"Acho que em qualquer época eu teria amado a liberdade; mas na época em que vivemos, sinto-me propenso a idolatrá-la"
(Tocqueville)

O que, afinal de contas, está resguardado pelo “sigilo da fonte”?

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O sigilo da fonte está expressamente previsto na Constituição brasileiro entre os direitos fundamentais, no art. 5º, inciso XIV, o qual assegura o direito de acesso à informação, “resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional“.

Existe pouco desenvolvimento do tema entre juristas no Brasil e são raros os julgados que aprofundam a questão, até mesmo porque ela parece simples: basicamente, o dispositivo constitucional assegura a profissionais o direito de não revelar uma fonte de informaçõesquando tal revelação puder prejudicar o desempenho desembaraçado de suas funções.

O caso mais comum, sem dúvida alguma, é o dos jornalistas. A fim de tornar menos arriscada a tarefa de atuar como fonte, por exemplo, denunciando agentes do governo ou pessoas e grupos poderosos, a legislação assegura ao profissional da comunicação que recebe uma informação ou elemento de prova o direito de não ter de revelar quem fez o material chegar até ele. Isso permite que o jornalista, ao exercer seu direito de sigilo, preserve o denunciante de eventuais retaliações.

É um direito sobremaneira relevante, visto que facilita a circulação de notícias sobre fatos de interesse geral e mantém agentes de Estado ou de poderosas corporações privadas sob maior vigilância e escrutínio em temas de relevância pública.

Todavia, consoante remansosa jurisprudência do STF, harmônica com a lição dos constitucionalistas, “um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas” (HC 82424), lição que se aplica em sua inteireza à prerrogativa do sigilo da fonte. Esse privilégio, assim, limita-se a autorizar a negativa por parte do usuário da informação quanto ao fornecimento da origem do dado ou material.

E cessa por aí o alcance desse direito fundamental, que não gera absolutamente nenhuma imunidade – civil ou criminal – tanto no tocante à veiculação da notícia quanto no que concerne ao modo como o material foi coletado.

Logo, se por exemplo o conteúdo do material for falso, violando a honra de terceiros, ou se a matéria não possui interesse público, agredindo o direito à privacidade, aquele que divulga a informação – ao optar por resguardar a identidade da fonte – responde por eventuais danos provocados pela ilicitude da matéria. Frise-se que quanto à qualificação de uma informação como de interesse público ou não, o direito brasileiro, conforme jurisprudência pacificada, reconhece que esse conceito deve ser alargado no tocante a pessoas públicas.

Na mesma linha, caso fique demonstrado que o responsável pela veiculação da informação não se limitou a recebê-la após a fonte sigilosa ter-se apropriado dela, mas atuou de modo prévio na própria captação do dado, responderá junto com a fonte (na eventualidade de ela vir a ser identificada por outros meios) caso a colheita da informação tenha envolvido a prática de condutas ilícitas.

Expliquemos por meio de um exemplo. Suponhamos que um hacker invada celulares de autoridades públicas e o conteúdo de diálogos registados em aplicativos mensageiros sejam veiculados em matérias jornalísticas. Qual a responsabilidade do hacker e dos responsáveis pelas matérias? Abrem-se aqui várias possibilidades. Vejamos algumas delas.

Hipótese 1 – Material divulgado é verdadeiro e de interesse público e o jornalista apenas noticiou, sem participar da invasão: nesse caso o jornalista não responde, pois não praticou qualquer conduta ilícita. O hacker responderia pela invasão, e o jornalista não tem qualquer obrigação de auxiliar as autoridades em sua identificação.

Hipótese 2 – Material divulgado é falso ou viola o direito à privacidade (direito que é mais restrito quanto às pessoas públicas) e o jornalista apenas noticiou, sem participar da invasão: nesse caso o veículo e os profissionais responsáveis pela divulgação respondem em relação a eventuais danos civis provocados e violações à honra de terceiros, mesma que a informação houvesse sido adulterada antes de chegar a suas mãos. O hacker segue respondendo pela invasão, e o jornalista segue não tendo qualquer obrigação de auxiliar as autoridades em sua identificação.

Hipótese 3 – O responsável pela divulgação não apenas recebeu, mas participou (seja como mandante, encomendando a invasão, ou encorajando-a ou auxiliando materialmente de qualquer maneira): nesse último caso, o responsável pela divulgação responderia junto com o hacker pela invasão praticada. Caso houvesse falsidade ou invasão da privacidade, igualmente. O divulgador da matéria, mesmo nesse caso, poderia se resguardar no direito de não revelar sua fonte.

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