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Pátio da CPTM, em São Paulo | Aloisio Mauricio /Estadão Conteúdo / Arquivo
Pátio da CPTM, em São Paulo| Foto: Aloisio Mauricio /Estadão Conteúdo / Arquivo

Um vigilante que recolhia restos mortais em linhas de trem em São Paulo receberá indenização de R$ 30 mil por danos morais. A decisão foi da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST). 

O funcionário fazia parte do Grupo de Apoio Móvel (GAP), da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Na petição inicial da ação, ele relata que era contratado para prestar socorro e acompanhar vítimas de mal súbito. Mas, como não havia empregados da CPTM preparados para atender acidentes com morte, os vigilantes, segundo relatou, também eram chamados para retirar cadáveres mutilados que obstruíam os trilhos. Além disso, eram obrigados a permanecer no local até a chegada do Corpo de Bombeiros ou do Instituto Médico Legal.

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Na reclamação trabalhista, além do desvio de função, o vigilante assegurou não ter recebido orientação psicológica para lidar com os traumas vivenciados diariamente, como o manuseio de “pedações de carne humana, sem treinamento específico”. Alegou também ter de ajudar pessoas com graves danos físicos, o que não era previsto em contrato, e ter de acompanhar a dor dessas pessoas sem o preparo adequado, prejudicando seu equilíbrio emocional.

O juiz de primeiro grau aceitou o argumento do vigilante e estipulou uma indenização de R$ 200 mil. Em julgamento de recurso da empresa, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT-SP) de São Paulo reverteu a decisão de primeira instância. A corte acatou a tese de defesa da empresa segundo a qual esse tipo de ocorrência era lamentável, mas previsível. De acordo com a companhia responsável pelos trens, o vigilante não removia os cadáveres, mas apenas deveria permanecer no local até a chegada das autoridades competentes.

“Embora tétrico e estranho às funções de vigilante, o fato narrado (remoção de restos humanos da linha do trem), não representa lesividade ao patrimônio moral do reclamante. A morte é, infelizmente, uma ocorrência natural e cotidiana, estando presente no dia-a-dia [sic] de muitas profissões, inclusive na rotina dos profissionais de segurança. Mesmo o vigia desarmado, que não está obrigado a enfrentar o perigo, pode se deparar com o evento morte durante seu trabalho”, escreveram no acórdão os juízes do TRT.

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Insatisfeito, o vigilante recorreu TST que reverteu novamente a decisão do caso. Para o ministro Vieira de Mello Filho, relator do processo no TST, é preciso proteger o empregado do trabalho penoso, aquele que o despoja de seus direitos como ser humano. Para ele, o empregador perde seu poder diretivo quando exige, sem orientação ou amparo físico, legal e emocional, que uma pessoa despreparada tenha de recolher restos de corpos acidentados. O vigilante tinha sobre os ombros não apenas “a simples vivência da morte de outra pessoa”, mas a necessidade de “contato visual, físico e emocional com o morto, dada a possibilidade de presenciar a dor final do acidentado”.

Como alguns desses acidentes nas linhas de trem têm implicação penal, o empregador, ao colocar o funcionário nessa situação também poderia causar outros transtornos ao funcionário, como o de ser acusado a modificar a cena do crime. “O abuso do empregador, no caso, sob essa ótica, adquire contornos mais nítidos”, escreveu.

Para estipular a multa, o ministro levou em conta a negligência da empresa, o tempo de serviço (quatro anos), e também a não ocorrência de maiores implicações ao vigilante. Seu voto foi acompanhado pelos outros ministros da turma do TST por unanimidade.

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