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| Foto: Reprodução/Jornal Informate Salta

Uma polêmica se instalou na Argentina desde terça-feira (20), quando a imprensa local começou a noticiar que um funcionário da Receita Federal do país teria “mudado” seu gênero de masculino para feminino nos documentos com o objetivo de se aposentar cinco anos antes. O funcionário contestou essa versão.

Segundo a imprensa argentina, Sergio deu início aos trâmites para “transição” de gênero aos 59 anos e mudou seu nome para Sergia. O caso foi relevado inicialmente por uma rádio local e ganhou repercussão.

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Enquanto as mulheres argentinas podem ser aposentar aos 60 anos, os homens precisam esperar até os 65 para obter o benefício. Sergio é funcionário da Administração Federal de Ingressos Públicos (AFIP) de Salta, no Noroeste do país, e fez os trâmites na província vizinha de Tucumán. 

A Lei de Identidade de Gênero argentina entrou em vigor em 2012. Pela legislação, qualquer cidadão civilmente capaz pode solicitar, por via administrativa (sem decisão judicial) e gratuitamente, a retificação do gênero nos documentos, caso não se identifique, com base na própria percepção, com seu gênero biológico – exatamente como o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu no Brasil recentemente, levantando preocupações com a possibilidade de fraudes (leia abaixo).

A mudança de gênero nos documentos de Sergio causou espanto naqueles que convivem com ele, muito porque ele nunca teria se identificado com o gênero feminino, além de manter um relacionamento estável como uma mulher, segundo relatos. A retificação no registro civil teria ocorrido com o único propósito de garantir a aposentadoria cinco anos mais cedo. 

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“Ele fez, inclusive, durante toda a vida, comentários depreciativos a respeito dos gays e transexuais”, afirmou uma parente de Sergio ao jornal local Informatesalta, sem se identificar. Colegas de trabalho relataram que Sérgio se aproveitava de brechas na lei para tirar licenças e que “não gostava de trabalhar”. 

Ao mesmo portal, o diretor da seção de Registro Civil de Salta, Matías Assennato, disse que o processo de Sergio foi bastante longo. Inicialmente o pedido teria sido negado, mas com o amparo da Lei de Identidade de Gênero os trâmites avançaram.

Ainda não há clareza das motivações de Sergio, que fez 60 anos em janeiro deste ano. O argentino declarou ao jornal El Tribuno que a acusação de que teria mudado de gênero para aposentar-se cinco anos mais cedo seria mentirosa. Ricardo Miller, diretor regional da Previdência argentina, disse que ainda não há registros de que Sergia tenha entrado com o pedido.

Ao jornal, o argentino disse que completou a transição porque “estava convencido” e que “não tinha de explicar nada para ninguém”. “Isso não seria um problema para ninguém se todos se aposentassem aos 65 anos”, declarou também.

Brasil

No início de março, o STF reconheceu a possibilidade de alteração do gênero nos registros civis de transexuais independentemente da realização de cirurgia de transgenitalização, conhecida popularmente como cirurgia de “mudança de sexo”. Também não será necessária autorização judicial para o procedimento, que poderá ser solicitado administrativamente.

Um dos questionamentos mais comuns que se faz quando o assunto é transexualidade, justamente pelo fato de a lei não fazer nenhuma menção específica a essa situação, está ligado à aposentadoria. Uma pessoa transexual, afinal, vai se aposentar de acordo com a idade prevista para homens ou mulheres? 

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Atualmente, os requisitos adotados pela Previdência Social, idade ou tempo de serviço, são estritamente biológicos, isto é, destinados a homens ou mulheres. A lei é taxativa ao trazer os critérios para aposentadoria: 35 anos de contribuição, se homem e 30, se mulher, ou 65 anos de idade, no caso dos homens, e 60 no caso das mulheres, com redução de tempo para trabalhadores rurais e professores. 

Em relação aos transexuais, ainda não há precedentes na Justiça, mas Tereza Rodrigues Vieira, PhD em Direito pela Universidade de Montreal e que há 20 anos trabalha com o público transgênero, afirmou, em entrevista dada em dezembro à Gazeta do Povo, que “a partir do momento em que a sentença transitou em julgado reconhecendo a adequação do nome e do gênero da pessoa trans, esta deve ser considerada como qualquer outra do mesmo gênero”. Para a advogada, “não deve haver diferenças na concessão de benefícios, independentemente da realização de cirurgias”. No estado de São Paulo, por exemplo, segundo Tereza, as ações do gênero têm demorado de dois meses a um ano para serem concluídas. 

Como o sistema previdenciário é entendido como um sistema protetor, os juízes tenderiam a interpretar que aos homens transexuais (aqueles que nasceram com o sexo biológico feminino) devem ser aplicados os critérios relativos à aposentadoria das mulheres, por se tratar de norma mais favorável. 

Em 2010, na Inglaterra, uma mulher transexual (que nasceu num corpo masculino) conseguiu, na Justiça, o direito de que sua aposentadoria fosse contada a partir do momento em que completou 60 anos, idade mínima para as mulheres se aposentarem na localidade. Na época, o Departamento de Trabalho e Pensões, agência governamental do Reino Unido, negou o pedido de Christine Timbrell, nascida Christopher, pelo fato de ela ter continuado casada com sua esposa, Joy. 

É que pelo Gender Recognition Act (Ato de Reconhecimento de Gênero), emitido pelo Parlamento britânico em 2004 e que passou a valer no ano seguinte, a mudança de gênero só passa a ter efeitos legais se o transexual, se casado, divorciar-se de seu parceiro. No caso em questão, Christine se submeteu a uma cirurgia de redesignação sexual com o consentimento de Joy, com quem continuou a viver. Christine recorreu da decisão da agência governamental e o juiz que analisou a questão deu ganho de causa à transexual, com o argumento de que a incapacidade da lei ao lidar com pessoas transgênero seria discriminatória.

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