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Com a reforma trabalhista, instituída pela Lei Federal de nº 13.467/2017, vigente desde novembro de 2017, alguns princípios trabalhistas foram remodelados diante da nova realidade. Um deles foi o princípio do acesso ao Judiciário. 

O princípio em questão é um direito humano essencial ao complexo exercício da cidadania. O disposto no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, é muito mais abrangente que o mero acesso ao Poder Judiciário e suas instituições por lesão ao Direito. Vai além! Enquadra-se aí também a ameaça ao Direito, bem como o Direito à inafastabilidade do controle jurisdicional e direitos fundamentais do ser humano. 

Assim, quem busca a defesa de seus direitos (ameaça ou lesão) espera que o Estado-juiz dite o Direito para aquela situação, em substituição da força de cada litigante, pacificando os conflitos e facilitando a convivência social. 

Neste caminhar, a antiga legislação trabalhista tratava o empregado de forma enfática como a parte hipossuficiente da relação jurídica, o que facilitava o acesso amplo e ilimitado ao Judiciário brasileiro. 

Desta forma, a pretérita Consolidação das Leis Trabalhistas (Lei Federal nº 5.452/1943) protegia veemente a parte fraca da relação jurídica sem impor, contudo, qualquer ônus processual, caso viesse a não obter êxito no litígio. Assim, face à amplitude processual sem gerar qualquer ônus à classe hipossuficiente à época da antiga legislação, observava-se ser rotineiro o abuso do Direito pelos empregados, mormente no âmbito das instituições bancárias. 

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Cristalino era o número de demandas processuais na seara trabalhista em 2009, posto que muitas das vezes, beneficiando-se da deficiência de sucumbência caso a parte não tivesse seus direitos totalmente garantidos, reclamantes pleiteavam inúmeras verbas que eram pagas por mera liberalidade pelas instituições bancárias, sem ao menos ter de fato o direito para tanto. 

Assim, incorria no efeito cascata, tendo em vista a gama de decisões favoráveis em primeira instância quanto a direitos não devidos. Isso porque determinadas verbas pagas pelas instituições bancárias poderiam ser transacionadas ou renunciadas. 

Desta forma, qualquer verba que não seja instituída por norma de ordem pública, paga por mera liberalidade da empresa, importa em direito disponível - portanto, passível de renúncia ou transação 

O Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) mostrou, em 2015, que as empresas com o maior número de ações trabalhistas no Brasil foram instituições bancárias, varejistas e companhias do segmento de telefonia. Nesse esteio, a ampla liberdade de prestação jurisdicional foi, por vezes, um caminho para um conjunto massificado de ações na seara trabalhista. 

O abuso de Direito em consequência da prestação jurisdicional fez com que as instituições varejistas, bancárias e de telefonia atingissem um patamar no ranking dos 10 maiores litigantes do país. 

Diante deste cenário, após a vigência da Lei n. 13.467/2017, o princípio da proteção que reconhecia o empregado sempre como a parte hipossuficiente - frente à sua menor capacidade econômica foi restruturado - para estabelecer uma aparência de igualdade de ambas as partes litigantes. 

Em consequência deste aparato protetivo remodelado, tornou-se possível a sucumbência recíproca, no art. 791-A, §3º da reforma, no intuito de reprimir a integração do petitório inicial de pedidos com baixíssima ou nenhuma probabilidade de êxito. O referido artigo estabelece que o empregado que tiver pretensões não atendidas deverá pagar honorários ao procurador da parte contrária afetos aos pedidos em que for sucumbente. 

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Face a essa nova perspectiva, as ações em primeira instância reduziram drasticamente após a reforma trabalhista, mitigando, portanto, o abuso de direito à pretensão jurisdicional quando da antiga Consolidação das Leis Trabalhistas. 

Vale observar, no entanto, que a instituição do art. 791-A, §3º não foi o único e exclusivo motivo para a redução das ações trabalhistas. Os pedidos de indenização por danos morais e adicional de insalubridade e periculosidade, que são pleitos difíceis de serem comprovados, por exemplo, estão sendo afastados das novas demandas processuais pela insegurança jurídica no presente momento. 

É que com a nova legislação trabalhista, opera-se a insegurança jurídica face as demandas processuais, coibindo, portanto, o abuso de direito visto anteriormente na Legislação vigente até 10 de novembro de 2017. 

Em dezembro passado, as ações trabalhistas não chegaram a mil em cinco dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho distribuídos pelo país: 14ª Região, que abrange Rondônia e Acre; 20ª (Sergipe); 21ª (Rio Grande do Norte); 22ª (Piauí) e 24ª (Mato Grosso do Sul). 

No Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, o maior do Brasil e que engloba a Grande São Paulo e a Baixada Santista, o volume de processos caiu para menos de 500 ações por dia após a reforma. Antes dela, a média diária era superior a 3 mil novas ações, chegando a beirar 13 mil um dia antes de a lei entrar em vigor. 

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Conclui-se, portanto, que em que pese o Direito Trabalhista conferir proteção jurisdicional ao hipossuficiente, ou seja, garantir o amplo acesso ao Judiciário para pleitear seus direitos violados, há que se ressaltar o equilíbrio entre as partes do conflito, fazendo com que o acesso à Justiça não se torne banalizado, caracterizando abuso de direito diante da pretérita amplitude processual. Assim, o grande volume de ações em face das instituições bancárias tem uma redução significativa. Diminui, por conseguinte, o passivo trabalhista possibilitando que o hipossuficiente da relação jurídica pretenda realmente o direito a que lhe detém. 

Desta forma, o número de demandas judiciais na seara trabalhista é mitigado, fazendo com que os chamados aventureiros processuais reduzam os pedidos que de fato não seriam deferidos. Por fim, o abuso de direito anteriormente observado é coibido diante da insegurança jurídica cristalizada perante a presente legislação trabalhista.

*Gustavo Silva de Aquino é advogado do Chenut Oliveira Santiago Advogados e especialista em Direito do Trabalho.

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