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xi jinping
O presidente da China, Xi Jinping| Foto: Xie Huanchi / XINHUA / AFP

Eu culpo Xi Jinping por ter dado início à pandemia de coronavírus, que começou na cidade chinesa de Wuhan e causou milhares de mortes ao redor do mundo, além de uma recessão econômica que nos assolará durante anos.

Minha acusação é fundamentada e documentada. No início de dezembro, um jovem médico de um hospital em Wuhan descobriu o primeiro caso de uma doença provocada por um vírus até então desconhecido. Ele imediatamente estabeleceu a conexão entre este caso e uma epidemia anterior que começou no mesmo lugar e na mesma circunstância: a pneumonia viral conhecida como SARS.

O médico se chamava Li Wenliang, tinha 37 anos e morreu em fevereiro, por se expor aos pacientes de que tratava. Ele tinha publicado o diagnóstico da nova doença no site interno do hospital para informar seus colegas. Por isso, foi chamado diante do conselho disciplinar do Partido Comunista local e obrigado a pedir desculpas e confessar, por escrito, que tinha espalhado rumores que eram prejudiciais à glória do Partido.

Um mês mais tarde — tarde demais —, depois de esconder provas dos corajosos profissionais de saúde, o Partido reconheceu o caráter explosivo da epidemia que poderia ter ficado restrita a Wuhan, mas que se espalhou pela China e pelo mundo.

Do que Xi Jinping é culpado? Apesar de ele não ter inventado a ideologia da mentira, que é a verdadeira Constituição seguida pelo Partido Comunista chinês, ele a tem reforçado consideravelmente desde que assumiu o poder. Devemos considerar, portanto, que os burocratas do Partido, motivados por medo e ambição, são seus agentes servis.

Num regime tão centralizado quanto o da China só há um ente inegavelmente culpado — o presidente. Sabemos com certeza que Xi tem ciência de sua responsabilidade, já que ele lançou uma ofensiva de propaganda que tem como alvo o povo chinês e a comunidade internacional. O objetivo era, a princípio, convencer o povo chinês de que eles, liderados pelo Partido, estavam prestes a vencer a epidemia e que essa batalha vitoriosa serviria de modelo para o restante do mundo. Transformar derrotas em vitórias é algo característico dos regimes totalitários.

A ofensiva diplomática é ainda mais ousada. Membros da linha dura do Partido ameaçaram cortar o fornecimento de produtos farmacêuticos para os Estados Unidos. Eles querem que o mundo acredite que o vírus não tem origem chinesa e que foi plantado em Wuhan pelo exército norte-americano. Aqui novamente reconhecemos o método tradicional dos regimes totalitários: uma grande mentira deixa menos rastros do que uma mentira menor.

Como a opinião pública chinesa é controlada, não se sabe ao certo o que o povo pensa, mas as redes sociais nos dão algumas dicas — ódio, desprezo e desânimo diante da ditadura de Xi.

O Ocidente vai continuar como mero espectador da tragédia? Não temos como levar Xi para ser julgado em qualquer tribunal internacional, mas muitos chineses, as primeiras vítimas dessa epidemia, nos agradeceriam se o condenássemos. Por que não repensamos nossas relações com a ditadura de Pequim enquanto governos, igrejas, imprensa e indústria do turismo?

A recessão econômica que surge no horizonte mostra bem como nossa dependência dos fornecedores chineses foi um risco mal calculado. Já está na hora de redirecionar nossa cadeia de suprimentos, diversificando-a pelo mundo. É realmente assustador descobrir, diante da crise atual, que a maioria dos remédios norte-americanos é fabricada na China. (Congressistas norte-americanos têm apresentado projetos de lei para dar início ao processo de repatriação das indústrias farmacêuticas norte-americanas).

Para além de mudanças na estratégia econômica, que requerem uma forma nova de globalização, já está na hora de denunciar a ameaça representada por Xi e o Partido Comunista. Como idiotas úteis, não só ajudamos o Partido a prosperar como, pior, abdicamos dos nossos valores humanitários, democráticos e espirituais ao longo do processo. Alguns veem nessa renúncia uma forma de respeito à civilização chinesa, mas eles estão enganados.

Os chineses sabem o que é uma democracia: Liu Xiaobo, ganhador do Prêmio Nobel da Paz, morreu defendendo a democracia. Os chineses conhecem Deus: milhões de chineses são cristãos e muçulmanos, enquanto outros permanecem leais às antigas religiões chinesas como o budismo e o taoísmo. Trememos diante da ideia de o Vaticano reconhecer o regime chinês. Isso seria um pacto com o demônio.

Sejamos ousados e francos: o Partido Comunista chinês de Xi é o principal adversário militar dos Estados Unidos, um adversário que age por meio da espionagem, da conquista do Mar da China e da manipulação do regime norte-coreano.

Já está na hora de dizer “chega!”. Se fizermos isso, estaremos fazendo o mais certo para nós mesmos e para centenas de milhões de chineses que nos aplaudirão.

Guy Sorman é editor do City Journal e um famoso intelectual francês.

© 2020 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês
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