios políticos ao redor do mundo”.

Sua retórica também é fortemente contrária ao neoliberalismo. “Nós vimos como as políticas de injustiça e desigualdade dividiram nossas sociedades e prejudicaram a coesão social e a solidariedade. O neoliberalismo falhou miseravelmente”.

Apesar da abrangência e heterogeneidade da aliança, trata-se de um órgão, sobretudo, voltado às discussões e ao encontro de lideranças de várias partes do mundo, a fim de formular posturas conjuntas. Seu poder prático é limitado, o que não impede, porém, que a AP busque exercer pressão sobre os governos cujos partidos-membro estão contra, ou influenciar aqueles que estão ao seu lado.

Embora muitos de seus membros ainda pertençam, de alguma forma, à Internacional Socialista, a busca da AP por se afastar do viés autoritário da antiga organização a fez abarcar partidos outrora impensáveis. Entre os participantes listados no site oficial da Aliança, um deles chama a atenção: o Partido Democrata dos Estados Unidos.

Envolvimento norte-americano

Tentando se firmar como um órgão claramente distinto da IS, a nova aliança desde o princípio se abriu a partidos progressistas de orientação moderada. Foi assim, por exemplo, que o Partido Democrata dos Estados Unidos passou a ser considerado um membro da AP. Sua participação é modesta e, com frequência, personalista: está centrada em um político da alta cúpula democrata — Howard Dean, presente inclusive na reunião de fundação da Aliança.

Dean, que foi governador do estado do Vermont entre 1991 e 2003, e no ano seguinte chegou a se lançar à corrida presidencial — sendo derrotado por John Kerry nas primárias — é considerado um nome mais à esquerda dentro do espectro democrata. Quando tentou assumir a Casa Branca, concorreu com uma plataforma que prometia saúde pública gratuita nos EUA, fortes subsídios para reduzir os custos da educação superior aos bolsos dos estudantes, e uma reforma tributária que beneficiaria a classe média em detrimento dos mais ricos.

Após sua campanha fracassada, Howard Dean deu a volta por cima: comandou o Comitê Nacional do Partido Democrata, sendo considerado por muitos analistas o responsável direto pela estratégia de campanha que levou o partido a eleger seu último presidente — Barack Obama, em 2008. Em anos recentes, no entanto, Dean voltou a se envolver em polêmicas, apoiando Hillary Clinton nas primárias eleitorais de 2016.

Parte de seus seguidores considerou o posicionamento contra Bernie Sanders, o autodenominado “socialista” que concorria com Clinton por um lugar na disputa com Donald Trump, uma dupla “traição”: não só por Dean ser visto como sendo ideologicamente mais próximo de Sanders, mas também pelo fato de que ambos tinham o mesmo berço político, o estado do Vermont.

Influência internacional

Embora não tenha poder político real, a Aliança Progressista tenta pautar seus membros através de conferências, convenções e seminários organizados com grande frequência ao redor do mundo. Até o final deste ano, por exemplo, haverá três encontros do tipo: em agosto na Malásia, em setembro no Uruguai e, em novembro, na Suécia. A diversidade geográfica faz parte da estratégia de possibilitar que o máximo de organizações esteja presente nos eventos da AP, mesmo que disponha de recursos para participar apenas de seu encontro regional.

Desses eventos, saem também as resoluções que a Aliança Progressista utiliza para tentar exercer uma espécie de soft power sobre os acontecimentos da política internacional. Desde sua fundação, a AP e seus membros já votaram diferentes resoluções para tentar sugestionar governos, condenar posturas e cobrar autoridades para que tomassem determinada decisão.

Em 2017, duas dessas resoluções chamaram a atenção: após uma visita às Filipinas, integrantes da AP e do Partido Socialista Europeu (PES, na sigla em inglês) exigiram que a pressão internacional contra o presidente Rodrigo Duterte fosse aumentada. Na visão da Aliança, a guerra às drogas promovida pelo mandatário filipino está em clara violação aos direitos humanos e é conduzida à base de assassinatos extrajudiciais.

A outra declaração da AP divulgada na época teve repercussão direta no Brasil: uma nota divulgada em julho de 2017 manifestava repúdio à sentença do então juiz Sérgio Moro, condenando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à prisão, em primeira instância. Segundo a AP, “as acusações, a argumentação e a motivação da sentença são altamente questionáveis porque ninguém pode ser condenado unicamente com base em denúncias e sem provas”. A organização internacional também colocava em dúvida a imparcialidade da Justiça, inclusive do próprio Moro, vaticinando que “sob tais circunstâncias dificilmente se pode falar em um juízo justo”.

Tendo no próprio PT um de seus membros, não era a primeira vez que a Aliança Progressista havia se manifestado a favor do partido e seus integrantes. Um ano antes, ela já tinha emitido uma nota contra o impeachment de Dilma Rousseff, alegando que “a oposição abusa de um instrumento democrático importante da Constituição para destituir uma presidenta democraticamente legitimada”.

Com muitas declarações mas poucas alternativas reais para exercer qualquer poder, hoje a Aliança Progressista está na oposição da maioria dos países em que tem membros.

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