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O ditador venezuelano Nicolás Maduro durante apresentação em Caracas, 11 de fevereiro |  FEDERICO PARRA / AFP
O ditador venezuelano Nicolás Maduro durante apresentação em Caracas, 11 de fevereiro| Foto:  FEDERICO PARRA / AFP

A bilionária exposição de empresas russas à extensa dívida da PDVSA, a gigante empresa petrolífera estatal, e o baixo custo-benefício de um apoio militar ao chavismo levaram o Kremlin a adotar cautela na crise venezuelana. Apesar da defesa pública de Nicolás Maduro, autoridades russas têm guardado silêncio sobre a crise desde o fim de janeiro e, nos bastidores, já aceitam abrir canais de diálogo com o opositor Juan Guaidó. 

"Há mais ou menos um ano, o embaixador russo em Caracas tem tido contatos com a oposição, o que não é normal na diplomacia russa para a região – que sempre mantém contato com o governo e não com partidos políticos", disse ao Estado o professor de relações internacionais Viktor Jeifets, especialista em relações russas com a América Latina, da Universidade de São Petersburgo. "Há alguns contatos, mas não deve ter havido acordo, porque se fosse o caso, o governo teria adotado um tom mais ameno."

Esta semana, Dimitri Rosenthal, especialista em América Latina da Academia Russa de Ciências, disse ao jornal britânico The Independent que Moscou já admite fechar um acordo com qualquer governo que esteja em Caracas. "O canal de diálogo já foi aberto, mas ainda existe desconfiança com relação à oposição", disse Rosenthal. "Para o Kremlin, Maduro ainda é o nome mais confiável para defender seus interesses." 

Fyodor Lukyanov, um analista ligado à elite do governo russo, também sugeriu na semana passada que o Kremlin anda perdendo as esperanças em Maduro, mas continuaria a apoiar o chavismo até o momento em que os militares decidirem abandoná-lo. "Por pior que seja Maduro, ele é confiável e é considerado um parceiro", disse Lukyanov, que dirige o Conselho de Política Exterior e Defesa da Rússia, em declaração ao Wall Street Journal. "Não vejo como a Rússia possa se comprometer mais (com Maduro). Estamos muito longe e falta capacidade logística para uma operação substancial. Além disso, economicamente, a Rússia não está em seu melhor momento." 

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Segundo fontes citadas pelo Wall Street Journal, com base em depoimentos de funcionários do Kremlin, a frustração do presidente Vladimir Putin com Maduro aumentou no ano passado, depois que uma delegação russa foi enviada à Venezuela com um plano de estabilização econômica. O governo chavista, porém, achou as medidas drásticas demais e pediu mais dinheiro. 

Este cenário, de acordo com diplomatas russos e líderes antichavistas, levou Moscou a buscar uma aproximação com opositores venezuelanos - ainda que a Rússia negue qualquer aproximação. 

Outros sinais de uma tentativa de aproximação vieram no fim de janeiro, quando Guaidó disse a russos e chineses que a oposição tem mais condições que o chavismo de garantir seus investimentos no país. Durante a crise, Putin telefonou para o chavista apenas uma vez para hipotecar apoio. O chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, insiste em uma saída política. À Bloomberg, no entanto, duas fontes do Kremlin reconheceram esta semana que o governo russo está preocupado. 

O vice-presidente do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento russo, Vladimir Dzhabarov, afirmou que o tempo corre contra o chavista. "Numa crise econômica, a população deve se virar contra ele", avaliou. 

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Jeifets é outro que acredita que dificilmente a Rússia estará disposta a ajudar Maduro como fez com o ditador sírio, Bashar al-Assad. "A Venezuela é muito longe de Moscou, não há bases russas próximas e defender Maduro prejudicaria a política russa com o restante da região", acrescenta. "A Rússia está estudando as alternativas. Se houver um acordo que assegure interesses russos na oposição, talvez não apoie abertamente Guaidó, ou tacitamente deixe Maduro de lado." 

Endividada e sem acesso a crédito em razão das sanções americanas, a Venezuela recorreu nos últimos anos à empresa russa Rosneft, chefiada por um aliado de Putin, para refinanciar suas dívidas. Os acordos chegam a US$ 10 bilhões, entre investimentos, empréstimos e até ações da refinaria americana Citgo. "A Rússia entra de vez no negócio do petróleo quando Maduro já estava isolado, por interesses mais geopolíticos do que econômicos", explica Jeifets. "Os melhores poços estavam com chineses e o petróleo venezuelano não é tão rentável." 

Agora ameaçada, a aliança estratégica entre o Palácio de Miraflores e o Kremlin começou em meados dos anos 2000, quando Hugo Chávez e Putin se aproximaram após o apoio venezuelano ao líder russo na Guerra da Geórgia. 

"A Rússia começou a ver a Venezuela não como um sócio geopolítico, mas como uma ponte para projetar-se na América Latina", afirma Jeifets. 

EUA 

A aproximação do governo de Donald Trump com o de Jair Bolsonaro faz com que os EUA tenham no Brasil o respaldo regional para endurecer a política contra o regime de Nicolás Maduro. Em visita esta semana a Washington, o chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, reuniu-se com o alto escalão do governo americano para apressar a transição na Venezuela. 

Nas conversas, os americanos sugeriram que o Brasil pode ajudar a fazer os militares venezuelanos passarem a apoiar Juan Guaidó e, assim, contribuir para a queda de Maduro. A ideia dos americanos é que a entrada de ajuda humanitária comece a escancarar no país as duas realidades que se apresentam: a de miséria, com Maduro, e a de alimentos, remédios e prosperidade. Para selar a aproximação com os EUA, o Brasil precisa preparar a logística para auxiliar na chegada de ajuda americana. 

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Para Benjamin Gedan, ex-diretor para América do Sul no Conselho de Segurança Nacional dos EUA e atual integrante do programa de América Latina do centro de estudo Wilson Center, o Brasil pode ter um papel importante de apoio aos EUA caso o governo decida por algum tipo de intervenção na Venezuela. Segundo ele, a opção é improvável, mas não impossível, e os EUA não fariam nada sem apoio regional. Por isso, ter o Brasil como aliado ao lado da Colômbia é relevante. 

Araújo disse que não há conversas sobre opção militar nos EUA nem sobre imposição de novas sanções. Com Mike Pompeo, John Bolton e o senador Marco Rubio, assegurou o comprometimento do Brasil na mesma agenda americana de pressionar pela transição. 

O entorno de Bolsonaro e assessores de Trump apostam no bom relacionamento pessoal entre os dois líderes, pelo perfil semelhante. Mas, na prática, as estratégias de política externa são desenhadas pela equipe de Trump. Até agora, o time que tem se aproximado do Brasil é considerado linha-dura quando o tema é a Venezuela. John Bolton, assessor de Segurança Nacional, em discurso em Miami disse que Bolsonaro seria um aliado contra a "troica da tirania", criticando regimes de Cuba, Venezuela e Nicarágua. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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