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Mahathir Mohamad, novo primeiro-ministro da Malásia, já esteve no poder no país do Sudeste Asiático, entre 1981 e 2003 | ADAM DEAN/NYT
Mahathir Mohamad, novo primeiro-ministro da Malásia, já esteve no poder no país do Sudeste Asiático, entre 1981 e 2003| Foto: ADAM DEAN/NYT

Por causa das tirinhas nas quais criticou a elite política da Malásia, Zulkiflee Anwar Haque recebeu nove acusações de conspiração e foi impedido de sair do país. 

 Porém, depois das eleições gerais de maio, que derrotaram o primeiro-ministro Najib Razak e o partido de situação pela primeira vez na história nacional, o cartunista, mais conhecido como Zunar, entrou na base de dados do governo e descobriu que estava livre para viajar para o exterior. 

 "Quando o novo governo tomou posse, eu já esperava algumas mudanças nas questões dos direitos humanos e liberdade de expressão, mas me surpreendi ao vê-las implantadas com tanta rapidez. Por outro lado, agora é o ex-primeiro-ministro e a mulher dele que não podem viajar. Engraçado como as coisas mudam", filosofa. 

Esperança

A descoberta de Zulkiflee foi um dos primeiros – e promissores – indicadores do governo do novo primeiro-ministro, Mahathir Mohamad, e sua coalizão de oposição, que baseou sua campanha condenando a proposta de restrições mais rígidas de Najib à liberdade de expressão, entre outras questões. 

 Apesar disso, algumas pessoas que foram processadas por criticarem autoridades no passado estão cautelosas; dizem que, embora o novo governo pareça ser genuíno em seu comprometimento com as mudanças, preferem esperar ações concretas. 

 "A euforia continua; muita gente realmente acredita que haverá mudanças", diz Steven Gan, editor-chefe do Malaysiakini, um site de notícias independente. Há várias leis ainda em vigência que continuam a ser usadas para restringir as críticas. 

Nossas convicções: Liberdade de expressão

 Uma é da era colonial britânica, usada como base de acusação de Zulkiflee; a outra é a legislação que aborda as "fake news", sancionada em abril, sob o mandato de Najib, que torna passível de encarceramento aquele que produzir, publicar ou transmitir informações falsas, com o governo decidindo o que é verdadeiro e o que não é.

Há também o Ato de Multimídia e Comunicações, ironicamente conhecido aqui como "a lei do coração magoado", que proíbe mensagens ofensivas on-line e é usado para perseguir jornalistas e dissidentes. 

 "Com os anos, a repressão e as leis aplicadas para isso parecem ter aumentado", lamenta Linda Lakhdhir, assessora legal da divisão asiática da Human Rights Watch. 

 "A lei de combate às notícias falsas promulgada antes das eleições foi uma manobra óbvia para a supressão de qualquer crítica ao partido de Najib." 

 Ritmo das mudanças

Agora, o ritmo e a extensão das mudanças dependem de Mahathir e seu novo governo – e se há alguma preocupação, pelo menos em parte, é devido ao fato de o novo primeiro-ministro, que já governou o país entre 1981 e 2003, ser conhecido há tempos por encontrar, de uma forma ou de outra, alguma maneira de aprisionar seus críticos. 

 O compromisso que Mahathir assumiu na defesa da liberdade de expressão nos discursos de campanha parece ter perdido a força após as eleições, quando sugeriu que a lei das notícias falsas deveria ser revisada, e não eliminada sumariamente, como a coalizão tinha prometido. 

 Os membros de seu gabinete, porém, garantem que a legislação – que o próprio Mahathir foi acusado de violar durante a campanha – será repelida. 

Leia também: ï»¿A liberdade de expressão é fundamental para a democracia e para os indivíduos

 O primeiro-ministro deu outros sinais de que priorizará a liberdade de expressão. Quando a polícia de Langkawi prendeu um homem acusado de insultá-lo, o novo premiê disse não concordar com a condenação. 

 Gan e o outro fundador do site Malaysiakini, Premesh Chandran, foram acusados em 2016, sob o Ato de Multimídia e Comunicações, de publicarem um vídeo criticando o ex-procurador-geral pela forma como lidou com o escândalo do fundo estatal de investimentos 1 Malaysia Development Berhad. Mohamed Apandi Ali, perdeu o cargo e pode ser acusado de proteger Najib. 

 Ceticismo

Embora a mudança de governo pareça promissora para aqueles que enfrentam acusações por críticas à liderança anterior, Gan se confessa cético em relação ao que vem pela frente. "Fizeram um monte de promessas; o primeiro passo é garantir que cumpram a palavra. No que se refere a mim mesmo, depois de cobrir Mahathir durante tanto tempo, acho que o medo é que ele não cumpra suas propostas." 

 Tommy Thomas, que em junho foi nomeado o novo Procurador-Geral da Malásia, garante que "repelir leis opressivas" foi uma das primeiras prioridades legais do novo governo. E mencionou especificamente a lei das notícias falsas e o imposto sobre produtos nacionais e imposto, acrescendo que "a lista dessas legislações é bem longa". 

Ele também declarou seu apoio à liberdade de expressão. "Fico feliz porque as pessoas podem me criticar; faz parte da democracia. Aliás, melhor ouvir críticas sinceras do que elogios falsos", afirma. 

 Embora a proibição de viagem do cartunista Zulkiflee tenha sido suspensa, ele ainda enfrenta as nove acusações de conspiração, um número recorde para uma única pessoa na Malásia. Diz torcer para que o governo acabe de vez com a legislação, mas admite não ter ideia do que vem por aí. 

 "Governo é governo em todo lugar. Tem aquele período de lua-de-mel, tudo às mil maravilhas; depois que passa, voltam aos truques de sempre. Realmente espero que não seja só uma nova administração, mas uma nova Malásia, com mais espaço para a liberdade de expressão, especialmente para artistas como eu", conclui. 

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