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O último dia 7 de setembro marcou oito meses do terrível ataque à redação do semanário francês Charlie Hebdo. Após o atentado, a revista se tornou um símbolo da liberdade de expressão. À época, a publicação recebeu o Prêmio PEN de Coragem na Liberdade de Expressão, quando se destacou que “[é] o papel do escritor satírico em qualquer sociedade livre desafiar o poderoso e o sagrado, empurrando as fronteiras de maneira a fazer a expressão mais livre e mais robusta para todos nós”.

O Charlie Hebdo e a liberdade de expressão nos tempos de redes sociais

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Essa semana, porém, duas charges publicadas na última edição da revista fizeram questionamentos sobre os limites da liberdade de expressão voltar à pauta do dia. As charges são sem dúvida impactantes, como é a história trágica do menino Aylan. A conclusão a que muitos se precipitaram, inclusive no Brasil, contudo, se mostra fruto da interpretação da revista fora de seu contexto fático, cultural e jurídico.

Quanto aos fatos, o editorial da própria revista esclarece que as charges se inserem em um contexto de objeção à postura europeia de ignorar o desafio humanitário na Síria com um discurso de preservação da cultura católica na Europa.

Quanto ao contexto cultural, é de se ter em conta que a laicidade do Estado é levada extremamente a sério na França. A proteção do discurso na França abrange críticas às religiões. No direito francês ninguém seria impedido de publicar uma crítica veemente ou até mesmo desrespeitosa a qualquer religião que seja, pois o que cabe ao Estado francês é a proteção da liberdade religiosa e não da religião em si.

Em uma perspectiva jurídica, ainda que se entenda que as charges são de profundo mau gosto, há ocasiões em que o discurso incômodo ou mesmo ultrajante potencializa a mensagem de crítica de maneira lícita. Nos EUA, essa ideia ganhou corpo nos casos que reconheceram o direito de queimar a bandeira Americana como forma de protesto.

A liberdade de expressão é o direito de falar o que incomoda e questiona o senso comum. Dizer o que é incontroverso de forma palatável não requer liberdade constitucional. E a liberdade de expressão só existe se for universal. Dizer que representar o menino Aylan em uma charge é incentivar o discurso do ódio é perigosamente próximo de dizer que as recentes manifestações contrárias à Charlie Hebdo incentivam atentados como o de 7 de janeiro.

A ideia que existe nos EUA desde James Madison é que a liberdade de expressão é o meio, não o obstáculo, para conter discursos radicais. Em uma cultura de valorização do debate, o radicalismo é contraposto por discursos razoáveis e só assim a sociedade supera o extremismo e caminha em direção à tolerância.

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